Topo

Na foz do rio Doce, boias são instaladas em vila apreensiva com lama

Paula Bianchi

Do UOL, no Rio

19/11/2015 17h57

Os cerca de 800 moradores da pequena Regência, distrito de Linhares (ES), localizada na foz do Rio Doce, acompanham com apreensão o caminho do mar de lama que cobriu Mariana (MG) há 15 dias e deve chegar ao local nesta sexta-feira (20). Boias estão sendo instaladas pela Samarco, empresa responsável pelas barragens, para tentar conter a lama. 

Já sem água na torneira, eles viram os turistas, principal fonte de renda da região, desaparecerem, conforme crescia o alcance do desastre. O local chega a receber até 5 mil pessoas na alta temporada,

Dono da Pousada do Sérgio, Sérgio Missaia calcula que ao menos 70% dos hóspedes já cancelaram as reservas. Até então a pousada estava com lotação esgotada para o Ano Novo e Carnaval, dois dos principais feriados da localidade, conhecida pelo ecoturismo e pela beleza das praias formadas pelo rio. “A vila parou. É um dos melhores picos de surfe do Brasil, entre os cem melhores do mundo. Isso tudo está para acabar, não gosto nem de falar. Dá vontade de chorar”, diz.

A cidade, diz Missaia, parece um cenário de guerra. Há máquinas, caminhões e operários por todos os lados, ocupados em instalar boias e sistemas de contenção para ao menos tentar evitar que a lama ela se acumule na foz e aumente ainda mais o prejuízo.

A Samarco começou nesta quinta-feira (18). A Justiça Federal no Espírito Santo determinou que a mineradora Samarco adote em 24 horas medidas para que a lama não chegue ao mar. Conforme a decisão, a mineradora, que pertence a Vale e a anglo-australiana BHP Billiton, será multada em R$ 10 milhões por dia caso a determinação não seja cumprida.

Na pousada, assim como no resto do distrito, já não há água corrente. Missaia comprou um caminhão-pipa de água mineral para abastecer os hóspedes e puxa água de um poço artesiano, decantada em uma caixa e tratada com cloro, para os banheiros, mas não sabe até quando vai conseguir fazer isso. “Estão dizendo que se a lama vier vai acabar com a qualidade de toda a água do lençol freático, não sabemos”, diz. “A verdade é que estão todos perdidos com essa situação. ”

Vice-presidente da associação de moradores e dono de uma empresa de ecoturismo, Fábio Gama diz que o prejuízo na região é incalculável. Ele viu os cerca de 200 turistas que atendia por semana caírem para zero e diz que o mesmo acontece com todas as pousadas e negócios do vilarejo. “Estamos afetados em 100%”, diz. “A previsão é de no mínimo três anos parados. Quem vai querer visitar, fazer um passeio de barco, um passeio de caiaque em um rio completamente contaminado?”, questiona.

Boias de contenção

Boias infláveis estavam sendo lançados na água na tarde desta quinta-feira, 19, em uma operação que deve se estender até esta sexta.
 
As boias são similares às usadas em acidentes com vazamento de petróleo e é a primeira vez que são aplicadas em acidentes na área da mineração. No total, a cerca deve envolver nove quilômetros da foz, em áreas sensíveis como mangues e ilhas.
 
Homens contratados pela mineradora enchiam as boias nas margens do rio e contavam com apoio de barcos de pescadores locais para deslocar as barreiras até o ponto desejado.
 
A onda de rejeitos proveniente do rompimento das barragens em Mariana permanecem percorrendo o Rio Doce 14 dias após o vazamento. Nesta quinta, atingiram o centro da cidade de Colatina e o próximo destino é Linhares, no fim de semana. Em Colatina, o abastecimento para 120 mil pessoas teve de ser interrompido em razão da poluição e a prefeitura local adotou um plano emergencial com caminhão-pipa e caixas d'água públicas para atender a população.
 
A Samarco está otimista quanto à eficácia dos equipamentos chamados de barreiras offshore e seafences. "É difícil definir que seja 100% eficaz porque existem muitos pontos irregulares no rio. Pode sim haver algum tipo de passagem, mas infinitamente menor do que seria sem a barreira", disse Alexandre Souto, gerente-geral de estratégia e gestão da Samarco e representante da empresa em Linhares.
 
Souto confirmou que é a primeira vez que o equipamento é usado para acidentes com essas características. "Não foi possível desenvolver em tempo hábil uma tecnologia específica para conter esse tipo de material, mas é o melhor disponível e poderá gerar um resultado satisfatório", disse.
 
A queda das barragens em Mariana aconteceu em 5 de novembro. Até o momento foram confirmadas sete mortes. Quatro corpos aguardam identificação. Outras 12 pessoas estão desaparecidas. A lama atingiu o Rio Doce via afluentes. Apenas no Estado de Minas, a bacia do rio tem aproximadamente 200 cidades. A Samarco ainda não se posicionou sobre a decisão da Justiça Federal do Espírito Santo.
 
Com Agência Estado