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Niemeyer fez do modernismo identidade brasileira, diz crítico americano

Tuca Vieira/Folha Imagem
Imagem: Tuca Vieira/Folha Imagem

06/12/2012 06h01

Arquiteto brasileiro mais celebrado internacionalmente e autor de mais de 600 obras no mundo todo, Oscar Niemeyer (1907-2012) "absorveu" o modernismo europeu e o transformou em "identidade brasileira", segundo o crítico de arquitetura Nicolai Ouroussoff.

Escritor e durante muitos anos crítico do jornal The New York Times, Ouroussoff diz que Niemeyer surpreendeu europeus e americanos já nos anos 1940, em um tempo em que o Brasil era apenas um ponto exótico no mapa.

"A Europa estava em guerra e pouco estava sendo construído nos Estados Unidos quando a exposição 'Brazil Builds' foi inaugurada no Museu de Arte Moderna (MoMA) de Nova York (em janeiro de 1943, com o projeto e fotografias da Igreja de São Francisco de Assis, na Pampulha, entre outros). Isso contribuiu para um senso de choque e espanto", diz o crítico americano.

A igreja construída em Belo Horizonte, por encomenda do então prefeito da capital mineira Juscelino Kubitschek, era o prenúncio dos traços que anos depois dariam forma a Brasília.

Ouroussoff ressalta que "a construção de Brasília foi rápida e ambiciosa", quando "a Europa estava apenas começando a se recuperar (da guerra)".

Identidade brasileira

Segundo Ouroussoff, Niemeyer "absorveu as influências do modernismo europeu" e transformou sua arquitetura "em orgulho nacional". Para o especialista, o arquiteto reinventou o modernismo com sua própria linguagem e identidade nacional".

Para o crítico, os pilotis (colunas estruturais), os grandes vãos e as estruturas de concreto armado erguidas no Planalto Central brasileiro acabaram exercendo grande influência na arquitetura europeia e americana.

"Havia essa sensação de que o Brasil tinha muito o que contribuir para o diálogo criado pela arquitetura moderna, e é possível dizer que ele mudou o curso da arquitetura significativamente", diz.

Influências e 'erros'

Ourousseff aponta o californiano John Lautner, o italiano Gio Ponti e a anglo-iraquiana Zaha Hadid como alguns dos discípulos de Niemeyer.

Além da reconhecida sensualidade das curvas do arquiteto, ele ressalta a leveza e a liberdade estética de seus edifícios como grandes marcas.

"A escada do Palácio do Itamaraty é uma das mais bonitas que já subi", diz. "Ela desafia a gravidade com degraus que se projetam flutuando uns sobre os outros."

"As pessoas tendem a focar nos esboços das mulheres nuas na praia e nas curvas dos edifícios, mas, se você prestar atenção no Copan, por exemplo, há um programa social muito interessante", acrescenta. "Parece um edifício uniforme, mas na verdade é um conjunto de vários edifícios com organizações sociais diferentes. Ele foi mesmo concebido como uma comunidade, e só notei isso quando o visitei pessoalmente."

Para Ourousseff, os últimos anos de Niemeyer não se comparam com o auge de sua carreira, entre as décadas de 1940 e 1960.

"É muito mais jogado, grosseiro e claramente menos sério", diz ele. "A Biblioteca e o Museu Nacional de Brasília (construídas na década de 2000) são os projetos mais difíceis no sentido de que foram construídos no Eixo (Monumental, a avenida que concentra a Esplanada dos Ministérios e o Congresso Nacional) e acabam tendo um impacto negativo em vista de algumas de suas melhores obras."

De acordo com Ourousseff, "a sensação é de que Niemeyer desenhou um esboço simples, e os edifícios foram construídos sem o cuidado e o refinamento que se pode ver nos edifícios mais antigos".

"Eu não culpo ninguém por querer trabalhar até os últimos dias de sua vida, o que, no caso de Niemeyer, é mais do que merecido. Ele merece ser um herói nacional e ter continuado a trabalhar. O erro foi do governo que deixou que ele construísse naquele local. O governo deveria ter protegido o trabalho de Niemeyer dele mesmo."