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OPINIÃO

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Moro entra pelos fundos, Bolsonaro esbraveja e Lula faz festa na Argentina

O ex-presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, ao lado de Cristina Kirchner e Alberto Fernandez, vice e presidente da Argentina, durante evento para celebrar a democracia e o Dia dos Direitos Humanos, em Buenos Aires - REUTERS/Mariana Nedelcu
O ex-presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, ao lado de Cristina Kirchner e Alberto Fernandez, vice e presidente da Argentina, durante evento para celebrar a democracia e o Dia dos Direitos Humanos, em Buenos Aires Imagem: REUTERS/Mariana Nedelcu

Colunista do UOL

11/12/2021 13h10

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"Eeeee, vamos a volver, a volver, a volver", gritava a multidão de 250 mil manifestantes na histórica Plaza de Mayo, em frente à Casa Rosada, no final da tarde de sexta-feira, quando o nome de Lula era lembrado nos discursos, sentado ao lado do presidente argentino Alberto Fernandez, da vice Cristina Kirschner e de Pepe Mujica, o lendário ex-presidente do Uruguai.

Dirigindo-se a Lula, Cristina comentou: "A última vez que eles gritaram isso, Lula, deu certo", referindo-se à vitória do peronismo nas ultimas eleições.

Poucas vezes em sua longa trajetória política, o ex-presidente brasileiro recebeu tamanha consagração como nesta Festa pela Democracia, que comemorava os 38 anos do fim da ditadura militar na Argentina e o Dia Mundial dos Direitos Humanos.

A festa começou cedo, com muita música e bandeiras do Brasil se misturando às da Argentina e a faixas de sindicatos e movimentos sociais, uma celebração muito emotiva, que homenageou as célebres mães da Plaza de Mayo e foi transmitida ao vivo para o Brasil pelo Youtube da emissora estatal e as redes sociais do PT.

Vi por acaso estas imagens na internet e notei o contraste com a guerra eleitoral brasileira, ora protagonizada pelos dois candidatos da extrema-direita, que passaram os últimos dias se atacando mutuamente nas redes antissociais e em eventos públicos, um chamando o outro de "traidor", sem esquecer de mirar também em Lula.

Toda eleição deveria ser uma grande festa de celebração da democracia, e não de guerra, como está acontecendo por aqui, a 10 meses da abertura das urnas.

Acossado por Moro em seu próprio campo, receoso de sequer chegar ao segundo turno da eleição presidencial, Bolsonaro voltou a atirar para todos os lados _ nos adversários, nos governadores, no STF, nos passaportes de vacinação, nas pesquisas eleitorais, na mídia em geral, no que aparecer pela sua frente como ameaça à reeleição.

Enquanto o presidente monta o palanque no próprio Palácio do Planalto, seu ex-ministro continua rodando o país para lançar o livro "Contra o Sistema da Corrupção", o seu samba de uma nota só, que ajudou a eleger Bolsonaro em 2018, e já não é a maior preocupação dos brasileiros, mais preocupados com a fome, o desemprego e a inflação.

Na última quarta-feira, no Rio, como já aconteceu em outras capitais, Moro teve que usar uma porta lateral do Teatro dos Quatro, chegando ao palco pelos fundos, protegido por seguranças que cercaram um grupo de artistas reunidos para protestar contra sua presença, xingando-o de "fascista".

Furioso com a ordem do ministro Alexandre de Moraes, do STF, que mandou investigar a fake news do presidente sobre a vacinação contra a Covid-19, associando-a ao risco de contrair o vírus da Aids, Bolsonaro voltou a ameaçar com uma crise institucional".

"Ou todos nós impomos limites para nós mesmos ou pode-se ter crise no Brasil. Apesar de a grande mídia me acusar de provocar, agredir, não tem agressão minha. Estou tomando sete tiros de 62, quando dou um tiro de 62, estou provocando", queixou-se.

Na Plaza de Mayo, ao concluir seu breve discurso, Lula foi na direção exatamente oposta para defender a união entre os povos latino-americanos::

"Esse é um dia para vocês encherem o coração de esperança, porque a democracia não é um pacto de silêncio. É o momento extraordinário em que nós nos manifestamos na construção de uma sociedade efetivamente justa, igualitária, humanista, fraterna, onde o ódio seja extirpado e o amor seja o vencedor".

Para se ter uma ideia dos contrastes entre as três campanhas, refletidos em todas as pesquisas que apontam para uma vitória de Lula já no primeiro turno, o ministro da Economia, Paulo Guedes, em almoço com empresários da Esfera Brasil, botou mais lenha na fogueira:

"Se vocês acham que a gente vive um período de Guerra Fria entre governo e Congresso, aguardem. Se o Moro vencer a eleição, vai ser uma Guerra Nuclear. Ou eles botam o Moro pra fora ou o Moro fecha o Congresso".

E pensar que, até outro dia, Guedes e Moro eram os dois poderosos superministros de Bolsonaro que iriam acabar com a "velha política", implantar uma "nova ordem" e levar o país ao paraíso.

Nas voltas que a vida dá, nada como um dia após o outro, com uma noite no meio. E que longa noite...

Não poderia ter sido mais diferente a semana para os três candidatos que de fato disputarão as eleições presidenciais do ano que vem.

Vida que segue.