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Justiça do DF absolve assessor de Bolsonaro acusado de racismo

Filipe Martins, assessor de Bolsonaro, ao fundo: cena captada pela TV Senado causou revolta - Reprodução de vídeo
Filipe Martins, assessor de Bolsonaro, ao fundo: cena captada pela TV Senado causou revolta Imagem: Reprodução de vídeo

Weudson Ribeiro

Colaboração para o UOL, em Brasília

15/10/2021 18h17

O assessor para Assuntos Internacionais da Presidência da República, Filipe Martins, foi absolvido na primeira instância da acusação do crime de racismo. Segundo denúncia do Ministério Público Federal (MPF), o bolsonarista —durante sessão do Senado em março— fez com a mão um gesto que a ONG judaica norte-americana ADL (Liga Antidifamação, em tradução livre do inglês) associa a movimentos neonazistas.

O juiz Marcus Vinicius Reis Bastos, da 12ª Vara Federal Criminal do Distrito Federal, escreveu em sua decisão que não há justa causa para o ajuizamento da ação "pelo fato de não haver um único elemento que indique tal crime, senão a própria narrativa da autoridade policial e do Ministério Público Federal, que, conquanto mereçam todo respeito, não possuem força probatória em si". O MPF deve recorrer.

"Não há como se presumir que o sinal feito teria alguma conotação relacionada a uma ideologia adotada por grupos extremistas, e inexistem elementos contextuais que demonstrem tal intenção criminosa", afirmou a defesa de Martins, em nota

Em maio deste ano, a polícia do Senado indiciou Martins por considerar que o gesto feito no Senado, em 24 de março, tinha conotação racista. Na sessão, Martins fez um movimento com a mão que se assemelha ao sinal de "OK".

Na ocasião, o então ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, explicava os esforços da pasta que comandava para obter vacinas contra o coronavírus.

Em junho, o MPF denunciou Martins. Para os procuradores, "sua consciência da ilicitude do gesto racista é evidente. Não é verossímil nem casual que tantos símbolos ligados a grupos extremistas tenham sido empregados de forma ingênua pelo denunciado nem que sua associação a grupos e ideias extremistas tenha sido coincidência em tantas ocasiões", afirmaram.

Entenda o caso

Enquanto o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, falava em sessão na Casa, em 24 de março, Martins fazia com a mão um gesto semelhante ao sinal de "OK". Os três dedos esticados formam a letra "W", de white, e o polegar junto com o indicador representam a letra "P", de power, explica a ADL. White power, em tradução livre do inglês, significa "poder branco".

Segundo a associação judaica, o símbolo foi ressignificado em 2017, quando os apoiadores do ex-presidente dos EUA, Donald Trump começaram a divulgar o gesto em fóruns virtuais como 4Chan e Reddit como um "dogwhistle" —ou seja, um código de comunicação discreto, usado para que membros de determinadas ideologias e movimentos possam se reconhecer.

"No caso do gesto OK, o símbolo se tornou uma tática de trollagem popular por parte de indivíduos inclinados à direita, que muitas vezes postavam fotos nas redes sociais enquanto faziam o gesto OK", afirma a ADL.

Filipe Martins afirmou ser judeu ao se defender das acusações de associação a movimentos de supremacia branca. "Um aviso aos palhaços que desejam emplacar a tese de que eu, um judeu, sou simpático ao 'supremacismo branco' porque em suas mentes doentias enxergaram um gesto autoritário numa imagem que me mostra ajeitando a lapela do meu terno", escreveu o assessor em seu perfil no Twitter.

"A oposição ao governo atingiu um estado de decadência tão profundo que tenta tumultuar até em cima de assessor ajeitando o próprio terno. São os mesmos que veem gesto nazista em oração, que forjam suásticas e que chamam de antissemita o governo mais pró-Israel da história", declarou Martins. O presidente Bolsonaro é aliado político do ex-premiê israelense Benjamin Netanyahu.

Histórico e aproximação com os EUA

Crescido em Sorocaba, em São Paulo, Filipe Martins estudou em escola pública. Antes de ingressar na faculdade, decidiu estudar por conta própria. Foi nessa época, aos 17 anos, que ele conta ter conhecido as obras e os cursos online oferecidos pelo polemista Olavo de Carvalho, com quem mantém contato até hoje.

Formado em relações internacionais pela UnB (Universidade de Brasília), Martins integrou o núcleo da transição do governo Bolsonaro no grupo do agora ex-chanceler Ernesto Araújo. Além de se dizer crítico do chamado "globalismo", Martins fala contra o ateísmo, o aborto e a descriminalização de drogas.

Ele também é um dos responsáveis pela aproximação da ala ideológica do governo a Steve Bannon, o ex-estrategista de Donald Trump que, quando era editor-chefe do site Breitbart News, ajudou a impulsionar a popularidade de figuras com o provocador britânico Milo Yiannopoulos e o autodeclarado nacionalista branco Richard Spencer.

O comitê da Câmara dos Estados Unidos que investiga a invasão ao Capitólio em 6 de janeiro deve votar na próxima terça-feira (19) se recomendará acusação criminal de desacato contra Bannon, que não compareceu para prestar depoimento na quinta-feira (14). Caso aprovada no comitê, a recomendação deverá seguir para o plenário da Câmara.

No Brasil, a Polícia Federal monitora as ações de Bannon relacionadas às eleições no Brasil em 2022. Crítico do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Bannon constantemente levanta dúvidas quanto à segurança das urnas eletrônicas brasileiras.

A justificativa da PF é que os seguidores de Bolsonaro usam métodos de desinformação em redes sociais iguais aos que Bannon coordenava em favor de Trump quando era conselheiro sênior da Casa Branca.