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Até chantagem tem limite: Saúde tem que ser inegociável para o governo Lula
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Com o papo mole de que "falta articulação política ao governo", o que o Centrão de Arthur Lira quer, na verdade, em português bem claro, é o mesmo de sempre: mais verbas, mais cargos, mais emendas e, se possível, um ministério com orçamento gordo.
Desde antes da posse de Lula, o presidente da Câmara já estava de olho no Ministério da Saúde, logo uma das espinhas dorsais do novo governo, onde em outros tempos o seu PP (o partido que já foi de Paulo Maluf, não se esqueçam) deitava e rolava.
Quanto mais a Polícia Federal fecha o cerco a Lira e à gangue da robótica de Alagoas, mais o Centrão se assanha para botar a mão nas verbas do orçamento, que já não é tão secreto, para ver o governo de joelhos.
Lira se acostumou mal no governo passado, posando de primeiro-ministro num regime ainda presidencialista, quando fazia o que queria com as emendas de relator, como as que alimentaram prefeituras e empresas amigas de Alagoas, às custas do dinheiro desviado da Educação para bolsos particulares, tudo em nome da "governabilidade".
Quem mandava lá eram os pastores da grana amigos do governo. Agora, o ministério está nas mãos de Camilo Santana, ex-governador do Ceará, que ajudou a implantar em seu estado o melhor sistema de educação pública do país. Na Saúde, Lula convocou Nísia Trindade, que fez um belíssimo trabalho de saúde pública na Fundação Oswaldo Cruz nos últimos anos.
Saúde e Educação têm que ficar de fora das negociações em torno de mudanças ministeriais, que alimentam o noticiário neste feriadão. É uma questão de honra para o governo Lula, pois foram essas duas áreas, vitais para o futuro de qualquer país, as mais bombardeadas pela nuvem de gafanhotos que assaltou o país.
Enquanto estiverem discutindo o destino do Ministério do Turismo ou cargos de segundo escalão, tudo bem, façam bom uso, mas o governo precisa impor limites à cobiça insaciável da tropa do Centrão e traçar uma linha divisória: daqui vocês não vão passar.
Até o jogo de chantagens sucessivas, habilmente executado pelo presidente da Câmara, não pode ultrapassar a fronteira entre Executivo e Legislativo. Afinal, em outubro, foi eleito o governo de Lula, não o de Lira. No dia 1º de janeiro, o poder mudou de mãos no Brasil e tem muita gente que ainda não entendeu isso.
Cada vez que as manchetes comemoram uma "nova derrota de Lula" no parlamento, é preciso ver se quem perde é só o governo ou é o país, como aconteceu semanas atrás com o tratoraço da bancada ruralista sobre as estruturas dos ministérios do Meio Ambiente e dos Povos indígenas, que abalou nossa credibilidade no exterior, e trará prejuízos econômicos justamente para o setor agropecuário que o Centrão representa.
Não se trata de passar o pano nos erros já cometidos pelo governo e pelo presidente nestes primeiros meses, mas de ter clareza sobre o que está em jogo neste momento: o futuro do Brasil como país independente e da nossa frágil democracia, ameaçada até outro dia nas portas dos quarteis. Ou quer-se por acaso a volta do governo do capitão e da política econômica suicida de Paulo Guedes, ainda hoje defendida por Lira e Campos Neto em almoços e jantares.
Se o governo perdeu, a "vitória" do marco temporal na Câmara foi de quem? De quem quer liberar áreas indígenas, já demarcadas ou não, para os garimpeiros, traficantes, desmatadores e agrotrogloditas em geral, como aconteceu nos anos recentes, em que o crime organizado ocupou a Amazônia sob os olhos complacentes das nossas Forças Armadas ou do país que busca se afirmar como potência da economia verde dos novos tempos?
Ficamos discutindo o tempo todo o varejão da política, em quem entra e quem sai do ministério, o próximo achaque do parlamento ao governo, se Michelle vai ou não sair candidata, quem será candidato da direita para a prefeitura de São Paulo, se Lira está irritado com o presidente, ou vice-versa, enquanto os reais problemas do país ficam em segundo plano.
Depois do feriadão, está na hora de voltar-se para o Brasil real, que só quer trabalhar em paz, sem medo do amanhã.
Vida que segue.
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