Andreza Matais

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Reportagem

Tabata diz ser autora de propostas apresentadas por outros deputados

O deputado federal Idilvan Alencar (PDT-CE) acusa a colega Tabata Amaral (PSB-SP) de "se apropriar" de sua ideia de criar uma poupança para estudantes de baixa renda.

Batizado de Pé de Meia pelo governo, o projeto foi aprovado pelo Congresso em 2023 e sancionado pelo presidente Lula (PT) neste ano.

Em todos os debates na disputa pela Prefeitura de São Paulo e no link "o que já fiz", a candidata fala em "entregas muito concretas" como deputada e cita o Pé de Meia como "um dos projetos que eu escrevi e aprovei".

Após ser procurada pelo UOL, a deputada agora afirma que a aprovação do texto "foi uma conquista coletiva da Bancada da Educação, que teve Tabata como principal liderança (época na qual assumiu a presidência) e o deputado Idilvan como um dos coordenadores", segundo nota de sua assessoria (leia ao final da reportagem a íntegra do que disse a equipe da candidata).

"Enquanto deputada, [Tabata] realizou diversas reuniões com os ministros de Estado para articular a aprovação deste PL [...] Como resultado da soma de esforços dos diversos autores e apoiadores, o PL 54/2021 foi aprovado no Congresso."

"Aderiu à mesma ideia"

A queixa do deputado Idilvan Alencar foi registrada em ofícios protocolados na Câmara durante a tramitação do Pé de Meia.

No documento, ele informa ao presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), que apresentou sua proposta dois anos antes de Tabata.

"Passados aproximadamente dois anos, a deputada Tabata Amaral, aderindo à mesma ideia, apresentou projeto que também propõe a criação de incentivo financeiro aos estudantes matriculados no ensino médio pertencentes a unidades familiares em situação de pobreza ou de extrema pobreza", escreveu Alencar.

"Como se vê, os dois projetos têm objetivo e destinatários idênticos, quais sejam: incentivo financeiro a estudantes de baixa renda", complementou.

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O Regimento Interno da Câmara (artigos 139 e 142) diz que propostas análogas devem ser agrupadas para análise conjunta. Nesse caso, o texto mais antigo "carrega" os demais.

A deputada apresentou um requerimento para impedir isso.

Idilvan protestou: "A única intenção que se vislumbra com a devida desapensação é no sentido de retirar do autor da proposição mais antiga a prerrogativa da autoria. Fato que se afigura lamentável numa casa democrática. Tratam de matéria idêntica", escreveu.

O que diz o texto de Idilvan apresentado em 2019: "Dispõe do programa Poupança Estudantil voltado aos estudantes de baixa renda das escolas públicas".

O que diz o texto de Tabata apresentado em 2021: "Propõe a criação de incentivo financeiro aos estudantes matriculados no ensino médio pertencentes a unidades familiares em situação de pobreza ou extrema pobreza".

Procurado, o deputado não respondeu aos pedidos do UOL para comentar o assunto. A vinculação do Pé da Meia ao Bolsa Família já constava do projeto de Idilvan.

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"O que já fiz"

O Pé de Meia não é o único tema controverso no discurso da candidata. Tabata também lista em seu site na aba "o que já fiz":

"Conseguimos devolver aos cofres públicos R$ 9 bilhões com muitas denúncias e muito trabalho de fiscalização."

A candidata não apresenta nenhum dado que corrobora a afirmação (veja a íntegra abaixo).

Procurada, a assessoria de Tabata menciona de forma genérica iniciativas conjuntas de um gabinete coletivo que atuou na fiscalização do governo Bolsonaro (PL).

"Famílias com renda de até meio salário mínimo agora recebem de volta de 20% a 100% do Imposto e da Contribuição sobre Bens e Serviços."

A proposta de cashback de tributos — cuja autoria Tabata atribuiu a si — ainda não foi aprovada pelo Congresso, portanto ninguém está recebendo nada.

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A assessoria da deputada diz que o tema está em discussão na reforma tributária e "será aprovado em breve".

Lei de Combate à Pobreza Menstrual

O projeto aprovado é de autoria da então deputada Marília Arraes (PT-PE).

A assessoria de Tabata diz que "as notas taquigráficas [da Câmara] demonstram que vários deputados se referem a ela como autora e articuladora desse projeto"."Isso acontece porque ela foi a responsável por conseguir pautar este projeto em plenário", afirma sua equipe. Ela também diz que projetos de autoria da deputada relativos ao tema foram apensados ao texto aprovado.

