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Impeachment coloca povo na periferia da história, diz ministro de Dilma

Felipe Amorim e Ricardo Marchesan

Do UOL, em Brasília

15/04/2016 10h15Atualizada em 15/04/2016 11h52

Ao discursar em defesa da presidente Dilma Rousseff no processo de impeachment, o ministro da Advocacia-Geral da União, José Eduardo Cardozo, afirmou que qualquer governo nascido de uma “ruptura institucional” não terá legitimidade e citou Ulysses Guimarães ao dizer que “quando se tira o voto do povo, o povo é expelido do centro para a periferia da história”.

* Acompanhe pelo link http://zip.net/bls77W (URL encurtada e segura) a sessão na Câmara que decide o impeachment

Cardozo falou em defesa da presidente em sessão da Câmara dos Deputados que deu início à discussão do impeachment. Antes dele, pela acusação, falou o jurista Miguel Reale Júnior, um dos autores da denúncia contra Dilma. Reale chamou os deputados de "libertadores dessa prisão". A abertura do processo deve ser votada no domingo (17).

O ministro de Dilma reforçou o argumento do governo de que não foram praticados crimes de responsabilidade e de que não há nenhum ato direto da presidente que possa levar a seu afastamento.

“Não há ilícito, não há dolo [intenção]. E, se esta Casa [a Câmara] vier a seguir outro caminho, estará revelando descompromisso profundo com aquilo que outrora se festejou quando se derrotou a ditadura no Brasil”, disse. “Qualquer governo que venha a nascer de uma ruptura institucional não terá legitimidade para governar e cedo ou tarde isto será cobrado”, afirmou o ministro.

O governo tem classificado o processo de impeachment como um “golpe” e uma tentativa da oposição e do PMDB de chegar ao poder sem passar por eleições.

Cardozo iniciou sua fala citando o ex-deputado Ulysses Guimarães (1916-1992), um dos maiores expoentes do PMDB e presidente da Assembleia Constituinte que aprovou a Constituição Federal de 1988.

“Quando se tira o voto do povo, o povo é expelido do centro para a periferia da história, perde o pão e a liberdade”, disse Cardozo, ao citar frase atribuída a Ulysses.

A afirmação de Cardozo levantou um coro de deputados da base do governo com a palavra de ordem “Não vai ter golpe”. Durante sua manifestação, o ministro chegou a ser interrompido por gritos de deputados a favor do impeachment.

Ao deixar o plenário, o ministro não descartou entrar com nova ação no STF (Supremo Tribunal Federal) contra o processo de impeachment, até mesmo antes da votação do domingo. "A cada passo nós vamos avaliando", disse. Ele classificou a defesa que fez no plenário como "mais um round de uma batalha dura". O ministro também acredita que ainda será possível convencer deputados a votarem contra o impeachment, até domingo. "Eu senti um clima muito positivo de parlamentares. Não há abatimento", afirmou.

Cardozo disse que a defesa vai analisar, por exemplo, o discurso da acusação, feito por Miguel Reale Júnior, um dos autores do pedido.

"Ele falou de 2014, ele falou da Lava Jato na acusação. E o Supremo ontem vetou isso". Quando perguntado se isso poderia ser razão para um recurso no STF, Cardozo disse: "Nós vamos estar pegando e analisando".

Cardozo voltou a afirmar que a decisão do STF, de negar a liminar em que o governo pedia para suspender o processo de impeachment, teve aspectos positivos para o governo, por ter reconhecido que a Câmara deve considerar apenas dois pontos da denúncia contra a presidente Dilma Rousseff, as pedaladas fiscais e os decretos suplementares.

Requerimentos a Cunha

Cardozo afirma que fez dois requerimentos ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

O primeiro para que a defesa tenha o direito de falar mais uma vez, antes da votação dos deputados, no domingo. O argumento é que a defesa deve ser a última a se manifestar.

O outro requerimento é para que Cunha faça uma advertência aos deputados de que os discursos no plenário devam se referir apenas aos dois pontos da denúncia.

Pedaladas

O ministro da AGU centrou sua defesa em defender a legalidade dos atos praticados nas chamadas pedaladas fiscais e na publicação dos decretos que aumentaram a previsão de gastos do governo sem autorização do Congresso. Esses são os dois pontos da denúncia contra Dilma por crime de responsabilidade e com base nos quais é pedido o seu afastamento do cargo.

Segundo Cardozo, as pedaladas e os decretos eram entendidos como práticas regulares de governo, praticadas também por administrações estaduais, até que o TCU (Tribunal de Contas da União) mudou seu entendimento sobre o tema. Quando isso aconteceu, disse Cardozo, o governo cessou as práticas.

As pedaladas consistem no atraso de repasses a bancos públicos, o que fazia com que as instituições financeiras tivessem que arcar com o pagamento de programas federais. Segundo a denúncia, a prática mascarou os resultados negativos das contas do governo nos anos de 2014 e 2015, o que contribuiu para agravar a crise econômica.

Cardozo afirmou ainda que a legislação orçamentária permite a publicação dos decretos que ampliaram a previsão de gastos do governo. Segundo o ministro, os decretos não teriam prejudicado o cumprimento da meta fiscal (economia para pagar juros da dívida pública), pois se tratam apenas de uma autorização para o remanejamento de recursos do Orçamento.

Naquele momento, diz Cardozo, os gastos do governo já estavam restringidos por um decreto de contingenciamento que tinha o objetivo de garantir o cumprimento da meta fiscal.

O ministro também repetiu a acusação de que o processo de impeachment foi aberto por "retaliação" do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ao governo, que negou votos para salvar o mandato do peemedebista no Conselho de Ética. Segundo Cardozo, isso levaria à anulação do ato inicial de instauração do processo na Câmara, decisão adotada por Cunha em dezembro do ano passado.