Amanda Cotrim

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Reportagem

Contra 'oportunistas', Milei quer cobrar saúde e educação de estrangeiros

O governo argentino anunciou hoje (3) que "vai impulsionar uma série de mudanças no regime migratório". O fim da assistência médica gratuita em hospitais públicos e a cobrança de uma taxa nas universidades públicas para estudantes estrangeiros sem residência estão entre as medidas, afirmou o porta-voz da Casa Rosada, Manuel Adorni, em coletiva nesta terça-feira (3).

O governo enviará um projeto para modificar a lei de imigração da Argentina, que há mais de 20 anos permite que qualquer pessoa em território nacional, independente do seu status de residência, use os serviços públicos de educação e saúde gratuitamente.

"Os organismos nacionais, estaduais ou municipais competentes em matéria de saúde vão determinar as condições do acesso ao sistema público, incluindo a possibilidade de cobrar o serviço aos estrangeiros que não têm residência no país", afirmou o porta-voz Adorni.

O objetivo, segundo a Casa Rosada, é "avançar para um país organizado que proteja os cidadãos argentinos". O governo não detalhou, no entanto, se considerará como residentes os imigrantes com residência provisória ou apenas a residência permanente.

Para justificar a medida, a Casa Rosada afirmou que o estado de Salta, no norte do país, que faz fronteira com Bolívia e Chile, reduziu 95% a atenção de saúde pública a estrangeiros sem residência, gerando uma economia de 60 milhões de pesos.

Os oportunistas devem ficar do outro lado da fronteira a não vir a Argentina prejudicar os cidadãos que residem no território nacional Manuel Adorni, porta-voz da Casa Rosada

Estrangeiras podem enfrentar dificuldade para abortar

As medidas também podem afetar as mulheres estrangeiras que buscam interromper a gravidez voluntariamente —o aborto na Argentina é legal desde janeiro de 2021.

Uma reportagem da Folha revelou que a clinica particular Musa, em Rosário, a 300 km de Buenos Aires, recebeu 1.140 mulheres em 2022 para realizar o aborto seguro, sendo 301 brasileiras.

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A medida é polêmica, já que a lei de imigração da Argentina garante acesso gratuito à saúde e educação pública a qualquer pessoa em território nacional, independente da condição de residência. A lei é considerada referência mundial de direitos humanos, por não negar atendimento de saúde a qualquer pessoa que necessite, principalmente imigrantes não documentados que estão em uma situação de vulnerabilidade

Milei quer taxar estudante universitários estrangeiros

O governo disse que a reformulação no regime migratório pretende que as universidades públicas possam cobrar uma taxa de estudantes estrangeiros sem residência, o que representaria uma fonte de financiamento para as universidades. "Atualmente, um em cada três estudantes de medicina é estrangeiro", afirmou Adorni.

A Argentina tem 46 milhões de habitantes, de acordo com dados do Censo de 2022. Do total, 2 milhões são imigrantes, ou 4,2%, sendo mais de 60% de imigração regional: 27% do Paraguai, 17,5% da Bolívia, 8,4% da Venezuela e 8,1% do Peru.

Países como Brasil e Colômbia correspondem pouco mais de 2%. Os dados mostram ainda que 73,1% vivem na Província de Buenos Aires, sendo 21,7% na capital.

Apenas 18,8% (pouco mais de 360 mil pessoas) usam o sistema educacional.

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O país oferece educação gratuita a qualquer estrangeiro cuja residência esteja tramitando ou já tenha sido aprovada, sem o vestibular tradicional do Brasil —o que atrai milhares de brasileiros o ano todo.

Ao menos 20 mil brasileiros são estudantes na Argentina, sendo cerca de 12 mil de universidades públicas e 8 mil em universidades particulares, segundo dados recentes da pasta de Educação. A maioria vai estudar medicina. O último dado oficial é de que, entre 2015 e 2022, o número de brasileiros estudando na Argentina subiu de 4.000 para 20 mil

Brasileiros optam em estudar na Argentina pela facilidade no trâmite de residência permanente no país. Um acordo bilateral entre Brasil e Argentina possibilita que o brasileiro possa obter a residência permanente direto, sem passar pela residência provisória de dois anos, como os demais imigrantes de países do Mercosul e de outras nacionalidades.

No início do ano, o UOL revelou que o governo Milei estava revendo as condições para estrangeiros entrarem no país. Muitos foram barrados no aeroporto com o argumento de serem falsos turistas. A maioria deles, estudantes que pretendiam cursar faculdade na Argentina e iniciar o processo de residência em solo argentino.

A reforma que foi anunciada hoje pelo executivo também pretende incorporar uma lista de delitos para impedir a entrada de estrangeiros na Argentina ou expulsar um imigrante do país.

"Se um criminoso for pego em flagrante, cometendo um crime ou for preso atacando o sistema democrático, por exemplo, atacando as instituições, ele será expulso e proibido de entrar no país", informou Adorni. Ele não detalhou o que poderia ser considerado um "ataque" às instituições e ao sistema democrático e se isso valeria para qualquer estrangeiro, inclusive os que contam com residência permanente no país.

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