Polícia Militar de São Paulo é rápida no gatilho e lenta no botão 'rec'
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Um relatório recente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública em parceria com a Unicef revelou dados alarmantes sobre o aumento da letalidade policial em São Paulo. Os números mostram uma reversão dramática dos avanços obtidos entre 2019 e 2022, período em que houve uma redução de 63% nas mortes por intervenção policial graças à implantação de câmeras corporais nas fardas dos policiais militares.
O tema é um dos destaques do episódio desta semana do A Hora, podcast de notícias do UOL com os jornalistas Thais Bilenky e José Roberto de Toledo, disponível nas principais plataformas. Ouça aqui.
A história remonta a 2019, ainda no governo de João Doria, quando o Ministério Público abriu uma ação civil pela condenação do Estado de São Paulo pelos índices absurdos de letalidade policial e solicitou a instalação de câmeras nas fardas dos policiais. O estopim para mudanças foi o caso de Paraisópolis, quando nove jovens morreram indiretamente por uma ação da PM que reprimiu uma festa, resultando em mortes por pisoteamento ou asfixia mecânica.
Em resposta, Doria lançou em julho de 2020 o programa Olho Vivo, implementando 10.125 câmeras corporais que cobriam 53% das unidades da Polícia Militar. Um diferencial crucial era que essas câmeras eram ligadas automaticamente no momento em que o policial a colocava na farda e gravavam ininterruptamente o que os policiais faziam enquanto estavam em serviço.
O cenário mudou radicalmente após a eleição de Tarcísio de Freitas, que havia feito campanha contra o uso das câmeras. Ao assumir o governo, Tarcísio impôs um corte orçamentário de 37% no programa Olho Vivo e sustou o projeto de expansão das câmeras, que deveria chegar a 16 mil unidades. Além disso, promoveu duas operações policiais consideradas altamente letais, como a Operação Escudo na Baixada Santista, que resultou em dezenas de mortes.
A mudança mais significativa, contudo, veio com uma nova licitação para as câmeras, que alterou fundamentalmente sua função. No novo modelo, as câmeras não ficarão ligadas o tempo todo e serão acionadas pelo policial ou pelo comando da Polícia Militar remotamente, o que, segundo José Roberto de Toledo, "muda totalmente o efeito do uso das câmeras".
Um estudo do Núcleo Especializado em Cidadania e Direitos Humanos analisou 38 casos de mortes por intervenção policial e constatou que em 37 dos 38 casos, o Copom [Centro de Operações da PM] só foi avisado pelo policial que tinha havido um tiroteio que tinha resultado em morte de uma pessoa depois que eles já tinham matado a pessoa. "Em média, demora 16 minutos para o policial acionar o Copom depois que a tragédia já está instalada, tornando ineficaz o argumento de que o centro de comando poderia acionar as câmeras remotamente", afirma o colunista do UOL.
Os resultados dessa política são evidenciados pelos números: a PM matou, em serviço, 649 pessoas, uma alta de 154% em relação a 2022. Mais alarmante ainda é o aumento de 120% nas mortes de crianças e adolescentes - a polícia matou 77 crianças e adolescentes. Paradoxalmente, os próprios policiais também sofrem com essa abordagem, com um aumento de 183% nas mortes de PMs em serviço.
A letalidade das abordagens também cresceu significativamente. Em 2022, a cada 100 mil pessoas revistadas, três acabavam mortas; em 2024, esse número saltou para seis. No caso de flagrantes policiais, a proporção de mortes passou de 2,3 para cada mil em 2022 para 5,3 em 2024, mais que dobrando em dois anos.
Organizações como a Conectas e a Defensoria Pública entraram com uma ação no Supremo Tribunal Federal para garantir a obrigatoriedade do uso das câmeras com gravação contínua, já que atualmente a letalidade dos batalhões com câmera já aumentou tanto quanto a letalidade dos que não usam câmera.
"Passou a ser inócuo porque eles não ligam a câmera quando precisa ligar", destacou Toledo. "A PM de São Paulo e o Tarcísio são rápidos no gatilho e muito lentos para ligar, para dar o 'rec' na câmera. E quem vai pagar o pato é o menino Ryan, a família do menino Ryan e vários outros 77 Ryans que a polícia matou nos últimos meses", completou.
Podcast A Hora, com José Roberto de Toledo e Thais Bilenky
A Hora é o podcast de notícias do UOL com os jornalistas Thais Bilenky e José Roberto de Toledo. O programa vai ao ar todas as sextas-feiras pela manhã nas plataformas de podcast e, à tarde, no YouTube. Na TV, é exibido às 16h. O Canal UOL está disponível na Vivo TV (canal nº 613), Sky (canal nº 88), Oi TV (canal nº 140), TVRO Embratel (canal nº 546), Zapping (canal nº 64) e no UOL Play.
Escute a íntegra nos principais players de podcast, como o Spotify e o Apple Podcasts já na sexta-feira pela manhã. À tarde, a íntegra do programa também estará disponível no formato videocast no YouTube. O conteúdo dará origem também a uma newsletter, enviada aos sábados.
39 comentários
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Marilene Espígares Burmas
A PM de São Paulo é ótima, quem critica e tem medo é porque deve algo...
Gilberto Jose Massaro
A polícia da Bahia é a mais letal do País, mas como o governador é um companheiro do pt ninguém toca no assunto, jornalistas imparciais da pior espécie.
Rubens Acácio Marques Gonçalves
Basta ser governador da direita que a imprensa "livre" não o deixa em paz.