Topo

STF condena 12 da base aliada de Lula, rechaça caixa dois e vê compra de apoio político

Fernanda Calgaro*

Do UOL, em Brasília e São Paulo

01/10/2012 19h18Atualizada em 01/10/2012 21h17

O STF (Supremo Tribunal Federal) condenou nesta segunda-feira (1º) 12 réus  ligados a partidos da base aliada do primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2007) --veja os nomes abaixo. Os condenados eram do PP (Partido Progressista), PL (Partido Liberal, atual PR), PTB (Partido Trabalhista Brasileiro), PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro) e da corretora Bônus-Banval, que auxiliou o PP a receber os recursos ilegalmente.

Clique na imagem e veja como cada ministro já votou no mensalão

  • Arte UOL

A Corte encerrou hoje julgamento de parte do item 6, que trata do recebimento de propina por parte dos partidos da base aliada. Ao longo do julgamento deste item, pelo menos sete dos dez ministros (Joaquim Barbosa, Luiz Fux, Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Marco Aurélio, Celso de Mello e Ayres Britto) rechaçaram a tese das defesas e de lideranças do PT --entre elas do ex-presidente Lula-- de que os recursos eram para o pagamento de dívidas eleitorais não declaradas, prática conhecida como caixa dois. No total do julgamento, até agora, foram condenados 22 réus.

A maioria dos magistrados também considerou que os recursos foram utilizados pelo PT (Partido dos Trabalhadores) para comprar apoio político no Congresso Nacional. Os mais enfáticos foram os ministros Ayres Britto, presidente da Corte, e Celso de Mello --os últimos a votar--, além do relator Joaquim Barbosa.

Os recursos que pagaram os parlamentares são provenientes de desvios do Fundo Visanet, controlado pelo Banco do Brasil, e operações fraudulentas junto ao Banco Rural. 

Ao rechaçar a tese de caixa dois, Britto disse que "se viesse admitir como crime eleitoral o uso do erário (dinheiro público) para financiamento de campanhas, a lei eleitoral cairia no absurdo de facilitar a obstrução de normas penais sobre corrupção, peculato, extorsão e outros delitos contra a administração pública".

"Chega a ser redundante falar de caixa dois privado, pois caixa dois público não pode existir jamais", afirmou o presidente do STF.

PTB

Do PTB, foram condenados, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, o deputado cassado Roberto Jefferson (RJ) e o ex-deputado federal Romeu Queiroz (MG), além de Emerson Palmieri.

O valor total do acordo entre PTB e PT era de R$ 20 milhões, mas apenas R$ 4,5 milhões foram repassados ao PTB, segundo afirmou Roberto Jefferson.

PP e Bônus-Banval

Do Partido Progressista (PP), foram condenados Pedro Corrêa, ex-deputado federal por Pernambuco, por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. Pedro Henry, deputado federal pelo Mato Grosso, foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. João Cláudio Genú, ex-assessor parlamentar do partido na Câmara, foi condenado por corrupção passiva e formação de quadrilha.

De acordo com a Procuradoria Geral da República, as empresas de Valério repassaram R$ 4,1 milhões para os parlamentares do PP. 


Enivaldo Quadrado, ex-sócio da corretora Bônus-Banval, acusada de lavar dinheiro antes de repassá-lo aos parlamentares do PP, também foi condenado por lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. Breno Fischberg, ex-sócio de Quadrado, foi condenado por lavagem de dinheiro e absolvido da acusação de formação de quadrilha.

PMDB

O STF também condenou o ex-deputado federal pelo PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro) José Borba (PR) pelo crime de corrupção passiva. Ele também é acusado de lavagem de dinheiro, conduta pela qual foi condenado por cinco ministros, o que configura empate.

Segundo a Procuradoria, Borba recebeu, ao todo, R$ 2,1 milhões, mas, como sabia da origem ilícita do dinheiro, atuou para não receber diretamente o montante. O único pagamento comprovado foi o de R$ 200 mil. O ex-deputado deixou o PMDB em 2007 e hoje é prefeito de Jandaia do Sul (PR), pelo PP.

PL

Entre os réus do PL (Partido Liberal, atual PR, Partido da República), o Supremo condenou o deputado federal e ex-presidente da sigla Valdemar Costa Neto (SP), o ex-deputado federal Carlos Alberto Rodrigues (RJ), conhecido como Bispo Rodrigues, e o ex-tesoureiro do partido Jacinto Lamas, por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.

Os ministros concordaram com a tese da Procuradoria de que Costa Neto e o PL receberam R$ 10,8 milhões das empresas de Valério. Segundo a acusação, os recursos chegaram até Costa Neto e outros integrantes do PL, como Jacinto Lamas e Bispo Rodrigues, por meio de Simone Vasconcelos, ex-diretora da agência SMP&B, de Valério.

O réu Antonio Lamas, irmão de Jacinto Lamas, foi por todos os ministros das acusações de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. Segundo a Procuradoria e os ministros, não ficou comprovado seu envolvimento no esquema.

