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OPINIÃO

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Para evitar novos ruídos, foco da política externa deveria ser a Amazônia

Apesar do desmatamento na Amazônia cair para níveis inferiores a 2021 e 2022, os índices permanecem acima da média histórica: não basta fazer, é preciso mostrar o que é feitol - Foto: Agência Brasil
Apesar do desmatamento na Amazônia cair para níveis inferiores a 2021 e 2022, os índices permanecem acima da média histórica: não basta fazer, é preciso mostrar o que é feitol Imagem: Foto: Agência Brasil

Colunista do UOL

30/05/2023 19h04

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A cada nova viagem ou encontro com chefes de Estado, declarações do presidente Lula têm provocado mais ruídos e críticas à nossa política externa, aqui dentro e lá fora. Parece que há até um certo masoquismo do governo nessa conduta errática, ao dar munição para seus inimigos. Isso não acontecia nos dois primeiros mandatos do petista.

Falar mal dos Estados Unidos, em visita à China, e agora em Brasília, diante do polêmico, para dizer o mínimo, presidente venezuelano Nicolás Maduro, ou dividir a responsabilidade pela guerra igualmente entre Rússia e Ucrânia; propor uma nova moeda para substituir o dólar nas transações internacionais, sem antes elaborar uma proposta concreta junto com outros players, baseada em amplos estudos, e coisas do gênero, certamente não contribuem para o Brasil ficar bem na foto.

Seria preciso, antes de mais nada, definir uma prioridade, carregar uma bandeira que seja de aceitação universal, capaz de abrir em vez de fechar portas, para buscar um entendimento com todo mundo, como Lula gosta de fazer.

Salta aos olhos essa prioridade, como já ficou claro durante a campanha e nas viagens internacionais do presidente: é a preservação da Amazônia, um desafio mundial, que pode colocar o país na liderança da nova economia verde e da sustentabilidade econômica.

Não sou especialista em política externa, nem em nada, mas não é preciso ser um grande diplomata para perceber que, no momento em que Lula e o Brasil voltam a ter projeção no mundo, exatamente por causa da Amazônia, nós não deveríamos desperdiçar tempo e munição com outros assuntos.

São tantos países hoje querendo ajudar o Brasil no Fundo Amazônia que a nossa tarefa primeira deveria ser a elaboração de projetos e programas para empregar com urgência esses recursos da melhor forma possível, na preservação da floresta, na defesa da terra dos povos originários e das condições de vida e trabalho dos ribeirinhos. Só o dinheiro não basta: é preciso saber o que fazer com ele.

Como também não sou de roubar ideia dos outros sem citar a fonte, devo dizer que cheguei a essa conclusão ao ouvir hoje o comentário de Otávio Guedes, no Estúdio I da GloboNews.

Em vez de só criticar a forma desastrosa como Lula conduziu o encontro com Maduro, com tanta pompa e circunstância diante de um autocrata legítimo, quando o presidente venezuelano é acusado de uma penca de crimes contra a humanidade no Tribunal Internacional de Haia, Guedes se empolgou ao falar do que é possível fazer nas nossas relações exteriores, tendo como foco central a defesa da Amazônia.

É preciso organizar um grande mutirão de esforços do governo, convocar todos os ministros para se envolver neste desafio, promover a tão falada e pouco aplicada transversalidade e convidar as melhores cabeças estrangeiras para propor e discutir caminhos viáveis para promover a vida, em lugar da morte, neste santuário da natureza hoje tomado pelo crime organizado. Não basta ter ideias geniais, é preciso colocá-las no papel ou na tela do computador, e provar que são viáveis.

Até agora, não vimos nada disso acontecer, mas sempre é tempo de começar. Não podemos ficar só nas ações emergenciais para expulsar os invasores e prover os indígenas com comida e remédios. É necessário preparar programas permanentes para garantir a sustentabilidade econômica da região, investir pesado em educação e saúde, criar frentes de trabalho para replantar a floresta desmatada.

Acima de tudo, é preciso mostrar o que está sendo feito, como a vida pode mudar para melhor em pouco tempo nas regiões mais ermas e abandonadas pelo poder público, para estimular mais gente a se engajar nesse mutirão, como se estivéssemos indo para uma guerra _ uma guerra santa, pela paz e pela vida de todos.

Seria fundamental também a presença constante do presidente Lula nestes campos de batalha do bem, acompanhando de perto os trabalhos dos batalhões cívicos. Desde o golpe militar de 1964, a Amazônia foi entregue aos cuidados dos militares, que torraram rios de recursos com suas mordomias e de nada cuidaram.

Agora chegou a vez da sociedade civil se organizar para defender a Amazônia, com seus estudantes e professores, médicos e sanitaristas, padres e pastores, cientistas e voluntários em geral, para meter a mão na massa e, quem sabe, inspirar os militares a fazer o mesmo.

Não basta dizer que a Amazônia é nossa e ninguém tasca. Governo e sociedade precisam se unir para defendê-la com trabalho e não com armas, antes que seja tarde. Sonhar também é preciso.

Atenção: em agosto, Belém do Pará sediará uma cúpula dos países amazônicos: esta é uma grande oportunidade para o Brasil anunciar os pilares centrais de um plano para a ocupação civilizada da Amazônia. Mãos à obra.

Fica a sugestão.

Vida que segue.