"Sou presidente e fundadora da Frente Parlamentar Mista pela Licença-Paternidade."

O requerimento 1720/2024 de criação da frente ainda aguarda despacho do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Formalmente, portanto, o colegiado não existe.

A assessoria de Tabata diz que a "Frente Parlamentar Mista pela Licença-Paternidade foi lançada no dia 05/06/2024".

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"Sou presidente da frente parlamentar mista para a promoção da saúde mental."

Tabata não é mais presidente da frente. O colegiado é presidido atualmente por seu cunhado, o deputado Pedro Campos (PSB-PE).

A assessoria da deputada admite que ela não é mais a presidente do colegiado desde agosto.

Marco Legal do Ensino Técnico

O projeto — do qual Tabata também diz ser autora — é do então deputado João Campos (PSB-PE), namorado de Tabata e atual prefeito do Recife. Ela foi a relatora.

A assessoria da deputada informa que ela atuou diretamente na autoria original do projeto e depois, como relatora, definiu a redação final do texto.

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Estilo dos candidatos

As informações fazem parte de uma pesquisa em andamento sobre os estilos de campanhas de deputados federais às prefeituras de capitais.

O levantamento é conduzido pelo cientista político Sérgio Praça (FGV-CPDOC).

A maneira como a deputada Tabata Amaral divulga o que supostamente fez na Câmara dos Deputados leva a confusão. É um estilo de campanha que oculta o papel do Legislativo como um todo. Há um padrão de comportamento de apropriação de ideias de outros parlamentares para além de acordos políticos normais, aproveitando-se do prestígio que tem entre grandes empresários e na opinião pública.
Sérgio Praça, pesquisador da FGV

Como contraponto, o pesquisador afirma que o deputado e também candidato à prefeitura paulistana Guilherme Boulos (PSOL) tem um estilo diferente.

"Em seu site oficial de campanha, ele usa a terceira pessoa do plural e detalha de quem é o mérito das iniciativas em que se envolveu."

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Copia e cola

Em 2020, Tabata também foi acusada pela então deputada Marília Arraes (PT-PE) de copiar seu projeto que previa a distribuição gratuita de absorventes.

Assim como no Pé de Meia, o texto de Tabata foi protocolado depois, com o mesmo objetivo, mas algumas mudanças.

Na época, a petista se queixou publicamente de Tabata "divulgar a ideia como se tivesse partido dela". Outro deputado, Boca Aberta (Pros), também havia apresentado projeto no mesmo sentido.

O texto aprovado foi o de Marília. A proposição de Tabata foi apensada a ele.

Fact Checking

A agência Aos Fatos já havia identificado inconsistências no discurso de Tabata, em agosto, quando a candidata participou do programa Roda Viva, da TV Cultura.

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"Eu tenho um histórico de seis anos de Brasília em que aprovei Pé de Meia, absorvente na escola, ensino técnico, mudanças climáticas, Marco das Startups", disse a candidata na ocasião.

A agência apontou falta contexto em dois dos projetos e imprecisões nos outros três.

"Dos cinco projetos citados pela deputada, apenas dois são de sua autoria: o PL 54/2021, que criou o programa Pé de Meia, e o PL 4.129/2021, que dispõe sobre diretrizes gerais para a elaboração de planos de adaptação à mudança do clima", concluiu o Aos Fatos.

Outro lado

Veja a seguir a íntegra do que disse a assessoria de Tabata Amaral:

Afirmação 1:

Em ofícios protocolados na Câmara, o deputado Ildivan Alencar afirma que a deputada "se apropriou" do projeto apresentado por ele em 2019 que propôs uma poupança para alunos do ensino médio. A deputada foi contra anexar os dois projetos. O deputado disse que as iniciativas são "idênticas" e que Tabata teve como intenção retirar dele a autoria da proposta mais antiga.

Pergunta 1: O que a deputada diz a respeito?

Esclarecimento 1: A aprovação deste importante projeto de lei foi uma conquista coletiva da Bancada da Educação, que teve Tabata como principal liderança (época na qual assumiu a presidência) e o deputado Idilvan como um dos coordenadores. Ambos trabalharam conjuntamente para que o PL que instaurou o Pé-de-meia fosse aprovado.

