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Advogado diz que R$ 50 mil recebidos por João Paulo Cunha não eram fruto de corrupção

Fernanda Calgaro e Camila Campanerut*

Do UOL, em Brasília

08/08/2012 19h03Atualizada em 08/08/2012 20h04

O advogado Alberto Toron, que defende o petista João Paulo Cunha, ex-presidente da Câmara dos Deputados, atualmente deputado federal e candidato a prefeito em Osasco (SP), no julgamento do mensalão, afirmou que os R$ 50 mil sacados pelo réu no Banco Rural não são fruto de corrupção.

Segundo a Procuradoria Geral da República, Cunha recebeu o montante após favorecer a agência SMP&B, de Marcos Valério, em uma licitação na Câmara dos Deputados. “O dinheiro recebido não era de corrupção”, diz. 

Ele argumenta que, um dia antes da mulher de Cunha, Márcia Regina Milanésio Cunha, sacar o dinheiro no Banco Rural, o deputado recebeu Valério em sua casa. “Se fosse fruto de corrupção, porque ele mandou a esposa sacar o dinheiro no Banco Rural e não recebeu um dia antes do Valério”, questionou.

De acordo com o deputado, o montante era para pagar dívidas de campanha do PT em Osasco (SP). Ele diz não saber que a origem dos recursos eram ilícitas.

Cunha era deputado pelo PT na época das denúncias e foi absolvido no processo de cassação na Câmara em 2005. Acabou sendo reeleito em 2006 e 2010 e hoje preside a Comissão de Constituição e Justiça da Casa. No processo, ele responde por lavagem ou ocultação de dinheiro, corrupção passiva e a duas acusações de peculato.

Nas alegações finais do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, Cunha "autorizou a subcontratação da empresa IFT - Idéias, Fatos e Textos, de propriedade do jornalista Luiz Carlos Pinto, pela SMP&B Comunicação, para prestar serviços de assessoria de comunicação”. Na denúncia, a Procuradoria diz que os serviços não foram prestados e que a finalidade do contrato era permitir que o jornalista continuasse assessorando Cunha.

Citando o depoimento de várias testemunhas, o advogado procurou convencer os ministros que a empresa do jornalista foi contratada pela Câmara e prestava serviço para a Casa, e não para Cunha. De acordo com Toron, a IFT prestava serviços para Câmara já na legislatura anterior, cujo presidente era o atual senador Aécio Neves (PSDB-MG).

O defensor rebateu também as acusações da PGR de que os serviços de comunicação não teriam sido prestados. "O trabalho foi contratado e devidamente realizado", disse Toron.

Quanto à acusação de peculato no contrato da Câmara com a SMP&B, no qual, segundo o MPF, os serviços pagos não foram prestados, o advogado disse que houve subcontratação dos serviços para outras empresas, prática comum e legal, segundo ele. "“Subcontratação é comum. Dentro da agência não havia produtora ou gráfica.”

Ainda de acordo com Toron, dos R$ 1,08 milhão pagos pela Câmara à SMP&B, R$ 948 mil foram usados em verba publicitária a empresas onde foram realizados anúncios da Câmara.

Por fim, Toron argumetou que seu cliente não pode ser acusado por lavagem de dinheiro, já que ele, segundo o advogado, Cunha somente sacou os recursos do Banco Rural. "Lavagem é processo, quem sacou o dinheiro não pode ter lavado."

Toron chamou a denúncia do mensalão de "fantasmagórica" e um "caso nítido de criação mental".

Ao deixar o plenário, ele disse que “cansou [fazer a sustentação oral], suei por dentro”. Ele ainda reforçou que vê poucas provas contra seu cliente. "Não só não se extrai nenhuma prova contra o deputado João Paulo Cunha, como tudo aquilo que foi produzido durante o curso do processo, quando se ouviram testemunhas e fizeram provas periciais. Tudo isso demonstra a inocência do deputado João Paulo cunha. De modo que eu espero  que o Supremo Tribunal Federal julgando com serenidade, julgando com independência, ele possa aplicar o direito neste caso e absolver João Paulo Cunha"

AYANNA TENÓRIO

O advogado Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, que defende a ex-vice-presidente do Banco Rural Ayanna Tenório no julgamento do mensalão, afirmou que sua cliente não sabia do esquema ilegal de repasses de dinheiro feito pelo Banco Rural ao PT e às empresas de Marcos Valério.

