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Rosa cobra Mendonça e diz esperar votar marco temporal antes de sair do STF

Do UOL, em Brasília

07/06/2023 17h37

Após o ministro André Mendonça pedir vista (mais tempo de análise) e suspender o julgamento do marco temporal para demarcação de terras indígenas, a presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Rosa Weber, cobrou o colega que devolva o processo antes de sua aposentadoria, marcada para o final de setembro.

Julgamento é adiado novamente

Travada no STF desde 2021, a discussão do marco temporal foi retomada hoje com o voto do ministro Alexandre de Moraes. Ele foi contrário à tese, aderindo ao relator, Edson Fachin. O julgamento, porém, foi suspenso logo depois por um pedido de vista de Mendonça.
Mendonça classificou o voto de Moraes como "bastante robusto" e disse que precisa de "maior reflexão" sobre a matéria. O ministro se comprometeu a liberar o processo "em um prazo comum".
Rosa então afirmou que tem uma "limitação temporal" para votar neste julgamento - a ministra se aposenta compulsoriamente no dia 2 de outubro, e deverá deixar o tribunal no final de setembro.
Para ela, o tema é de imensa sensibilidade e "toda reflexão se mostra oportuna". Rosa, porém, deixou claro que espera votar antes de se aposentar.

Eu só espero - e tenho certeza que vai acontecer - que eu tenha condições de votar, porque eu tenho uma limitação temporal para proferir o meu voto.
Rosa Weber, presidente do STF

Interlocutores de Mendonça avaliam que o ministro deverá devolver o processo antes da aposentadoria de Rosa.
O UOL apurou que o ministro travou a discussão para se debruçar sobre os trechos do voto de Moraes sobre indenizações tanto a proprietários de terras quanto a populações indígenas.
Antes da sessão, o ministro Edson Fachin afirmou que a decisão do Supremo sobre o marco temporal vai definir "parte substancial do futuro do país".

Como está o placar

A discussão está suspensa com dois votos a um. Alexandre de Moraes e Edson Fachin são contrários à tese do marco temporal. O ministro Nunes Marques, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), é favorável.
Único a votar hoje, Moraes acompanhou Fachin, pontuando algumas mudanças na proposta da tese a ser formada pela Corte.
Para o ministro, a União deve indenizar integralmente o proprietário que, de boa-fé, adquiriu uma terra tradicional indígena antes da data da Constituição. Nos casos após o marco, a indenização deve ser apenas em benfeitorias.
Em casos impossíveis de se fazer a demarcação, como em situações de cidades construídas em cima de uma terra tradicional, a União deve compensar as comunidades tradicionais concedendo terras equivalentes às tradicionalmente ocupadas, desde que haja concordância.
Segundo Moraes, houve falhas do poder público na demarcação dessas terras.

Não é culpa das comunidades indígenas, que tem o seu direito à posse das terras. Não é culpa do agricultor, do colono, que tem direito a indenização. É culpa do poder público, que regulamentou ora de um jeito, ora de outro."
Alexandre de Moraes, ministro do STF

O que é o marco temporal

A tese do marco temporal estabelece que os povos indígenas só podem reivindicar terras que ocupavam à época da promulgação da Constituição, em outubro de 1988. A discussão opõe ruralistas e mais de 170 povos indígenas, que criticam a tese e defendem a sua derrubada.

A decisão do STF no caso terá repercussão geral, ou seja, servirá para solucionar disputas judiciais sobre o tema em todas as instâncias do país. Em 2021, quando o julgamento foi suspenso, o placar estava 1 a 1. O ministro Edson Fachin, relator, votou contra o marco temporal. Nunes Marques, indicado por Jair Bolsonaro (PL), votou a favor.

O caso específico em discussão na Corte envolve uma disputa entre o governo de Santa Catarina e indígenas do povo xokleng, que reivindicam um território na região central do estado. Em janeiro de 2009, cerca de cem deles ocuparam uma área onde hoje está a reserva biológica do Sassafrás, uma área de proteção ambiental. O governo pediu a reintegração de posse, e obteve em primeira instância, mas a Funai recorreu e o caso chegou ao Supremo em 2016.

Indígenas vão assistir a julgamento por telão - Pedro Ladeira/Folhapress - Pedro Ladeira/Folhapress
Indígenas vão assistir a julgamento por telão
Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

O que é o projeto de lei no Congresso

Além do julgamento no STF, o marco temporal é tema de proposta no Congresso. Na semana passada, a Câmara aprovou um projeto de lei que estabelece a tese para demarcação de terras indígenas — foram 283 votos a favor, 155 contra e uma abstenção.

A proposta foi enviada para análise do Senado. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), já sinalizou que o texto deverá ter uma tramitação lenta na Casa.

A aprovação na Câmara foi uma vitória da bancada ruralista sobre a agenda ambiental defendida pelo governo Lula (PT). Eleito com a promessa de fazer demarcações, o petista criou o Ministério dos Povos Indígenas.

As ações do governo, no entanto, não se refletiram no Congresso — com a falta de articulação política, os governistas não conseguiram impedir a derrota na votação. A ministra Sônia Guajajara criticou o texto.

O PL 490 representa um genocídio legislado porque afeta diretamente povos indígenas isolados, autorizando o acesso deliberado em territórios onde vivem povos que ainda não tiveram nenhum contato com a sociedade, nem mesmo com outros povos indígenas, cabendo ao Estado brasileiro atuar também pela proteção dos territórios onde vivem estes povos.".
Ministério dos Povos Indígenas