Doria exagera ao falar de creches e França se contradiz sobre MST em debate
Os dois candidatos ao governo do estado de São Paulo, João Doria (PSDB) e Márcio França (PSB), se encontraram na noite de quinta-feira (25), no último debate televisivo antes do segundo turno das eleições, realizado pela TV Globo. Eles falaram sobre temas como educação infantil, segurança pública e privatizações. Citaram dados exagerados para falar sobre a criação de creches e o patrocínio a projetos pessoais, e se contradisseram ao falar sobre os apoios recebidos por partidos e movimentos sociais.
Aos Fatos checou suas declarações. Veja o que encontramos:
JOÃO DORIA (PSDB)
Os alunos que frequentam as Etecs e Fatecs, no último ano, 86% já garantem seu emprego."
INSUSTENTÁVEL: Essa informação já foi citada pelo candidato no debate anterior. Mas não há dados públicos que sustentem a afirmação. Há, sim, a informação de que 86% dos alunos das Fatecs conseguem emprego um ano após a graduação. O dado é de uma pesquisa interna do Centro Paula Souza, divulgada pelo jornal O Estado de S. Paulo. Outros dados, divulgados no site do governo estadual, apontam que, nas Etecs, 3 em cada 4 alunos conseguem emprego até um ano depois de formados (aproximadamente 75%). Nas Fatecs, o número é de nove em cada 10 alunos (aproximadamente 90%). Como não há dados sobre o número de alunos que conseguem emprego no último ano de curso, a declaração recebeu o selo de INSUSTENTÁVEL.
Outro lado: na última terça-feira (23), no debate realizado por UOL, Folha e SBT, o Aos Fatos perguntou à assessoria de Doria qual era a fonte da informação. A assessoria respondeu com as informações do site do governo, que tratam do ano seguinte à graduação. Quando questionada, a equipe afirmou que o recorte citado pelo tucano referia-se ao mesmo estudo. Questionada se esse recorte do estudo não seria público, a equipe afirmou que "deveria ser".
Criamos mais 42 mil vagas em creches."
EXAGERADO: Em 15 meses de gestão Doria, foram criadas cerca de 25 mil vagas em creches — e não 42 mil, segundo os dados da prefeitura. Por isso, a declaração é EXAGERADA.
Segundo os números de matrículas da Secretaria de Educação de São Paulo, Doria assumiu a Prefeitura quando a cidade possuía 284 mil crianças matriculadas em creches, e a demanda era de 65 mil crianças. Em março de 2018, ou seja, após 15 meses de governo, a cidade passou a ter 309 mil crianças matriculadas nesse nível de educação infantil, e a demanda tinha diminuído para 57 mil. Sendo assim, a gestão Doria criou aproximadamente 25 mil vagas em creches, e não 42 mil.
Essa não é a primeira vez que Doria cita esse dado. Quando deixou a Prefeitura, também disse que tinha feito 42 mil vagas. Segundo o jornal Valor Econômico, esse número só é possível ao somar a quantidade de vagas criadas (25 mil) e as vagas prometidas em convênios que foram assinados, e cujo prazo para criação das vagas seria de até dois meses após Doria deixar o cargo.
No debate passado, na última terça-feira (23), a assessoria do candidato alegou que "foram 27.501 matrículas realizadas e mais 14.502 vagas autorizadas em novos convênios. Portanto, o número total é de de 42.003 vagas criadas". Porém, como explicado acima, trata-se de uma promessa que não havia sido executada quando ele saiu do cargo para concorrer ao governo do Estado.
Nós readequamos o programa e colocamos mais 200 mil crianças da rede pública de ensino recebendo o leite."
IMPRECISO: Durante a gestão Doria, houve, de fato, uma reformulação do programa Leve Leite, que distribui leite para crianças da rede municipal de ensino na cidade de São Paulo. Também é verdade que houve a inclusão de 208,4 mil crianças em 2018 no programa. O que Doria não disse foi que, de 2016 para 2017, um de seus decretos cortou o benefício de quase 700 mil crianças. Uma declaração parecida havia sido checada por Aos Fatos em outro momento.
Até 2016, o benefício do Leve Leite era oferecido a 916 mil de crianças e jovens de 0 a 14 anos, e de baixa renda, matriculadas na rede municipal. Com o decreto n° 57.632 da gestão Doria, em março de 2017, a entrega do leite foi restringida para as 223,2 mil crianças em idade de creche e pré-escola de famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza.
Vale ressaltar que, no caso de crianças com deficiência, o benefício é oferecido a bebês de quatro a 12 meses e a crianças matriculadas até o quinto ano do ensino fundamental.
A partir de 2018, o programa passou a beneficiar mais 208,4 mil crianças em idade de creche e pré-escola inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais, mas não matriculadas na rede municipal. Ou seja, considerando esse novo grupo, o programa deve alcançar 431,7 mil crianças beneficiárias, cerca de 47% do total de beneficiados antes da gestão Doria.
O seu partido [PSB, de Márcio França], consta lá na página da internet que a reforma agrária terá características socialistas."
VERDADEIRO: Doria refere-se ao Estatuto do Partido Socialista Brasileiro. No texto, que foi atualizado em 2015 e consta do site do partido, o artigo 39 afirma que uma das atribuições da Secretaria do Meio Ambiente e Política Agrária do partido é "planejar e orientar a ação política do PSB para a consecução de uma reforma agrária com características socialistas, sob controle dos trabalhadores". Portanto, a declaração do candidato tucano é VERDADEIRA. Não há, no entanto, outras menções ou explicações mais detalhadas sobre o tema.
