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Aras não fará nada sobre CPI, é subordinado à política, diz ex-Lava Jato

Colaboração para o UOL, no Rio

27/10/2021 10h52Atualizada em 27/10/2021 14h21

O ex-procurador da Lava Jato Carlos Fernando dos Santos Lima disse no UOL Entrevista desta quarta-feira (27) não acreditar que o procurador-geral da República, Augusto Aras, fará algo de efetivo sobre o relatório da CPI da Covid.

Aprovado na noite de ontem, o documento final produzido pela comissão do Senado pediu o indiciamento de 78 pessoas e duas empresas. Dentre os alvos do colegiado estão autoridades que têm direito a foro privilegiado, como o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que teve nove crimes atribuídos a ele.

"Infelizmente não tenho expectativas positivas em relação ao relatório, porque não acredito que Augusto Aras vá fazer algo de efetivo. Ele vai possivelmente tocar isso de uma maneira a não dar espaço para que haja movimentação alternativa, tocando esse inquérito de uma maneira leniente", disse Carlos Fernando.

Para o ex-procurador, Aras foi escolhido por Bolsonaro para a PGR (Procuradoria-Geral da República) por ter uma postura passiva em relação à abertura de investigações. Ele diz que o atual chefe do Ministério Público faz parte de uma geração de procuradores pré-Constituição de 1988, que agem mais como defensores da União do que como promotores de Justiça.

Augusto Aras já foi colocado ali porque ele representa o não fazer, uma subordinação do Ministério Público aos desejos da política. E infelizmente o poder que ele tem é incontrastável, porque é muito mais difícil de controlar aquele que não faz. O que não faz está protegido pela independência, enquanto aquele que faz tem que submeter os seus pedidos ao Judiciário, e depois a todo um sistema de recursos pelas partes envolvidas
Carlos Fernando dos Santos

Ação penal subsidiária

Sobre o relatório da CPI, o ex-procurador faz elogios ao trabalho feito pelos senadores. Ele, no entanto, afirma que algumas abordagens poderiam ter sido feitas com mais ênfases, como a atuação de Bolsonaro no combate à pandemia do novo coronavírus.

"Até me surpreendi por algumas revelações que aconteceram na CPI, em relação a determinados fatos. Acho que o relatório é consistente e acho que há muita perfumaria, que dificilmente configuraria crime na Justiça, como charlatanismo", afirma Carlos Fernando.

O advogado acredita que Aras poderá abrir algum procedimento interno na PGR para impedir que a CPI busque uma alternativa que não passe pelo Ministério Público Federal. Caso isso aconteça, os senadores podem perder força na abertura de uma ação penal subsidiária no STF (Supremo Tribunal Federal), que é vista como opção caso o procurador-geral engavete o relatório.

Se houver uma abertura de procedimento administrativo interno, de investigação, na minha opinião, a CPI não teria condições técnico-jurídicas de abrir uma ação penal subsidiária e, mesmo assim, tudo isso é muito questionável e não temos precedente no STF
Carlos Fernando dos Santos Lima

Bolsonaro preso

Carlos Fernando diz não acreditar que a Justiça brasileira puna "poderosos". Apesar disso, ele afirmou que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) "mereceria ser preso".

"Não acredito na Justiça brasileira, na sua capacidade de punir poderosos. Isso é evidente. Podemos trabalhar, sim, para punir negros e pobres, mas para punir poderosos não. Há soluções jurídicas, acertos, aconchegos de poder e infelizmente eles atingem a Justiça brasileira", disse o advogado.

O ex-procurador afirmou que há indícios "sérios" sobre o funcionamento do esquema conhecido como "rachadinha" no gabinete do então deputado federal Jair Bolsonaro.

As suspeitas sobre rachadinha praticada pelo presidente da República foram reveladas com exclusividade pelo UOL no dia 5 de julho. Na ocasião, a colunista Juliana Dal Piva publicou gravações de áudio inéditas apontando o envolvimento direto de Bolsonaro no esquema ilegal de entrega de salários de assessores na época em que exerceu seguidos mandatos na Câmara dos Deputados.

Como não acredito que poderosos sejam punidos no Brasil, vai ser dado um jeito de não se punir Jair Bolsonaro. Mas acredito que ele mereceria ser preso efetivamente
Carlos Fernando dos Santos Lima