Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
A comovente despedida de Fred no Maracanã lotado, uma bela festa brasileira
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Miserável país aquele que não tem heróis. Miserável país aquele que precisa de heróis (Bertold Brecht).
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Precisar, não precisa, mas sempre faz bem ter alguém para a gente admirar, em qualquer área da atividade humana, seja nas guerras, na política, na cultura, na ciência ou no futebol. Nem precisa ser herói de nada, basta ser teu ídolo, alguém com quem você se identifica, te representa e vale a pena torcer por ele.
Frederico Chaves Guedes, o Fred, um mineiro típico de Teófilo Otoni, desses de almanaque, o come-quieto que sempre fazia seus golzinhos por onde passou, nunca foi o melhor jogador do futebol brasileiro, mas a comovente despedida dele do futebol, aos 38 anos, neste sábado no Maracanã superlotado por mais de 60 mil torcedores em festa, certamente ficará registrado para sempre como um dos mais belos momentos do nosso futebol.
Nem o nosso imortal Pelé, maior jogador de todos os tempos, quando se despediu dos campos brasileiros, teve uma homenagem igual. Durante horas, o estádio inteiro cantou, gritou o nome de Fred, agitou faixas e bandeiras, soltou fogos e se emocionou com o último jogo da carreira de um dos maiores ídolos do clube.
Quando o jogo acabou, ninguém queria ir embora. Parecia que a torcida não queria se separar do seu ídolo. Nem ele podia imaginar essa despedida apoteótica, com direito ao hino do Fluminense tocado ao piano por Artur Moreira Lima, depois de chegar ao fundo do poço, execrado junto com Felipão, como um dos culpados pelo fracasso do Brasil na Copa de 2014, em que a seleção brasileira apanhou de 7 a 1 da Alemanha, em pleno Mineirão, o palco onde ele conquistou primeiro a fama de goleador.
Chamavam-no de "cone", por ficar parado na área, esperando a bola que nunca chegava. Os outros jogadores voltaram aos seus times na Europa, só ele ficou aqui, para ir de bicicleta de Belo Horizonte ao Rio e se tornar o segundo maior artilheiro da história do Fluminense (o maior foi Waldo).
O que aconteceu depois na comunhão de Fred com a torcida tricolor é difícil de explicar. Não que ele fosse uma unanimidade. Ao contrário, teve muitos altos e baixos, épocas em que não podia nem sair na rua para não ser xingado, mas logo ele voltava a fazer seus gols decisivos e conquistar títulos. É um caso raro de superação repetida durante a mesma longa carreira, um jogador que representava a torcida dentro de campo, nos bons e nos maus momentos.
Num país sem heróis, em que o ídolo de hoje é contestado amanhã, e nem Pelé conseguiu ser uma unanimidade, Fred foi um símbolo do brasileiro comum nos gramados, aquele que não desiste nunca, e talvez por isso tenha criado tamanha empatia com a torcida do seu time, sendo idolatrado por crianças, jovens e velhos tricolores até o seu último jogo. Na cerimonia de despedida, não faltou nem a velha bicicleta, com a qual ele deu a volta olímpica no estádio diante daquela multidão em êxtase.
Com tanta coisa ruim acontecendo no nosso país, eu não poderia ir dormir sem registrar esse raro momento de pura felicidade, proporcionado pelo ídolo e sua torcida, irmanados num sentimento de gratidão e encantamento mútuo.
Valeu Fred, valeu torcida do Fluminense. Foi muito bonito. Me fez bem à alma ver aquele espetáculo da mais pura brasilidade no Maracanã, mesmo sendo torcedor de outro tricolor, o do Morumbi.
Brecht que me perdoe, mas a vida tem dessas coisas surpreendentes que ninguém explica, apenas sente.
Vida que segue.
Em tempo: atualizado e corrigido às 13h05 de 10/07/2022
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