Além do oficial, CPI da Covid teve 6 relatórios paralelos e complementares
A CPI da Covid chegou ao fim com três relatórios paralelos e outros três complementares ao texto oficial elaborado por Renan Calheiros (MDB-AL), aprovado pela maioria dos 11 titulares hoje (26).
Os três relatórios paralelos foram apresentados pelos senadores governistas Marcos Rogério (DEM-RO) e Luis Carlos Heinze (PP-RS), além de Eduardo Girão (Podemos-CE), que se declara independente.
Eles votaram contra o relatório oficial por não concordarem com as conclusões e sugestões de indiciamentos contidas no texto de Renan. Para citar um exemplo de discordância, está a imputação de dez crimes ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) durante o combate à pandemia.
Na avaliação deles, a Comissão Parlamentar de Inquérito buscou construir "narrativas" para prejudicar o governo federal com motivação política e não se debruçou sobre suspeitas de corrupção com recursos federais em estados e municípios.
Marcos Rogério, Heinze e Girão leram um resumo de seus respectivos relatórios na sessão. Embora fiquem registrados nos arquivos da CPI, os documentos não chegaram a ser votados, porque o relatório oficial de Renan, analisado antes, foi aprovado pela maioria dos titulares da comissão.
Além dos relatórios paralelos, ao menos outros três documentos foram entregues à CPI da Covid, mas como complementações ao texto final de Renan Calheiros. A maioria teve como foco investigações de suspeitas nos estados dos respectivos autores.
Eles foram apresentados por Eduardo Braga (MDB-AM), Izalci Lucas (PSDB-DF) e Alessandro Vieira (Cidadania-SE). Além de terem entregado os documentos à CPI, eles foram conversando com Renan e sugerindo inclusões no relatório final ao longo dos seis meses de comissão.
A senadora Soraya Thronicke (PSL-MS) também escreveu um parecer voltado a ações e possíveis erros na condução da pandemia em seu estado, o Mato Grosso do Sul. Porém, o texto não estava disponível na área de relatórios no portal público da CPI até a publicação desta reportagem.
Já o senador Humberto Costa (PT-PE) entregou um apanhado de contribuições recebidas por seu gabinete para avaliação de Renan Calheiros. Os documentos tratam de três temas: a crise de oxigênio medicinal em Manaus, a disseminação de fake news e o suposto "aparelhamento ideológico" da Funag (Fundação Alexandre de Gusmão), ligada ao Itamaraty, para discursos negacionistas.
Veja um resumo dos relatórios paralelos e complementares apresentados:
Marcos Rogério (relatório paralelo)
Um dos principais senadores da tropa de choque do presidente Bolsonaro na CPI, Marcos Rogério fez uma série de sugestões ao Executivo, mas afirmou não haver evidências sobre atos e omissões ilegais praticadas pelo governo federal no enfrentamento à pandemia. Também não fez sugestões de indiciamentos.
"Por outro lado, inúmeros casos de corrupção nos estados e municípios, investigados pela Polícia Federal e CGU [Controladoria-Geral da União], foram deliberadamente negligenciados pela CPI", escreveu.
Na avaliação de Marcos Rogério, o governo federal ficou por vezes impedido de agir de forma mais contundente devido à divisão tripartite —federal, estadual e municipal— de responsabilidades perante a saúde pública no país.
O senador afirmou que o governo jamais buscou a chamada imunidade de rebanho e disse que, se tivesse estimulado a tese, não estaria comprando milhões de doses de vacinas para imunizar a população.
Marcos Rogério alegou não ser possível comprovar corrupção nas negociações e nos processos de compras do governo federal e negou eventual demora nas tratativas para os imunizantes.
Quanto à crise de abastecimento de oxigênio medicinal a pacientes internados no Amazonas, responsabilizou os governos locais.
Luis Carlos Heinze (relatório paralelo)
Conhecido por defender o chamado tratamento precoce, integrado por medicamentos que não têm eficácia comprovada contra a covid-19, Luis Carlos Heinze voltou a argumentar a favor dos remédios.
Ele chegou a ter o nome incluído na lista de sugestões de indiciamentos por incitação ao crime, nesta terça. No entanto, após conversas nos bastidores e receio de que o relatório pudesse ser desqualificado, chegou-se a um acordo para retirar o nome dele.
Em seu parecer paralelo, Heinze defendeu que o governo federal trabalhou pela aplicação de vacinas contra o novo coronavírus e criticou acusações de que a gestão Bolsonaro teria recusado imunizantes ou demorado para comprá-los.
O senador defendeu a autonomia médica para receitar os medicamentos que os profissionais considerem mais eficientes aos pacientes, assim como manifestou apoio ao Conselho Federal de Medicina, que também esteve na mira da CPI.
"O que estou fazendo está no meu relatório: as 284 pesquisas com hidroxicloroquina no mundo e 137 com ivermectina; estão as pesquisas, que seguramente o Ministério Público e a Procuradoria-Geral da República irão se debruçar nos trabalhos apresentados. Não são factoides, não são narrativas", declarou.