Conseguimos zerar a fila da pré-escola aqui em São Paulo."
VERDADEIRO: João Doria deixou o cargo de prefeito na cidade São Paulo no dia 6 de abril deste ano, para concorrer ao cargo de governador do estado. Em março, a Secretaria Municipal de Educação divulgou que a fila relativa à educação pré-escolar no município estava zerada, e, desta forma, é VERDADEIRA a afirmação dita por Doria.
No ano anterior, o único em que o candidato governou por completo, o número chegou a 4.352 crianças esperando uma vaga. Já em 2016, ano em que Fernando Haddad ainda estava à frente da prefeitura, o número de crianças com idade pré-escolar fora de uma unidade de ensino era maior: 6.439.
MÁRCIO FRANÇA (PSB)
Eu nem sei quem é o MST."
CONTRADITÓRIO: O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, conhecido como MST, é um dos movimentos sociais que apoia Márcio França no segundo turno das eleições. Ao ser lembrado disso por Doria, no entanto, o governador afirmou que não os conhece. A informação é CONTRADITÓRIA, porque França já participou de um encontro com o movimento.
Em fevereiro deste ano, em cerimônia no Palácio dos Bandeirantes, o governador Geraldo Alckmin autorizou a permuta entre imóveis pertencentes à Fazenda do Estado e à Universidade de São Paulo (USP). Entre eles estavam imóveis reivindicados pelo MST para o assentamento de famílias sem terra. Em troca, a USP recebeu prédios urbanos. À época vice-governador e secretário de Estado de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação, Márcio França estava presente na ocasião, assim como dirigentes do MST.
Só na Desenvolve SP, você [João Doria] recebeu mais de R$ 8 milhões de patrocínio."
EXAGERADO: Na verdade, as empresas de Doria receberam R$ 2,7 milhões de patrocínio do Desenvolve SP, e não "mais de R$ 8 milhões". O número só chega ao mencionado por França (R$ 10,6 milhões) se somados todos os patrocínios recebidos por entes do governo paulista e também federais.
Segundo reportagem da Folha de S. Paulo, com informações apuradas pela Lei de Acesso à Informação, João Doria recebeu aportes em suas empresas de pelo menos R$ 10,6 milhões de entes estatais desde 2005: cerca de R$ 6 milhões de repasses da administração federal de gestões petistas e R$ 4,5 milhões do governo do estado sob o comando de Geraldo Alckmin.
No entanto, em relação ao Desenvolve SP, banco de desenvolvimento do governo paulista, o valor recebido soma R$ 2,7 milhões, que patrocinaram 33 eventos. A reportagem também diz que o Executivo estadual fez anúncios nas revistas da Editora Doria que custaram R$ 1,8 milhão entre 2014 e 2015.
Em resposta ao jornal, Doria disse que os repasses não foram incongruentes com sua postura privatista: "Não há constrangimento, já que os investimentos não foram políticos, e sim técnicos".
[Deixamos] os sargentos andarem com fuzis nos veículos."
IMPRECISO: Os policiais militares já estavam autorizados a usar fuzil em veículo, porém, exclusivamente em ronda ostensiva ou em operações específicas da polícia. O governador e candidato à reeleição Márcio França apenas ampliou as situações em que policiais militares podem andar com fuzil nos veículos, autorizando a PM a utilizar fuzil para policiamento preventivo. A declaração do candidato, portanto, foi considerada IMPRECISA.
A autorização de França ocorreu em evento no dia 27 de setembro. Ao jornal O Estado de S. Paulo, o coronel Fábio Pelegrini, do setor de comunicação social da Polícia Militar, afirmou que "os batalhões tiveram a orientação de armar mais viaturas com os fuzis, que antes ficavam armazenados em uma reserva de arma". Ao UOL, Benedito Mariano, ouvidor das polícias de São Paulo, criticou a medida afirmando que, ao invés de proteger, "pode aumentar a violência letal até contra os próprios policiais".
Você [João Doria] falou em privatizar a Sabesp, depois voltou atrás."
VERDADEIRO: É verdade que Doria, durante uma entrevista na TV Gazeta, disse que planejava privatizar a Sabesp e que, dias depois, voltou atrás e negou que havia feito tal proposta.
Doria, durante o programa Hora do Voto, da TV Gazeta, em junho deste ano, disse que a sua intenção era a de que a Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo) fosse privatizada: "Não faz sentido você ter uma empresa de saneamento pública, a meu ver. Ela já é parcialmente privada. Nossa intenção é que ela seja totalmente privada."
Poucos dias depois, o ex-prefeito voltou atrás. Em um vídeo publicado no Facebook, Doria chegou a dizer que o plano de privatizar a Sabesp era "fake news": "Sabesp é uma instituição. Uma instituição de São Paulo, respeitada, importante". A posição foi repetida em outros debates, como o da TV Globo, no primeiro turno. Na ocasião, Doria defendeu que o controle da Sabesp permaneça com o governo do Estado.
Você [João Doria] teve menos da metade [dos votos] agora para governador do que você teve pra prefeito [na capital]."
VERDADEIRO: De acordo com os dados do TSE, nas eleições para a Prefeitura de São Paulo, em 2016, João Doria recebeu cerca de 3 milhões de votos nominais, o que totalizava 53,29% dos votos válidos e o fez ser eleito já no primeiro turno.
No primeiro turno destas eleições, o tucano recebeu 1,46 milhão de votos nominais, cerca de 26,34% dos votos válidos. O número realmente é menor do que a metade dos votos que ele recebeu na última eleição.
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