Bolsonaro diz à PF que "troca" se referia à segurança e não à polícia
Em depoimento à Polícia Federal ontem à noite, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) afirmou que, quando disse "Já tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro, oficialmente, e não consegui", estava se referindo a um núcleo do GSI (Gabinete de Segurança Institucional) na cidade que poderia ser melhorado, especialmente em relação à proteção de seu filho que mora na capital fluminense, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos).
O depoimento aconteceu no âmbito do inquérito que apura se ele interferiu indevidamente na Polícia Federal. A declaração em questão aconteceu durante reunião ministerial de 22 de abril de 2020 que Sergio Moro usou para acusá-lo de interferência ao sair do comando do Ministério da Justiça.
Na época, Bolsonaro declarou, entre outros pontos:
"É putaria o tempo todo para me atingir, mexendo com a minha família. Já tentei trocar gente da segurança nossa, oficialmente, e não consegui. Isso acabou. Eu não vou esperar foder minha família toda de sacanagem, ou amigos meus, porque não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha — que pertence à estrutura nossa. Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele; não pode o chefe dele? Troca o ministro. E ponto final. Não estamos aqui para brincadeira."
No depoimento à PF, porém, o mandatário ignorou ter mencionado "amigos meus". Também não houve pergunta da PF sobre quais amigos seriam esses. A segurança fornecida pelo GSI é dedicada a familiares próximos do presidente da República, não a amigos dele.
De acordo com documento do depoimento, Bolsonaro disse "que há um pequeno núcleo do GSI sediado no Rio de Janeiro, responsável
pela segurança do declarante e de sua família; que esse núcleo do GSI é formado por servidores lotados e alguns comissionados; que achava que esse trabalho poderia ser melhorado, principalmente no acompanhamento do seu filho Carlos Bolsonaro, residente no Rio de Janeiro; que portanto, quando disse que queria trocar gente no Rio de Janeiro, referia-se à sua segurança pessoal e da sua família".
Bolsonaro negou qualquer ingerência na PF, mas confirmou que, em meados de 2019, solicitou ao então ministro Moro a troca do diretor geral da corporação, Maurício Valeixo, "em razão da falta de interlocução que havia entre o presidente da República e o diretor da Polícia Federal".
Bolsonaro confirmou também que sugeriu a Moro a nomeação de Alexandre Ramagem para o cargo. Segundo o presidente, a escolha seria "em razão da sua competência e confiança construída ao longo do trabalho de segurança pessoal do declarante durante a campanha eleitoral de 2018".
À PF, Bolsonaro disse que Moro teria concordado com indicação de Ramagem "desde que ocorresse após a indicação do ex-ministro da Justiça à vaga no Supremo Tribunal Federal".
Bolsonaro disse ainda que nunca teve como intenção, com a alteração da Direção Geral da PF, obter informações privilegiadas de investigações sigilosas ou de interferir no trabalho de Polícia Judiciária ou obtenção diretamente de relatórios produzidos pela Polícia Federal.
Questionado pelo delegado Leopoldo Soares Lacerda sobre o que quis dizer quando afirmou que tinha uma "PF que não me dá informações", também na mesma reunião ministerial, Bolsonaro declarou que "quis dizer que não obtinha informações de forma ágil e eficiente dos órgãos do Poder Executivo, assim como da própria Polícia Federal e que, quando disse "informações", se referia a relatórios de inteligência sobre fatos que necessitava para a tomada de decisões e nunca informações sigilosas sobre investigações.
Bolsonaro afirmou ainda que não possuía acesso ao SISBIN (Sistema Brasileiro de Inteligência), coordenado pela ABIN (Agência Brasileira de Inteligência.
Defesa de Moro se diz 'surpreendida'
Em nota, o advogado de Sergio Moro, Rodrigo Sánchez Rios, afirmou que a defesa foi "surpreendida pela notícia" de que o presidente da República prestou depoimento à autoridade policial "sem que fosse intimada e comunicada previamente, impedindo seu comparecimento a fim de formular questionamentos pertinentes, nos moldes do que ocorreu por ocasião do depoimento prestado pelo ex-ministro em maio do ano passado".
"A adoção de procedimento diverso para os dois coinvestigados não se justifica, tendo em vista a necessária isonomia entre os depoentes", completou.
Depoimento presencial
No mês passado, Bolsonaro mudou sua estratégia e pediu para prestar o depoimento de forma presencial. O depoimento do presidente foi uma determinação do ministro Alexandre de Moraes, relator do processo no STF (Supremo Tribunal Federal). O teor do documento foi tornado publico pelo tribunal.
Motivada por denúncias do ex-ministro da Justiça Sergio Moro, a investigação acontece desde abril do ano passado e já foi prorrogada várias vezes, a última em julho deste ano.
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