A poupança para o ensino médio foi a principal proposta de Tabata na reeleição e o principal foco da atuação de seu segundo mandato. Enquanto deputada, realizou diversas reuniões com os Ministros de Estado para articular a aprovação deste PL, destacam-se reuniões com a ministra Simone Tebet, o ministro Camilo Santana e o ministro Alexandre Padilha. Em cada uma dessas reuniões, a candidata apresentou o projeto e recebeu sugestões e apoio para a aprovação da medida.

Por fim, como resultado da soma de esforços dos diversos autores e apoiadores, o PL 54/2021 foi aprovado no Congresso. Destaca-se que o deputado Idilvan é um dos coautores do PL 54/2021.

Afirmação 2:

"Conseguimos devolver aos cofres públicos R$ 9 bilhões com muitas denúncias e muito trabalho de fiscalização"

Pergunta 2: Quais as iniciativas que somam esse valor?

Esclarecimento 2: No primeiro ano de deputada, Tabata criou, junto com o deputado Felipe Rigoni e o senador Alessandro Vieira, o Gabinete Compartilhado, iniciativa em que os parlamentares dividiram equipes legislativas para atuar em comissões parlamentares conjuntas e fiscalizar o governo federal.

Esse valor se refere a algumas iniciativas tomadas pelo Gabinete, como:

1- Repasses para a compra de kit robótica que foram suspensos por medida cautelar;
2- Contestação de licitação para compra de 3.850 ônibus escolares;
3- Superfaturamento na compra de caminhões de lixo;
4- Contratos da Codevasf com suspeitas de irregularidade
5- Picapes 4x2 compradas pela Codevasf;
6- Compra de 6.240 máquinas pesadas pelo MDR;
7- Contratação de consultores pelo MEC;
8- Compra de gêneros alimentícios pelo governo federal
9- Transferência de recursos de Covid-19 para os entes federativos
10- Impugnação de edital do Min. das Comunicações

Afirmação 3:

"Famílias com renda de até meio salário mínimo agora recebem de volta de 20% a 100% do Imposto e da Contribuição sobre Bens e Serviços"

Pergunta 3: O cashback de tributos não foi aprovado ainda pelo Congresso. Por que a deputada coloca como se já estivesse valendo?

Esclarecimento 3: Porque a aprovação do cashback na regulamentação da reforma tributária é consensual e ocorrerá em breve no Senado, já tendo sido aprovada na Câmara. E é importante ressaltar que a existência do cashback já foi aprovada no componente constitucional da reforma tributária e foi uma das pautas prioritárias da Tabata no GT da Reforma Tributária, que ela participou como única mulher.

Afirmação 4:

"Lei de Combate à Pobreza Menstrual"

Pergunta 4: O projeto aprovado é de autoria da deputada Marília Arraes (PT-PE). Por que a deputada diz no link "o que eu fiz" que é autora do projeto? Na época, Arraes disse que a deputada copiou o seu projeto.

Esclarecimento 4: PL dos Absorventes (PL 4968/2019, PL 428/2020 e PL 1999/2021): A deputada Tabata Amaral foi autora do PL 428/2020 e do PL 1999/2021, apensados ao PL 4968/2019, conforme o parecer do relator disponível no link:

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O voto constante no parecer do relator trata, no mesmo parágrafo, sobre a aprovação do PL 4968/2019, do PL 428/2020 e do PL 1999/2021 na forma do substitutivo. "Ante o exposto, pela Comissão Especial, votamos pela constitucionalidade, juridicidade, boa técnica legislativa e adequação financeira-orçamentária dos Projetos de lei nº 4.968/2019, nº 5.474/2019, nº 6.340/2019, nº 428/2020, nº 1.547/2021, nº 1.664/2021, nº 1.807/2021, nº 2.092/2021, nº 391/2021, nº 61/2021, nº 672/2021, nº 2.653/2021, nº 2.780/2021, nº 2.652/2021 e nº 1999/2021, e, no mérito, pela aprovação do principal e dos seus apensados, na forma do substitutivo em anexo."

De forma que o texto do substitutivo foi construído a partir do PL principal e dos apensados, nos quais estão incluídos os PLs de autoria da deputada Tabata Amaral. Adicionalmente, a tramitação do PL e as notas taquigráficas da sessão plenária na qual ele foi aprovado atestam a
participação da deputada Tabata Amaral na aprovação do projeto.

