Zoneamento: Nunes deve vetar regra que submete tombamentos à Câmara

Ricardo Nunes (MDB), prefeito de São Paulo, deve sancionar a revisão da Lei de Zoneamento com vetos à nova regra de tombamento aprovada pelos vereadores.

O que aconteceu

"Já houve consenso", disse prefeito em relação a veto. Segundo Nunes, a prefeitura recomendará uma reformulação para que as ações de tombamento de imóveis na cidade sejam mais ágeis e não precisem passar pelo crivo dos vereadores. Por lei, imóveis tombados - bens de valor histórico, cultural e arquitetônico - devem ser preservados e não podem ser derrubados.

O texto aprovado na Câmara submete o tombamento à Câmara Municipal. A proposta determina que o Conpresp (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental) envie à prefeitura os pedidos de tombamento, que então seriam avaliados pelos vereadores antes de entrar em vigor.

Desde 1985, o conselho pode tombar imóveis por conta própria. A oposição afirma que a mudança aprovada pela casa tornaria o processo mais lento. Já na base aliada, o entendimento é de que a participação da Câmara nos tombamentos tornaria os processos "mais criteriosos".

Para prefeito, texto aprovado pela Câmara aumenta burocracia. Em entrevista, Nunes afirmou que, ao submeter todos os processos de tombamento aos vereadores, a proposta soma uma etapa ao processo praticado hoje — o que torna o processo de aprovações mais lento. "Você cria mais uma instância", disse ele, no último dia 8.

O plano da prefeitura é criar um grupo de trabalho. Membros do próprio Conpresp e representantes de entidades interessadas, como associações de moradores, devem participar da comissão.

Lei de Zoneamento deve ser sancionada na próxima sexta (19). Também conhecida como Lei de Uso e Ocupação do Solo, a regra define os tipos de construções permitidas para as diferentes regiões. A norma foi atualizada pela última vez em 2016.

Ato a favor de veto reúne especialistas nesta quinta (18). Além do veto às novas regras de tombamento, representantes do Instituto dos Arquitetos do Brasil, da Ordem dos Advogados do Brasil e de outras entidades defendem a retirada de trechos que aumentam a altura máxima permitida para prédios nos miolos de bairros e permitem mais construções em zonas de proteção ambiental.

A gente vai fazer um grupo de trabalho para reestruturar essas ações do Conpresp, em diálogo com eles -[o conselho e entidades] -- para poder dar uma resposta à Câmara. Mas esse trecho [tombamento] a gente vai vetar, até porque você vai criar mais uma instância.
Ricardo Nunes (MDB), prefeito de São Paulo, sobre novas regras de tombamento

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A Câmara não tem capacidade técnica para análise e avaliação que o Conpresp, que tem essa atribuição.
Bianca Tavolari, professora da FGV e pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento

Novas construções em aberto

Incentivo a novos prédios em miolo de bairros pode ser vetado por Nunes. O prefeito teme que o estímulo à construção nessas áreas torne menos atraentes as regiões perto de corredores de ônibus e estações de trem e metrô — os chamados eixos de transporte, que já contam com incentivos à construção.

"Ao liberar o gabarito (altura máxima permitida para prédios) nos miolos de bairro, a gente vai estar concorrendo com essas políticas públicas já pré-definidas", disse Nunes. Porém, o prefeito destacou que sua análise era preliminar e que dependia dos pareceres de diferentes secretarias para dar a palavra final sobre o assunto.

Para especialista, ponto contraria o proposto no Plano Diretor. Segundo Bianca Tavolari, professora da FGV, a cidade fez uma opção por estimular o adensamento perto do transporte público. Com estímulo em miolos de bairro, o crescimento na cidade deixa de ser orientado nesse sentido.

Para especialista, há riscos para áreas protegidas. Doutor em planejamento urbano, Daniel Montandon afirma que, se sancionada na íntegra, a proposta deve enfraquecer o adensamento perto dos eixos de transporte e a qualidade técnica dos processos de tombamento na cidade, aumentar a ocupação urbana em zonas hoje protegidas e reduzir o controle da prefeitura sobre o impacto gerado por grandes empreendimentos.

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A prefeitura afirmou que "o projeto de lei aprovado está em análise para sanção ou vetos". O órgão destacou ainda que o texto foi recebido no último dia 28 e que o prazo do Executivo para analisá-lo ainda não terminou.

Temos um patrimônio cultural e arquitetônico incrível e flexibilizar as regras de tombamento pode ser a mesma coisa que autorizar que, numa família, se rasgue o álbum de fotos com a memória das pessoas.
Fernando Tulio Franco, diretor de relações institucionais do ZeroCem

Deveria ocorrer o veto de todos os dispositivos trazidos no segundo substitutivo, uma vez que foram introduzidos regramentos com grande impacto no desenvolvimento urbano, sem o respaldo de estudos técnicos e do adequado tempo de debate.
Daniel Montandon, doutor em planejamento urbano e professor colaborador da Uninove

Na prática, o que propõe o texto?

A proposta aprovada pelos vereadores visa aumentar o número de moradias nas áreas mais estruturadas da cidade. Para isso, os limites de quanto se pode construir nessas regiões foram aumentados. Mas especialistas questionam o impacto que o aumento do número de imóveis terá no trânsito e na infraestrutura nessas regiões.

O texto permite que se construa duas vezes mais perto de corredores de ônibus e estações de trem e metrô do que no restante da cidade. Pelo texto, novos empreendimentos nesses locais podem ter área construída de até quatro vezes o tamanho do terreno — contra limite máximo de duas vezes para outras regiões.

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Nem todos os locais nas proximidades de estações e corredores terão incentivos à construção. Pontos no bairro do Bixiga, na região central, nas proximidades do Mirante de Santana, na zona norte, e em outras áreas com características "singulares" ou, "dotadas de identidade e memória", serão preservados.

Altura máxima para prédios no miolo dos bairros sobe de 16 para 20 andares. Para especialistas, essa mudança deve sobrecarregar a infraestrutura nessas regiões.

Há uma oportunidade de preservar o patrimônio sem deixar de modernizar São Paulo com as mudanças em relação ao Conpresp. Não vamos ficar mais reféns das decisões de um colegiado fechado
Rubinho Nunes (União Brasil), vereador em São Paulo

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Imagem: Arte/UOL

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