De acordo com ele, a ré assumiu a vice-presidência do banco em 2004, depois que o esquema já havia sido instalado. "Como ela poderia saber que estaria se envolvendo numa trama diabólica, se documentos oficiais não a comunicavam de eventuais irregularidades?”, questionou o defensor, durante sustentação oral apresentada nesta quarta-feira (8) no STF (Supremo Tribunal Federal).

Réu não pode ser punido só por exercer função, diz advogado

Oliveira citou o escritor tcheco Franz Kafka, conhecido pelas suas narrativas fantásticas, ao ironizar a denúncia contra Ayanna. “É kafkiniana a acusação contra ela". 

O advogado diz que Ayanna "não tinha razão para desconfiar" das movimentações financeiras do Banco Rural porque as empresas de Valério eram grandes e o dinheiro vinha de outros bancos, como o Banco do Brasil, Bradesco e Itaú.

O Ministério Público Federal (MPF) entende que Ayanna autorizou a renovação de empréstimos ilícitos para as empresas de Marcos Valério e não avisou o Banco Central sobre as operações suspeitas.

Em 2003, época dos empréstimos, ela era responsável pela área de recursos humanos do Banco Rural e afirma que votou a favor das renovações dos empréstimos da Graffiti Participações e da SMP&B por formalidade, seguindo orientação de José Roberto Salgado, que votara neste sentido. Ela responde por formação de quadrilha, lavagem ou ocultação de dinheiro e gestão fraudulenta.

"STF analisa pela 1ª vez lavagem de dinheiro", diz advogado

Segundo Mariz Oliveira, "nenhuma conduta é imputada a Ayanna Tenório, nenhuma conduta, nenhum fato", o que dificultou encontrar provas sobre a inocência. O defensor afirmou ainda que sua cliente não tinha funções financeiras no Banco Rural porque não possuía preparo para tal. "Ayanna não conhecia finanças.”

Análise

O advogado e professor de processo penal da EDB (Escola de Direito do Brasil) Frederico Crissiúma de Figueiredo, que acompanha o quinto dia de julgamento do mensalão na redação do UOL, afirmou que "a conduta de cada um [dos réus] tem que estar absolutamente individualizada" na denúncia. A falta da individualização –ou seja, o ato de detalhar a participação pessoal de cada réu nos crimes– foi bastante criticada pelos advogados dos réus que fizeram sua sustentação oral nesta quarta-feira.

No entanto, segundo Figueiredo, "o Ministério Público, pela complexidade dos autos e número elevado de réus, não conseguiu se incumbir da função de individualização", o que fragiliza a denúncia e favorece a atuação da defesa.

VINÍCIUS SAMARANE

Antes, o advogado Maurício Oliveira Campos Jr., defensor de Vinícius Samarane, ex-diretor do Banco Rural, afirmou que a Procuradoria, autora da acusação contra os réus do mensalão, arrastou para o processo pessoas que não estavam envolvidas no escândalo na época dos acontecimentos mencionados na denúncia.

"Arrasta-se para este processo pessoas que não se encontram no tempo da denúncia", disse. “É como ele [Samarane] pudesse ser onipresente e onipotente."

O réu respondia pela área de controles internos quando o suposto esquema foi revelado e hoje é vice-presidente do banco. A Procuradoria alega que ele deixou de comunicar às autoridades sobre os saques realizados pela agência de Marcos Valério e as irregularidades em empréstimos concedidos pelo banco. Valério é apontado como o operador do mensalão.

