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Local fechado, arma potente e 3 horas de operação policial: por que o ataque em Orlando foi tão letal

BBC Mundo

14/06/2016 08h39

No momento em que Omar Mateen parou de atirar dentro da boate Pulse em Orlando, na Flórida, na madrugada de domingo passado, uma em cada três pessoas que estavam ali havia sido alvejada.

Horas depois, os números chegavam a níveis históricos: o ataque deixou, até agora 50 mortos (incluindo o atirador) e 53 feridos, no que é considerado o tiroteio mais letal na história recente dos Estados Unidos.

As autoridades explicaram que Mateen ligou para o telefone da polícia para declarar sua lealdade ao grupo extremista autodenominado Estado Islâmico e que, neste momento, o jovem de 29 anos mostrou estar "tranquilo e calmo".

Mas o que diferencia o ataque em relação aos outros 372 do tipo que ocorreram em solo americano em 2015 e àqueles de anos anteriores com as mesmas características?

"A principal diferença é que ocorreu em um local fechado e barulhento, o que impediu que muitas pessoas se dessem conta do que estava acontecendo. E, quando perceberam, não havia por onde escapar", diz à BBC Mundo o especialista em segurança antiterrorista Anthony C. Roman.

Mas esta não é a única razão. A duração do ataque, de mais de três horas, e a arma usada por Mateen, um fuzil AR-15, também contribuíram para o alto número de vítimas, segundo Roman e outros analistas consultados para esta reportagem.

"Ainda que a polícia tenha reagido imediatamente, o atirador só foi neutralizado três horas depois de ter disparado pela primeira vez, o que permitu que recarregasse sua arma e tivesse tempo de ir atrás de mais vítimas, que foram mortas em etapas", explica Roman.

A seguir, analisamos melhor os três aspectos que ajudaram a fazer deste o pior tiroteio já registrado no país.

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1. Um lugar fechado e barulhento

Em 13 de novembro de 2015, três atiradores entraram da casa noturna Bataclan, no sul de Paris, na França, e abriram fogo contra a plateia de um show, deixando 83 mortos, a maioria deles espectadores que não conseguiram escapar do local.

Ao comparar este caso com o que se sabe até agora de Orlando, a investida de Mateen parece bem similar: ele entrou pela porta principal e começou a disparar contra quem estava dentro do estabelecimento, em uma festa.

Muitas das testemunhas que sobreviveram ao ataque afirmaram ter confundido por algum tempo os disparos com a batida da música.

"Pensei que era uma canção dos Ying Yang Twins", disse Christopher Hansen, um dos presentes no clube, à rádio NPR, fazendo uma referência a uma dupla de hip-hop americana.

Essa confusão permitiu que Mateen disparasse por quase um minuto sem que a música parasse.

"Quase comecei a dançar junto com o ritmo", disse Hansen. Mas, quando a música se silenciou e os disparos continuaram, a diversão se transformou em terror.

"A maioria dos tiroteios nos Estados Unidos ocorrem em espaços abertos, e aqueles em lugares fechados sempre são colégios e universidades, onde há rotas de fuga mais acessíveis", diz à BBC Mundo Natasha Esrow, especialista em terrorismo e professora da Universidade de Essex, no Reino Unido.

No caso da Pulse, as únicas formas de sair eram pela porta de acesso ao pátio e uma porta traseira. A saída principal estava bloqueada pelo atirador.

"As pessoas ficaram dentro do clube sem proteção e se tornaram alvos fáceis", destaca Ezrow.

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2. A potência da arma

Tanto Ezrow quanto Roman dizem que o principal fator por trás da quantidade de mortos em Orlando é o poder de ataque do fuzil AR-15 usado por Mateen.

"É uma versão do M-16 usado pelas Forças Armadas dos Estados Unidos",  explica Ezrow. "É uma arma semiautomática, que permite que o atirador dispare toda vez que acionar o gatilho sem precisar recarregar."

De acordo com a polícia e o FBI, fuzis de assalto como o AR-15 foram usados nos massacres nos cinemas de Aurora, no Colorado (20 de julho de 2012), na escola Sandy Hook em Newton, Connecticut (14 de dezembro de 2012) e, mais recentemente, em San Bernardino, na Califórnia, onde morreram 12 pessoas em 2 de dezembro passado.

A potência da arma permitiu a Mateen não só ser mais eficaz em seu ataque como também gerar caos e pânico, o que ele usou como proteção.

"É uma arma que funciona com grande velocidade, e o atacante aproveitou isso para criar confusão, de forma que nenhuma das pessoas dentro da boate se atreveu a neutralizá-lo", explica Roman.

A polícia disse que um dos seguranças do local reagiu, mas Mateen repeliu seu ataque.

Além disso, de acordo com a Associação Nacional do Rifle (NRA, na sigla em inglês), o AR-15 é o "fuzil mais popular" do país.

"Com todos esses antecedentes, o acesso a uma arma deste calibre deveria ter restrições, mas sua venda é permitida no Estado da Flórida. Mateen a comprou legalmente com sua licença de porte de arma", explica Ezrow.

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3. Três longas horas de operação policial

Segundo a polícia de Orlando, o ataque começou em plena madrugada, por volta das 02h00 de domingo. Nesta hora, Marteen disparou contra o segurança da entrada e começou sua violenta incursão dentro da Pulse.

Tudo acabou só às 05h00, três horas depois, com a morte do atirador, abatido pela polícia. "Não há dúvidas que esse tempo foi suficiente para causar o maior dano possível, mas não foi por causa de uma falta de reação da polícia. Foi necessário para lidar com uma situação difícil", explica Roman.

Dois minutos depois de o ataque começar, Mateen foi interceptado por um policial, que, após uma troca de tiros, se viu obrigado a sair da boate.

O chefe da polícia local, John Mina, relatou que logo quando suas equipes chegaram e entraram no estabelecimento, Mateen se fechou em dois banheiros e fez as pessoas que estavam ali de reféns.

A polícia aproveitou para retirar os feridos e os sobreviventes do salão principal.

"Foi um momento difícil: Mateen ameaçou não só detonar uma bomba que dizia levar consigo, mas também disse que o lugar estava cheio de explosivos. Passaram-se alguns minutos até ser determinado não haver risco de explosão dentro do bar", diz Roman.

A polícia tentou negociar com o atirador. Às 05h00, decidiu usar uma equipe da unidade especial Swat para invadir a boate e acabar com o ataque.

"Quando foram feitos reféns, a situação se complicou muito. Não creio que pudesse ter acabado antes. A polícia tem como princípio tentar salvar a maior quantidade de pessoas. E assim o fez", esclarece Roman.

Ao final, muitos dos clientes da boate escaparam por buracos que as forças policiais abriram com um veículo blindado em uma das paredes do local. Foi por ali que também saiu o atirador, que foi morto pela polícia.