Transferências de presos ajudam a espalhar covid-19 em SP, alega sindicato
Resumo da notícia
- Casos entre servidores é o dobro que entre presos; faltam testes, acusa o sindicato
- Especialistas e sindicato dos agentes afirmam que as transferências levam vírus de uma cadeia para a outra
- Secretaria diz que há testes e que transferências são uma necessidade
Transferências de presos entre uma unidade e outra aumentam o risco de transmissão da covid-19 entre presos e funcionários dos presídios, expondo também os moradores das cidades onde funcionam as cadeias. Essa é a avaliação do sindicato de funcionários de presídios, de pesquisadores e advogados.
Segundo o Depen (Departamento Penitenciário Nacional), do Ministério da Justiça, que estudou as medidas tomadas por outros países para diminuir o contágio no sistema prisional, nove países interromperam transferências de presos.
Na lista de nações que adotaram a medida há tanto países em desenvolvimento como Colômbia, Costa Rica e Índia, como potências mundiais, como França e Reino Unido.
Liminar para interromper transferências foi cassada
O Sifuspesp (Sindicato dos Funcionários do Sistema Prisional do Estado de São Paulo) procurou a Justiça para suspender as transferências após uma cadeia em Martinópolis ter recebido 22 presos vindos da capital e da Grande São Paulo.
Em 30 de março, o sindicato obteve uma liminar para suspender as transferências. Para os advogados da entidade, elas aumentam o risco de contaminação de presos e funcionários, e, consequentemente, entre as famílias dos funcionários e as comunidades em que vivem.
A decisão, contudo, foi derrubada dois dias depois, a pedido do governo do estado. Para o juiz Kenichi Koyama, da 11ª Vara da Fazenda Pública, que negou a liminar, o sindicato tenta engessar o estado. De acordo com a sua decisão, é preciso, no enfrentamento da pandemia, "agilidade e responsabilidade institucional".
Segundo o juiz, apesar de admitir que a questão é sanitária, o serviço carcerário é essencial e nenhuma de suas atividades pode ser paralisada.
Mais servidores que presos doentes
Segundo dados do Depen (Departamento Penitenciário Nacional), do Ministério da Justiça, são 78 casos confirmados de covid-19 entre os 231.287 presos no estado de São Paulo até 29 de maio. O órgão afirma que 12 presos morreram da doença.
O número de funcionários que tiveram a infecção é exatamente o dobro do número de presos contaminados. De acordo com o Sifuspesp (Sindicato dos Funcionários do Sistema Prisional do Estado de São Paulo), 156 funcionários dos cerca de 40 mil que trabalham em presídios no estado contraíram a covid-19. Desses, 13 servidores morreram em decorrência da doença.
Risco aumentado
Para o presidente do Sifuspesp, Fábio César Ferreira, o Jabá, a falta de testes explicaria o fato de haver mais casos confirmados de covid-19 entre funcionários, que podem procurar pelo exame na rede privada e fora do horário de trabalho.
"O preso sai da capital e vai para o interior. Entra, fica em isolamento, mas não faz teste. Não há testagem no sistema prisional nem para preso nem para funcionários", afirma.
Segundo o sindicato, o fluxo de presos entre uma cadeia e outra só vai trazer mais riscos de contaminação a toda a coletividade carcerária, bem como aos servidores públicos que consequentemente vão chegar em casa do seu trabalho e contaminar seus familiares.
"O sistema prisional é uma bomba relógio. Comorbidades e superlotação são um risco para presos e servidores. Tudo indica que a doença se alastrará mais ainda", afirma.
Em abril, o MPF (Ministério Público Federal) recomendou que agentes e presos fossem inclusos numa distribuição de testes feita pelo Ministério da Saúde.
Visitas e jumbo proibidos
Apesar de as transferências de presos continuarem, questões sanitárias foram alegadas pela Justiça para a proibição de visitas em uma decisão de março. Sem visita, os presos ficaram também sem o jumbo (alimentação e produtos de higiene levada pelos parentes), aumentando a insatisfação nas cadeias.
O jornal Folha de S.Paulo informou que o Depen decidiu fazer uma compra extra de armamento não letal por entender que as rebeliões são uma questão de tempo no sistema prisional. O motivo da tensão é a suspensão das visitas determinada em praticamente todos os estados do país como medida para evitar o contágio da covid-19.
Remoções levam o vírus de um presídio para outro
O pesquisador Raul Borges Guimarães, professor-titular do Departamento de Geografia da Unesp (Universidade Estadual Paulista) de Presidente Prudente, que analisa como a covid-19 se espalhou pelo estado, observa que a manutenção das transferências de presos movimenta a população das cadeias e, consequentemente, a mobilidade do vírus.
De acordo com Guimarães, nos 45 municípios da região de Presidente Prudente há 30 presídios e os casos oriundos do sistema carcerário pressionam a expansão da covid-19 na região.
"É preciso olhar para a vigilância da covid-19 dentro dos presídios. Os presos têm um acesso bem menor ao teste e passam a doença para os agentes, que vão para casa e infectam mulher e filhos. E a família vai ao comércio, por exemplo, e isso faz aumentar o número de infectados e hospitalizados", explica o pesquisador.
Na coordenação regional oeste da Secretaria de Administração Penitenciária, que além das cidades da região de Presidente Prudente, inclui outros municípios, há 45 presídios. Destes, segundo o Sifuspesp, 33 estão superlotados de acordo com uma das ações movidas pelo sindicato para barrar as transferências.
Transferências são necessidade, afirma secretaria
A SAP (Secretaria de Administração Penitenciária) afirma que as transferências foram mantidas por serem "uma necessidade administrativa" devido à "manutenção das condições de segurança e disciplina das unidades prisionais ao cumprimento de sanções e à custódia de presos em unidades adequadas".
A pasta alega que não divulga os números de transferências por motivos de segurança.
Segundo a SAP, a testagem em massa nos presídios foi planejada por órgãos de saúde e contempla servidores e presos, que serão atendidos na próxima fase, que começará "nos próximos dias".
De acordo com a secretaria, os sindicatos foram informados "em detalhes, sobre a dinâmica da testagem e de suas circunstâncias".
A SAP registra números menores que o Depen e o Sindicato. De acordo com a pasta, são 44 casos de presos diagnosticados com a covid-19 e 12 óbitos. O órgão do governo estadual informa que 101 presos com suspeita da doença estão isolados preventivamente em enfermarias dos presídios.
Já entre servidores, seriam 111 os casos confirmados e 13 mortes. "Todo servidor com suspeita de diagnóstico da covid-19 está devidamente afastado sob medidas de isolamento em sua residência", afirma a nota da secretaria. Ao todo, 147 funcionários estão afastados.
Por decisão da SAP, publicada no dia 27 de maio, no Diário Oficial do Estado, as visitas aos presos seguem suspensas por mais 30 dias.
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