Congresso vê 'divórcio' com Planalto pós-Previdência
O Congresso prevê uma temporada de atritos com o Planalto após a esperada aprovação da reforma da Previdência, no segundo semestre, se o presidente Jair Bolsonaro não mudar o jogo com os parlamentares.
Alvo de ataques em redes sociais bolsonaristas e em manifestações de rua, como as de domingo, políticos de vários partidos avaliam que o governo não terá votos suficientes para tirar do papel os seus projetos e só não enfrentará um "apagão legislativo" porque há uma agenda pós-Previdência construída pela cúpula da Câmara e do Senado.
Tudo o que tem a digital do Planalto é visto com ceticismo pelo Congresso. Pouco antes dos seis meses de mandato, completados ontem, Bolsonaro mexeu na articulação política do governo, que agora será comandada pelo general Luiz Eduardo Ramos, mas nem mesmo o anúncio da troca serviu para apaziguar os ânimos.
Ao participar no domingo do ato em apoio ao ministro da Justiça, Sergio Moro, à Lava Jato e à reforma da Previdência, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) disse que "todas as vezes que esse Congresso aprontar" haverá protestos no País.
"E, se for preciso, a gente propõe uma PEC (proposta de emenda à Constituição) para reduzir o número de parlamentares", discursou o filho "03" do presidente.
Moro prestará depoimento hoje na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara sobre troca de mensagens atribuídas a ele, quando era juiz, com procuradores da Lava Jato.
O conteúdo das conversas foi publicado pelo site The Intercept Brasil. O pacote anticrime de Moro é hoje uma das medidas que podem enfrentar retaliações no Congresso.
Pelas contas do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), o Planalto não terá votos para aprovar projetos relevantes, após mexer nas regras da aposentadoria.
"Depois da reforma vai ser muito difícil unificar Câmara e Senado com esse modelo", disse Alcolumbre, em jantar promovido há oito dias pelo jornal digital Poder 360. "No Senado, o governo tem os quatro votos (da bancada) do PSL. Tem que procurar um método de se aproximar da política. A campanha acabou, não dá para ficar incentivando a divisão."
Alcolumbre vê "muito mais dificuldades" para pautar propostas do Executivo na volta do recesso parlamentar, em agosto, a não ser que elas sejam de interesse dos parlamentares.
"Sou do Amazonas. Lá, por exemplo, o cara precisa de arma", comentou o senador, em uma referência ao controverso decreto editado por Bolsonaro.
Apesar de admitir tropeços do governo na relação com Câmara e Senado, a deputada Carla Zambelli (PSL-SP) disse acreditar que a pressão popular ajudará Bolsonaro a emplacar projetos, como o pacote de Moro, o decreto que amplia o porte de armas e as privatizações.
"Aposto na pressão das ruas nas principais pautas", afirmou.
Clima
O problema é que, passados seis meses de mandato, Bolsonaro não tem um polo de sustentação no Congresso e o clima, ali, continua de divórcio litigioso.
"Até agora, nós não sabemos qual é a agenda do governo além da reforma da Previdência", constatou o presidente do DEM, ACM Neto.
Prefeito de Salvador, Neto destacou, ainda, que, diante desse cenário, fica difícil fazer um "prognóstico" sobre votos favoráveis a outras propostas do Executivo. "Ao que tudo indica, o governo fez uma opção clara por não ter uma base", resumiu ele.
Na avaliação do senador Vanderlan Cardoso (PP-GO), nada irá para a frente enquanto o Planalto não arquivar as polêmicas com o Congresso nem apresentar medidas concretas.
"O que vejo é só discurso. Qual é a agenda? Privatização por acaso é agenda?" Para Cardoso, Bolsonaro não tem plano B, nem C, nem D. "O governo só tem o plano A, que é a reforma da Previdência, mas não abre a caixa-preta da dívida pública."
Em nova tentativa de se contrapor à "ofensiva" do Congresso e, principalmente, do Centrão, o ministro da Economia, Paulo Guedes, montou uma estratégia para o "day after" da Previdência.
Guedes aposta as fichas na reforma tributária que o governo vai apresentar e quer discutir o tema junto com a proposta enviada pelo líder do MDB na Câmara, Baleia Rossi (SP).
"A reforma tributária não é do governo. É uma agenda dos governadores, dos prefeitos e, principalmente, da sociedade, que paga tantos impostos", disse o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Foi Maia que pediu a Rossi para encaminhar o projeto que unifica cinco impostos, com base em estudo do economista Bernard Appy.
Com Alcolumbre, Maia prepara um pacote de medidas s e iniciativas que tratam de temas sociais, como segurança, saúde e educação.
Estão no radar, ainda, propostas como autonomia do Banco Central, redução da taxa de juros no cheque especial, contrato de cessão onerosa entre União e Petrobras e novo marco legal de saneamento básico.
Bolsonaro declarou, recentemente, que o Congresso quer transformá-lo em uma "rainha da Inglaterra", que reina, mas não governa. Após assegurar na campanha que é contra a reeleição, ele admitiu disputar novo mandato, em 2022, caso não seja aprovada "uma boa reforma política".
A que tramita na Câmara prevê mandato de cinco anos e fim da reeleição. No domingo, Eduardo Bolsonaro defendeu limitar o número de mandatos parlamentares.
"O Congresso precisa ser oxigenado", disse. O presidente, porém, foi reeleito seis vezes quando era deputado. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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