Nessa mesma linha, destaca-se o seguinte trecho do discurso da relatora do plenário, deputada Jaqueline Cassol (PP-RO), disponível no link: "Agradeço a cada um dos autores colegas deputados e ao presidente Arthur, que confiaram a mim a Relatoria desse importante projeto. Agradeço também à nossa Coordenadora da Mulher, Deputada Celina Leão. Peço o apoio de todos para esse projeto. Vou fazer menção aos seguintes autores: deputada Marília Arraes, deputado Boca Aberta, deputada Tabata Amaral".

As notas taquigráficas ainda demonstram que vários deputados se referem à deputada Tabata como autora e articuladora desse projeto. Isso acontece porque ela foi a responsável por conseguir pautar este projeto em plenário, a partir de um grande acordo com a liderança da Bancada Feminina e a Presidência da Câmara. Tabata trabalhou essa pauta como um dos pilares de seu mandato e atuou junto ao poder executivo nos estados de São Paulo e Pernambuco, assim como em diversos municípios para que políticas semelhantes fossem aprovadas em nível regional.

Afirmação 5:

"Sou presidente e fundadora da Frente Parlamentar Mista pela Licença-Paternidade"

Pergunta 5: A comissão ainda não foi criada pela Câmara. A proposta foi apresentada em maio. A deputada gostaria de comentar?

Esclarecimento 5: A Frente Parlamentar Mista pela Licença-Paternidade do Congresso Nacional foi lançada no dia 05/06/2024. Abaixo, encontram-se os links para a cerimônia completa, assim como as matérias que repercutem o lançamento nas páginas da Câmara dos Deputados e no Senado Federal.

https://www.youtube.com/watch?v=pzGvWCpCl4s

https://www2.camara.leg.br/a-camara/estruturaadm/secretarias/secretaria-da-mulher/noticias/congresso-nacional-lanca-a-frente-parlamentar-pela-licenca-parternidade

https://www12.senado.leg.br/radio/1/conexao-senado/2024/06/13/presidente-da-copai-fala-sobre-regulamentacao-da-licenca-paternidade

Afirmação 6:

Presidente da Frente pela Renda Básica

Pergunta 6: O presidente do colegiado era o deputado João Campos, segundo dados da Câmara. Por que a deputada diz que era a presidente?

Esclarecimento 6: Porque ela foi presidente da Frente pela Renda Básica logo depois do deputado João Campos, no ano de 2021. Aqui há uma matéria que cita esse fato (link).

Afirmação 7:

"Sou presidente da frente parlamentar mista para a promoção da saúde mental"

Pergunta 7: A candidata foi presidente até agosto. O grupo é presidido atualmente pelo seu cunhado, Pedro Campos (PSB-PE). Por que sua página diz que ela é a presidente?

Esclarecimento 7: A candidata fundou a Frente Parlamentar para Promoção da Saúde Mental e esteve na presidência da Frente até o dia 24/05/2024, no qual transmitiu a presidência ao deputado Pedro Campos. Desde então, a deputada continua trabalhando como membro atuante da referida Frente Parlamentar.

Afirmação 8:

Marco Legal do Ensino Técnico

Pergunta 8: O projeto é de autoria do então deputado João Campos (PSB-PE). Por que a deputada ignorou o crédito ao autor na sua página?

Esclarecimento 8: Segundo o Regimento Interno da Câmara dos Deputados, todos os deputados que assinaram o "protocolo" dos Projetos de Lei são autores:

"Art. 102. A proposição de iniciativa de Deputado poderá ser apresentada individual ou coletivamente.

§ 1º Consideram-se Autores da proposição, para efeitos regimentais, todos os seus signatários, podendo as respectivas assinaturas ser apostas por meio eletrônico de acordo com Ato da Mesa."

Especificamente sobre o PL 6494/2019:

A deputada Tabata Amaral foi autora original do projeto, conforme disponível no link. O documento original no site oficial da Câmara coloca o nome da Deputada Tabata Amaral ao lado do Deputado João Campos (o primeiro autor), ambos como "coautores".

No dia 16/12/2021, a deputada Tabata Amaral protocolou Requerimento de Retirada de Assinatura especificamente com o objetivo de ser relatora da Comissão Especial sobre o PL. Trata-se de uma questão procedimental, uma vez que o autor da proposta não poderia atuar como relator. A deputada atuou diretamente na autoria original do projeto e depois, como relatora, definiu a redação final do texto, além de ter trabalhado intensamente na articulação da proposta.

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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