Eduardo Girão (relatório paralelo)
Ao UOL, Carlos Gabas afirmou estar "indignado" e que o pedido é uma maneira de desviar o foco das investigações relacionadas ao governo federal.
Ao longo do relatório, Girão fez críticas ao comportamento do presidente Bolsonaro ao longo da pandemia, mas não viu crimes do mandatário. Ele também disse que não foram encontradas quaisquer evidências sobre atos e omissões ilegais praticados por autoridades e servidores da administração pública federal no enfrentamento da pandemia.
Quanto às suspeitas de corrupção ou de erros nas negociações de vacinas, Girão recomendou o aprofundamento das investigações dos casos Davati, Sputnik V e Covaxin, no qual enxerga indícios de conduta irregular por parte de agentes públicos e privados.
Ao longo do relatório, Girão criticou o grupo majoritário da CPI por não ter conduzido os trabalhos de forma a aprofundar as investigações de suspeitas de irregularidades em estados e municípios com verbas federais —parte do objetivo de seu requerimento que ajudou a criar a comissão.
O senador lembrou que o relator da comissão, Renan Calheiros, tem um filho governador de Alagoas, Renan Filho, enquanto outro membro, Jader Barbalho (MDB-PA), é pai do governador do Pará, Helder Barbalho.
Eduardo Braga (relatório complementar)
O líder do MDB no Senado elaborou um relatório para complementar o de Renan focado nos problemas enfrentados no Amazonas ao longo da pandemia e na série de suspeitas de omissões e erros que envolvem o estado, em especial quanto à crise de falta de oxigênio medicinal em janeiro deste ano.
Ele defendeu a recomendação de se indiciar o governador do Amazonas, Wilson Lima, e do ex-secretário de saúde do estado, Marcellus Campêlo, o que parte dos senadores da CPI não queria. Ambos são suspeitos de participar de possível esquema de corrupção na compra de respiradores durante a pandemia
Após ameaçar votar contra o documento de Renan e dizer que poderia transformar seu texto em um relatório paralelo, o relator acabou aceitando as inclusões dos dois nomes e incorporando o parecer.
Izalci Lucas (relatório complementar)
O líder do PSDB no Senado não é membro da CPI da Covid, mas preparou um relatório dedicado às suspeitas e investigações em curso no Distrito Federal.
Izalci associou o ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP-PI), a suspeitos de corrupção na área da saúde do Distrito Federal. Ele pede o aprofundamento das investigações à Câmara Legislativa e ao Ministério Público locais para chegar aos "verdadeiros mandantes e estrategistas desse despudorado esquema criminoso".
O documento, porém, não aponta os crimes que supostamente teriam sido praticados por Nogueira —presidente do partido PP (Progressistas) e membro da CPI da Covid antes de assumir a Casa Civil, no início de agosto.
"Botei no relatório o que eu vi. Lógico que não tem nenhum envolvimento direto [de Ciro nas suspeitas], não foi ele quem foi lá no GDF e fez os rolos. Mas, [foi] alguém em nome do PP e ele é o presidente", afirmou Izalci à reportagem.
O UOL entrou em contato com a assessoria do ministro para um posicionamento. Caso queira se manifestar, este texto será atualizado.
Em nota, Ricardo Barros afirmou que Izalci "pretende antecipar a campanha local do Distrito Federal se apropriando de falso raciocínio". O líder do governo na Câmara defende que "jamais teve qualquer relação com indicações ou com a gestão local".
Ele disse também que "não se confirmaram as ilações do senador" em oitiva na CPI dedicada a tratar das suspeitas do Distrito Federal.
Alessandro Vieira (relatório complementar)
Ao apresentar o relatório, ainda em 18 de outubro, Alessandro Vieira acreditava que o relator Renan Calheiros estava sendo mais político do que técnico. Delegado da Polícia Civil, o senador não concordou com todas as sugestões de indiciamentos no relatório final devido a fake news, especialmente por parte dos supostos integrantes do chamado gabinete paralelo.
Alessandro participou ativamente dos interrogatórios promovidos pela CPI e de reuniões nos bastidores. Porém, ele é suplente na comissão. Portanto, não tem direito a voto e não influenciou no resultado final. Ainda assim, seu pensamento é alinhado ao grupo majoritário da comissão, formado por oposicionistas e independentes.
"Pode-se dizer a política adotada pelo governo federal se apoiou, ao menos, nos seguintes pilares [meios empregados]: (i) defesa da tese de
imunidade de rebanho (ou coletiva) ou por contágio; (ii) incitação constante à exposição da população à transmissão; (iii) banalização das mortes e sequelas da doença; (iv) obstrução sistemática às medidas de contenção promovidas por governadores e prefeitos; (v) foco em uso de medicações ineficazes e na abstenção das medidas de prevenção; e (vi) promoção de desinformação quanto aos números da doença, medidas preventivas e vacinas", disse no texto.
Para o senador, o presidente Bolsonaro "falhou miseravelmente, não só por ignorância e despreparo, mas pelo arrogante exercício do poder descolado da ciência e das leis".
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