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Justiça do DF suspende atos que extinguem reserva de mineração na Amazônia

Agência Pará
Imagem: Agência Pará

Do UOL*, em São Paulo

30/08/2017 10h23

A Justiça Federal do Distrito Federal suspendeu o decreto, do presidente Michel Temer, que extingue a Renca (Reserva Nacional de Cobre e Associados), área nos Estados do Pará e Amapá. O juiz Rolando Valcir Spanholo aceitou parcialmente uma ação popular contra o fim da reserva nacional para exploração mineral. O governo federal vai recorrer.

Na decisão, o juiz afirma que a extinção da área não pode ser feita por decreto e sem decisão no Congresso Nacional, conforme a Constituição de 1988.

"A análise conjunta de todos esses normativos permite concluir que assiste razão ao autor quando sustenta ser inadequada a pretensão do Executivo Federal em extinguir (total ou parcialmente) a Reserva Nacional de Cobre e Associados, por meio de simples decreto e sem a prévia deliberação no Congresso Nacional", afirma Spanholo. 

O artigo 225 da Constituição determina que áreas de proteção ambiental só podem ser alteradas ou suprimidas por meio de "lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção".

De acordo com a Presidência da República, a AGU (Advocacia-Geral da União) vai recorrer da decisão da 21ª Vara Federal do Distrito Federal.

Mandado de segurança no STF

Na tarde desta quarta, a Rede entrou também com um mandado de segurança no STF (Supremo Tribunal Federal). O mandado argumenta que o decreto que extinguiu a Renca é inconstitucional.

"Autorizar ou limitar a exploração comercial de minérios, mediante a instituição ou extinção de uma reserva mineral, é dispor sobre o destino de um bem da União, ação reservada constitucionalmente à lei e seu consectário processo deliberativo do Parlamento."

Renca - WWF Brasil - WWF Brasil
Área da reserva comparada à Dinamarca
Imagem: WWF Brasil

A área de 47 mil km quadrados na Amazônia foi aberta para a exploração mineral privada por um decreto presidencial na semana passada. A área é rica em ouro e outros minérios.

A região, do tamanho do território do Espírito Santo ou da Dinamarca, tem sete unidades de conservação e duas terras indígenas em seu interior. 

O argumento do governo é que as áreas se mantêm protegidas mesmo após o fim da reserva nacional. Segundo o Ministério de Minas e Energia, a medida seria necessária para viabilizar investimentos na região.

A mineração brasileira, que representa 4% do PIB e produziu o equivalente a US$ 25 bilhões (R$ 78 bilhões) em 2016, vinha sofrendo com a redução das taxas de crescimento global e com as mudanças na matriz de consumo, voltadas hoje para a China.

Após críticas, o texto foi alterado por um segundo decreto, publicado na noite de segunda-feira (28), que manteve a extinção da reserva e detalhou as condições de exploração.

Na decisão liminar, o juiz destacou que a decisão do governo de rever o decreto inicial editado com a finalidade de extinguir a reserva em nada muda a situação de ilegalidade, numa análise preliminar. Sem analisar especificamente o novo decreto, ele citou o fato de que "fontes ligadas ao próprio governo federal revelaram que o recuo seria apenas pontual (para explicitar garantias contra o desmatamento em massa etc.)", sem alterar o propósito da norma questionada.

Para Ricardo Mello, coordenador do programa Amazônia da WWF Brasil, a liminar que suspende os decretos mostra fragilidade na decisão do governo.

"O governo não consultou a comunidade científica (para extinguir a Renca). Não dá para tomar decisão (sobre liberar mineração na Renca) sem consultar a sociedade, sem critérios técnicos e científicos." 

MPF pediu suspensão do decreto

Na terça, o MPF (Ministério Público Federal) havia pedido à Justiça Federal a suspensão do decreto de extinção de uma reserva na Amazônia para exploração mineral.

Para o MPF, a medida da Presidência da República “é uma afronta à Constituição e mantém o meio ambiente sob ameaça de "ecocídio".” A procuradoria acusa o governo de publicar novo decreto sem diferenças em relação ao texto revogado.

Para os procuradores, é possível classificar a área como espaço territorial especialmente protegido. Assim, somente poderia ser alterada por meio de lei específica, conforme a legislação.

“O MPF ressalta, ainda, que a União não pode intervir nos Estados e municípios, e fomentar atividade potencialmente poluidora sem que haja ampla discussão, especialmente com os amazônidas”, escreveram na ação.

Área desmatada para garimpo ilegal, no Pará - Flávio Ilha/UOL - Flávio Ilha/UOL
Área desmatada para garimpo ilegal, no Pará
Imagem: Flávio Ilha/UOL

Processo de dois anos

A extinção do Renca é aventada desde 2015, quando começava-se a debater o marco regulatório para a mineração. Em novembro passado, representantes do CPRM, o serviço geológico brasileiro, testaram a popularidade da área com investidores numa conferência do setor em Londres.

E em abril deste ano, o Ministério de Ministério de Minas e Energia publicou uma portaria balizando os trâmites para a extinção da reserva - o decreto confirmou a mudança.

Antes mesmo da criação da Renca, na década de 1980, houve 160 requerimentos de mineração na área, segundo levantamento da WWF. A maior parte deles foi retirada, mas os que restaram, em torno de dez, terão prioridade na análise do governo de concessões.

Esses pedidos que deverão prosseguir compreendem uma área de 15 mil quilômetros quadrados, em torno de 30% do total da Renca. Para o restante da área, devem ser abertas licitações.

* Com agências internacionais