Em sua defesa, Samarane afirma que os saques feitos pela agência SPM&B ocorreram antes de ele assumir cargo de direção e que, por isso, ele não teria alertado o Banco Central sobre a movimentação.


JOSÉ ROBERTO SALGADO

A primeira defesa de hoje foi de José Roberto Salgado. Thomaz Bastos fez um apelo aos ministros que Supremo para que julguem a matéria com cuidado.

“Tenho certeza que cada um [dos ministros] há de julgar com muito cuidado. Não temos duplo grau de jurisdição. É um julgamento bala de prata, feito uma vez só”, disse, no início de sua sustentação oral na tarde desta quarta-feira (8).

"Aqui é como se fosse um grande júri, com integrantes extremamente qualificados”, afirmou. “Estamos julgando seres humanos, aos quais são imputados delitos de penas altas, num processo difícil de ser julgado, que tem uma junção artificial de fatos”, acrescentou o ex-ministro.

Atualmente, Salgado presta consultoria a empresas em Belo Horizonte, mas, na época do mensalão, segundo a Procuradoria Geral da República, ele aprovou a contratação e a renovação de empréstimos fraudulentos para o PT e as empresas de Marcos Valério, incluindo a agência SMP&B.

Também pesa contra Salgado a acusação de que ele teria transferido ilegalmente dinheiro para o publicitário Duda Mendonça –responsável pela campanha eleitoral de Lula– no exterior. Salgado admite, porém, que movimentou recursos que já estavam fora do país. Ele responde por formação de quadrilha, lavagem ou ocultação de dinheiro, evasão de divisas e gestão fraudulenta.

Bastos procurou focar sua argumentação na desqualificação do depoimento da testemunha Carlos Godinho. Segundo o advogado, em mais de 30 depoimentos contidos nos autos, ele é a única testemunha que aponta a participação de Salgado nos empréstimos ilegais ao PT e às empresas do publicitário Marcos Valério.

LUIZ GUSHIKEN

A última defesa a ser apresentada hoje será a de Luiz Gushiken, que era ministro de Comunicação do governo federal em 2005. A denúncia apresentada ao STF afirma que Gushiken autorizou Henrique Pizzolato, ex-diretor de marketing do Banco do Brasil à época, a adiantar os pagamentos do Fundo Visanet, que tem como maior acionário o Banco do Brasil, para a agência DNA, de Marcos Valério.

Gushiken afirma, porém, que seu cargo não tinha nenhuma relação com a direção do Banco do Brasil. Além disso, a defesa dele alega que o Fundo Visanet é uma sociedade privada, o que eliminaria o crime de peculato (apropriação de patrimônio público pelo servidor), do qual Gushiken é acusado. Em suas alegações finais entregues aos ministros do STF, porém, a Procuradoria decidiu pedir sua absolvição por falta de provas. Ainda assim, o ex-ministro pode ser condenado pelo Supremo.

Entenda o dia a dia do julgamento

Entenda o mensalão

O caso do mensalão, denunciado em 2005, foi o maior escândalo do primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. O processo tem 38 réus, incluindo membros da alta cúpula do PT, como o ex-ministro José Dirceu (Casa Civil). No total, são acusados 14 políticos, entre ex-ministros, dirigentes de partido e antigos e atuais deputados federais.

O grupo é acusado de ter mantido um suposto esquema de desvio de verba pública e pagamento de propina a parlamentares em troca de apoio ao governo Lula. O esquema seria operado pelo empresário Marcos Valério, que tinha contratos de publicidade com o governo federal e usaria suas empresas para desviar recursos dos cofres públicos. Segundo a Procuradoria, o Banco Rural alimentou o esquema com empréstimos fraudulentos.

O tribunal vai analisar acusações relacionadas a sete crimes diferentes: formação de quadrilha, lavagem ou ocultação de dinheiro, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato, evasão de divisas e gestão fraudulenta.

*Colaboraram Fabrício Calado e Guilherme Balza