Campanha de Haddad contra-ataca no WhatsApp na reta final do 1º turno
Bernardo Barbosa*
Do UOL, em São Paulo
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Geraldo Bubniak/Estadão Conteúdo
Haddad durante ato de campanha em Curitiba, na segunda (1º)
A campanha do candidato do PT à Presidência, Fernando Haddad, está em uma cruzada para tentar conter mensagens que circulam no WhatsApp contra o petista, várias delas comprovadamente falsas.
Nesta semana, a campanha abriu um canal para receber denúncias intitulado "Zap do Lula", disparou alertas de que espalhar notícias falsas é crime e entrou em contato com autoridades e empresas de tecnologia. Uma fonte ligada ao PT ouvida pelo UOL sob condição de anonimato chegou a definir a situação enfrentada como "jogo sujo".
A campanha de Haddad entrou no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) nesta quinta (4) com um processo para tirar das redes sociais conteúdos falsos contra o candidato e sua vice, Manuela D'Ávila (PCdoB). São 105 posts com acusações sobre temas variados, como crianças, sexualidade, religião e economia.
Também na quinta, a campanha disse ter recebido 15 mil denúncias de boatos contra Haddad, Manuela e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 24 horas.
O esforço tem como pano de fundo o desempenho de Haddad nas pesquisas de intenção de voto, nas quais o petista parou de subir, e o avanço de Jair Bolsonaro (PSL) na liderança. No Datafolha de quinta (4), a diferença entre os dois candidatos chegou a 13 pontos percentuais, contra 6 pontos na pesquisa feita menos de uma semana antes, no dia 28. A margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos.
No momento, a campanha petista não considera, nem afasta, a possibilidade de a produção de conteúdo falso ter ligação com a campanha de Bolsonaro. A avaliação é de que houve um aumento forte e ordenado, nos últimos dias, no volume de mensagens que atacam o PT e Haddad e favorecem o candidato do PSL.
No entanto, na madrugada desta sexta (5), após o debate da TV Globo, Haddad associou a disseminação de notícias falsas ao adversário ao falar no "estrago que o pessoal do Bolsonaro está fazendo" ao repassar esse tipo de conteúdo. "As pessoas de boa-fé recebem aquilo e às vezes acreditam", disse o petista.
"Fico indignado porque não é assim que se disputa uma eleição. E é claramente um perfil de mensagem que tem a ver com o que ele fala. Não tem a ver com o que os outros candidatos falam", reclamou Haddad em entrevista coletiva. "Ele parte para a ignorância mesmo."
No último programa eleitoral do primeiro turno, transmitido na noite de quinta, Haddad disse que "eles nos atacam com mentiras na TV e no WhatsApp", mas não citou nomes.
À revista "piauí", a assessoria de imprensa da campanha do Bolsonaro disse que o candidato está preocupado "somente com sua campanha" e que as notícias falsas teriam sido produzidas pela própria campanha petista.
Petistas repassam material contra Bolsonaro
Formalmente, o contra-ataque petista se dá por meio do canal aberto para receber denúncias de boatos e do encaminhamento de conteúdo falso para autoridades. Mas também começaram a circular a partir de quarta (3) entre militantes petistas, junto com a convocação para denunciar notícias falsas sobre Haddad, imagens e vídeos contra Bolsonaro, aos quais o UOL teve acesso. Não é possível confirmar a origem do material, que retoma declarações antigas de Bolsonaro contra o Bolsa Família e cita as críticas do vice da chapa dele, Hamilton Mourão (PRTB), ao 13º salário. Nesta quinta, Bolsonaro prometeu não acabar com o Bolsa Família.
A reportagem teve acesso a um outro lote de mensagens, também de autoria desconhecida, que ecoam os ataques feitos pelo PT contra Bolsonaro em seu programa eleitoral. No vídeo, a campanha de Haddad lembrou o histórico do candidato do PSL na Câmara, como o seu voto a favor da reforma trabalhista. O material feito para o WhatsApp também cita as declarações de Mourão.
Ao contrário do que acontece com Facebook, YouTube, Instagram ou Twitter, nas quais é possível medir o engajamento dos usuários e ver suas interações, o WhatsApp é uma plataforma fechada, o que impossibilita o acompanhamento dessas informações. Com isso, não se pode saber o tamanho de qualquer mobilização em torno de um candidato ou assunto no aplicativo.
No entanto, o Datafolha de terça (2) dá uma pista do patamar de envolvimento dos eleitores de Bolsonaro com o WhatsApp. Segundo o levantamento, os apoiadores do candidato do PSL são os que mais se informam pelo WhatsApp: 57% contra 40% para Haddad. Além disso, 40% dos eleitores de Bolsonaro disseram compartilhar notícias sobre política e eleições pelo aplicativo; entre os de Haddad, o índice é de 22%.
O Datafolha também revelou que os eleitores de Bolsonaro são os que mais têm o hábito de ver vídeos sobre política na internet, com 63% contra 43% entre os apoiadores de Haddad.
WhatsApp é "caixa-preta", diz professor
Para o professor Fabrício Benevenuto, coordenador do projeto Eleições sem Fake, da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), o WhatsApp é uma "caixa-preta" que favorece a disseminação de desinformação.
"Ninguém tem ideia do que está acontecendo ali dentro, nem o WhatsApp", disse Benevenuto, que leciona no Departamento de Ciência da Computação da UFMG.
Os integrantes do Eleição Sem Fake desenvolveram um sistema que permite a jornalistas monitorar dezenas de grupos públicos no WhatsApp, em parceria com o projeto Comprova, do qual o UOL faz parte com o UOL Confere. O objetivo é trazer transparência para os espaços em que as informações circulam.
Segundo Benevenuto, o monitoramento de grupos públicos é um esforço para "abrir uma fresta" no WhatsApp. Ele considera esses grupos como a "ponta do iceberg" da desinformação que circula pelo aplicativo, já que eles são formados basicamente por militantes e, a partir deles, conteúdos são disseminados para grupos privados.
Ainda de acordo com o professor, o momento ainda é de tentar entender a influência do WhatsApp -- que tem 120 milhões de usuários ativos no Brasil -- nas eleições.
"Há o poder da persuasão pelo fato de o conteúdo ser passado de amigo para amigo", disse. "Isso pode prejudicar as eleições, mas a gente ainda não sabe o quanto."
*Colaboraram Gustavo Maia, do Rio, e Janaina Garcia, de São Paulo