E se reduzirem isolamento, como Bolsonaro quer? 'Catástrofe', dizem médicos
Resumo da notícia
- Em discurso, Jair Bolsonaro atacou a quarentena e outras medidas restritivas
- Médicos infectologistas ouvidos pela reportagem criticaram fala do presidente
- Para eles, discurso "coloca em risco a vida das pessoas"
"Catástrofe". "Desastre". É o que ocorrerá, segundo médicos infectologistas ouvidos pelo UOL, incluindo um que trabalha com pacientes infectados pelo novo coronavírus, caso os brasileiros atendam o pedido de Jair Bolsonaro (sem partido) e abandonem o isolamento social.
Bolsonaro fez pronunciamento em cadeia nacional anteontem classificando de "histeria" as medidas adotadas para barrar a pandemia. Ontem, o prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella (Republicanos), afirmou em suas redes sociais que pretende ordenar a reabertura gradual do comércio na cidade.
Se mais cidades e setores da sociedade seguirem essa atitude, dizem os médicos, o país verá um aumento abrupto de mortes e colapso nos hospitais e postos de saúde — justamente o que querem evitar as medidas de isolamento recomendadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e pelo próprio ministério da Saúde.
Até ontem, o país já contabilizava 57 mortes e 2.433 casos oficiais de infecção pelo novo coronavírus. Mas os números reais devem ser maiores.
"Seria uma catástrofe se isso [fim da quarentena] acontecesse agora. Essas medidas de contenção e distanciamento social têm o objetivo de diminuir a disseminação do vírus e com isso evitar o esgotamento dos serviços de saúde. Seria um desastre"
Leonardo Weissmann, médico infectologista
O infectologista Natanael Adiwardana, que está tratando diretamente com infectados pelo coronavírus, vai além e diz que a recomendação de Bolsonaro "coloca vidas em risco".
A declaração vai de encontro a todas as evidências do que aconteceu na China, na Itália e em todos os casos que nós estamos acompanhando hoje em dia
Natanael Adiwardana, médico, sobre a fala do presidente Jair Bolsonaro
Natanael destaca os riscos "para quem não pode trabalhar em casa. Essas pessoas são as mais vulneráveis".
A lógica é: com a redução dos contatos sociais, quem trabalha na rua, como garis e policiais, estão menos expostos, já que há menos gente circulando.
Caso esse confinamento se reduza, a exposição de quem tem que estar obrigatoriamente circulando pela cidade será maior.
Não há testes para todos
Um dos motivos pelos quais é preciso incentivar que as pessoas fiquem em casa, diz Weissman, é que é inviável testar todo mundo.
Como muitos infectados não têm sintomas, a livre circulação de pessoas pode contaminar pessoas fragilizadas.
No momento, não temos testes para todo mundo, então a quarentena, o distanciamento entre as pessoas, é a melhor medida para conter a epidemia
Leonardo Weissmann, médico infectologista
Natanael explica que o vírus pode atingir até 80% da população. Mas diz que "com as medidas de restrição, isso pode acontecer de forma mais lenta".
"Temos de desacelerar a progressão da contaminação e, se todo mundo voltar às ruas, isso vai deixar de acontecer. Aquela história de achatar a curva, não vai acontecer."
Os infectologistas ouvidos não estão sozinhos. As falas deles ecoam posição de cientistas e associações que criticaram ontem as falas de Bolsonaro.
A SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia), por exemplo, classificou o pronunciamento de Bolsonaro como "temerário". "Tais mensagens podem dar a falsa impressão à população que as medidas de contenção social são inadequadas e que a COVID-19 é semelhante ao resfriado comum."
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