Topo

Sobe para 60 o número de mortos no Iraque em ataque no aniversário de dez anos da invasão

Bombeiros tentam controlar incêndio em veículo destruído, no local de atentando suicida com bomba - Wissm al-Okili/Reuters
Bombeiros tentam controlar incêndio em veículo destruído, no local de atentando suicida com bomba Imagem: Wissm al-Okili/Reuters

Do UOL, em São Paulo*

19/03/2013 11h30Atualizada em 19/03/2013 15h53

Nesta terça-feira (19), dia em que a invasão do Iraque por forças internacionais lideradas pelos Estados Unidos completa dez anos, uma série de ataques realizados em bairros xiitas e zonas localizadas ao sul de Bagdá deixaram 60 mortos e 180 feridos, segundo a polícia local.

Carros-bomba explodiram em regiões da capital iraquiana onde a população se deslocava para o trabalho ou em mercados de bairros xiitas, que compõem a maioria do país, o que leva a crer que tenham sido realizados por extremistas da minoria sunita influenciados pelo grupo terrorista Al Qaeda, que ganha nova força no Iraque.

O atentado mais grave foi realizado em Ahula, um bairro xiita na região noroeste, onde morreram 10 pessoas e outras 20 ficaram feridas. Na província da Babilônia, no sul de Bagdá, a explosão de dois carros-bomba provocou a morte de 16 pessoas e 31 feridos. Um dos carros-bomba explodiu próximo a um mercado na área de Asriya, matando 13 pessoas e deixando 27 feridos. Outro carro-bomba foi acionado, também em um ataque suicida, próximo de uma comanda da polícia, matando três agentes.

"Eu estava dirigindo meu táxi e de repente senti meu carro balançar. Fumaça surgiu de todo lado. Vi dois corpos no chão. As pessoas corriam e gritavam por toda parte", disse Ali Radi, um taxista pego em uma das explosões em Sadr City.

As autoridades iraquianas ainda não anunciaram cerimônias para lembrar este aniversário, nesta quarta-feira, e é provável que ocorram em 9 de abril, a data da queda de Bagdá.

A única decisão do governo iraquiano nesta terça-feira foi a de adiar em "seis meses no máximo" as eleições provinciais de 20 de abril nas províncias de maioria sunita de Al-Anbar e Nínive devido à situação de insegurança reinante nestes locais, anunciou o porta-voz do primeiro-ministro.

Um membro da comissão eleitoral havia afirmado inicialmente que o adiamento afetava 14 das 18 províncias iraquianas nas quais as eleições deveriam ser realizadas.

Mas, contatado pela agência AFP, Ali Musaui, porta-voz da província de Nuri al-Maliki, explicou que esta medida se aplicará apenas às províncias de Al-Anbar, no oeste do país, e de Nínive, no norte. Musaui destacou a situação de insegurança que impera nestas regiões. "Muitos candidatos foram ameaçados e outros foram mortos", afirmou.

Dez anos de guerra

Os dez anos de guerra no país contabiliza a morte de 174 mil pessoas. Desse total, entre 112 mil e 122 mil eram civis, segundo o Iraq Body Count, grupo formado por voluntários do Reino Unido e dos Estados Unidos, que registra as mortes violentas de civis que resultaram da intervenção militar em 2003.

Em 20 de março de 2003, sob a justificativa de combater o terrorismo e construir uma democracia na região, o Iraque foi ocupado por forças estrangeiras lideradas pelos Estados Unidos. O governo norte-americano alegava a existência de arsenais químicos e nucleares na região, o que não foi comprovado. Em dezembro de 2011, após a invasão que desencadeou uma onda brutal de violência no Iraque, os Estados Unidos anunciaram a retirada de todos os seus soldados do país.

A invasão do Iraque foi associada também à captura do então presidente iraquiano, Saddam Hussein (1979-2003), que acumulou a função de primeiro-ministro e era tido como inimigo dos Estados Unidos. Em 2006, Saddam foi executado por enforcamento, cumprindo a sentença do tribunal iraquiano.

A instabilidade política no país, no entanto, permaneceu, com frequentes explosões de carros-bomba e conflitos de etnias, principalmente entre a maioria árabe e a minoria curda. Segundo organizações não governamentais, a maioria dos 27,7 milhões de habitantes do Iraque depende da doação de cestas básicas, distribuídas por várias entidades e também pelo governo. A estimativa é que, com a guerra, pelo menos 500 mil refugiados deixaram o país.

Recentemente, o ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair afirmou que se a Grã Bretanha não tivesse participado da invasão do Iraque, o povo teria se rebelado contra Saddam Hussein e a situação "seria muito pior que na Síria" e diz não se arrepender da invasão do país.

"Os iraquianos se rebelaram em grande quantidade e foram assassinados também em grande número", explicou o ex-chefe de governo britânico, ao canal "BBC". "Como posso lamentar de ter derrotado um monstro que causou uma carnificina assim?", questiona o britânico, se referindo a Saddam Hussein.

A Grã-Bretanha perdeu 179 soldados em combate antes de abandonar o Iraque em abril de 2009.

Nostalgia pela figura de Saddam

Ativista no agora proibido partido Baath, Hussein foi sentenciado à pena de morte em 1959 por conspirar para o crime do líder iraquiano Abdul Karim Qassem, e era uma das principais figuras do partido quando a organização tomou o controle do Iraque após o golpe militar de 1968. Chegou à presidência 11 anos depois.

Hussein era considerado responsável pela morte de dezenas de milhares de curdos na campanha "Anfal" e de até cem mil pessoas que fizeram parte da ascensão contra seu regime após a guerra do Golfo de 1991, além de outros massacres.

Apesar disso, uma década depois da invasão norte-americana, anos de violência e a pouca confiança na atual e dividida classe política alimentam a nostalgia de muitos iraquianos pela figura de Saddam Hussein, homem que governava o país com mão de ferro e foi derrubado pelas tropas de ocupação estrangeira.

Acusar alguém de ter mantido laços com Hussein é recorrente quando se pretende manchar a reputação de um político no Iraque atual. Porém, residentes de Tikrit, cidade natal do antigo líder, expressam carinho por um homem que é lembrado pela estabilidade que impunha no país e não por ordenar a morte de milhares de pessoas.

"Lembrarei de Saddam com orgulho", disse Khaled Jamal, um vendedor de relógios em Tikrit. "Nosso país não mudou nem se desenvolveu nos últimos dez anos", acrescentou.

Além de sua frustração pelo vagaroso processo de reconstrução, muitos iraquianos – não apenas em Tikrit – sofrem com a má distribuição de serviços básicos e o alto nível de desemprego. Jamal também citou outra frustração muito comum: o aparente aumento do sectarismo desde a queda de Saddam Hussein.

"Não havia sectarismo, nem de sunitas, nem de xiitas", explicou.

"Mas agora essa é a primeira pergunta que se ouve quando você se encontra com alguém", acrescentou em alusão às perguntas sobre a província de origem de uma pessoa, ferramenta para conhecer sua lealdade religiosa.

*Com agências de notícias