Compra de votos

O decano do Supremo, Celso de Mello, afirmou que houve compra de apoio parlamentar. "Esses vergonhosos atos de corrupção parlamentar, profundamente lesivos aos ofícios (...) e à respeitabilidade do Congresso Nacional, atos de corrupção alimentados por transações obscuras, (...) implementados em altas esferas governamentais, com o nítido e claro objetivo de fortalecer o apoio político, devem ser condenados com o peso e o rigor da lei."

Marco Aurélio também teve o mesmo entendimento do decano: "essa corrupção (passiva) não visou cobrir deficiências de caixa dos diversos partidos envolvidos na espécie, mas sim, a base de sustentação para aprovar-se determinadas reformas, sofrendo com isso a própria sociedade brasileira", disse.

Já Gilmar Mendes apontou que ao dizer que o dinheiro era para caixa dois, a defesa admitiu "um crime menor". "A defesa dos réus se viu obrigada a admitir um crime menor [o de caixa dois], mas não se trata de um crime menor dada a sua gravidade", afirmou Gilmar Mendes. "A destinação [do dinheiro, no entanto] não estava associada às mais das vezes com despesas de campanha."

OUÇA TRECHO DA ENTREVISTA À FOLHA DE S.PAULO EM QUE ROBERTO JEFFERSON MENCIONOU A EXISTÊNCIA DO MENSALÃO PELA PRIMEIRA VEZ

Para Luiz Fux, "houve a modificação do comportamento [dos parlamentares] na votação de matérias no Congresso [após o recebimento de propina]."

Dias Toffoli, que foi assessor de José Dirceu na Casa Civil e advogou para o PT, concordou que houve compra de apoio do PL. "A tese de que os parlamentares dessa legenda [PL] apoiaram naturalmente as proposições do governo federal fica enfraquecida. A meu ver, fica claro porque foi necessário cooptar aqueles parlamentares", disse.

No entendimento da Corte, mesmo que os recursos do mensalão não tivessem sido direcionados para a compra de apoio, os réus deveriam ser condenados por corrupção passiva, já que, para a Corte, o crime não depende de "ato de ofício" --no caso dos parlamentares, a compra do apoio no Congresso.

O único dos ministros que concordou com a tese de caixa dois foi o revisor Ricardo Lewandowski. “Na maior parte dos casos, o que ocorreu: houve um acordo entre partidos para financiamento de campanhas; os representantes de diversos partidos telefonavam para o partido que financiava estas campanhas e diziam: ‘vai e recebe o dinheiro no banco tal’. E estas pessoas mandavam um intermediário que assina um recebido e esta pessoa, em princípio, não sabe se o dinheiro vem da SMP&B, do próprio banco ou de uma empresa qualquer”, afirmou o ministro ao julgar os réus do PP.

Lewandowski, no entanto, afirmou que não entrou no mérito se houve ou não compra de voto por, na sua opinião, ser irrelevante para julgar os réus. 

Entenda o dia a dia do julgamento

Outro lado

O advogado Luiz Francisco Corrêa Barbosa, que defende Roberto Jefferson, diz acreditar que até o fim do julgamento no STF o resultado em relação ao seu cliente pode mudar. “Precisamos aguardar o fim do julgamento. O próprio ministro Ayres Britto, presidente da Corte, ressalvou hoje que, até a proclamação do resultado, as coisas podem ser alteradas.”

Para o advogado José Antônio Duarte Álvares, que defende o deputado federal Pedro Henry (PP-MT), a condenação dele por corrupção passiva e lavagem de dinheiro é “injusta”. “As decisões são contrárias às provas dos autos. A condenação se deu só porque ele era líder da bancada, mas o Pedro não teve qualquer participação [no esquema]”, afirmou.

Outros votos e próximos passos

Concluída esta parte do julgamento, o ministro-relator voltará a analisar o mesmo item, de número 6 --isso porque este tópico tem mais de 20 réus e o relator optou por dividi-lo em duas partes. A segunda parte é referente aos réus acusados de corrupção ativa sobre os integrantes da base aliada, que inclui os chamados núcleos político e publicitário.

No núcleo político, estão os integrantes da cúpula petista --o ex-ministro José Dirceu, o ex-deputado José Genoino e o ex-tesoureiro petista Delúbio Soares. E, do núcleo publicitário, serão julgados o publicitário Marcos Valério, seus ex-sócios, Ramon Hollerbach e Cristiano Paz, o advogado dele, Rogério Tolentino, e as funcionárias da agência SMP&B, Simone Vasconcelos e Geiza Dias.

O item 6 do processo é o quarto a ser analisado pelo Supremo. Antes foram votados o item 3 (contratos das agências de Marcos Valério com o Banco do Brasil e a Câmara dos Deputados), item 5 (gestão fraudulenta do Banco Rural) e item 4 (sobre lavagem de dinheiro). Ainda devem ser analisados os itens 7 (lavagem de dinheiro por parte do PT), 8 (evasão de divisas) e 2 (formação de quadrilha).

*Colaboraram Fabrício Calado e Guilherme Balza, em São Paulo