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Brasileiros se unem para fazer e doar sopa a refugiados que chegam a Berlim
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A cozinha do apartamento da brasileira Daiane Kich, 39, em Berlim, se transformou em um ponto de encontro e trabalho para brasileiros que estão ajudando refugiados que deixam a Ucrânia em guerra e chegam em busca de refúgio na capital da Alemanha.
A ação, que começou na quinta-feira passada, já preparou e distribuiu 3 mil marmitas a refugiados na Estação Central de Berlim — onde chega a maioria dos civis que fogem da guerra. O grupo de voluntários brasileiros conta com cem pessoas, que fazem doações em quatro visitas diárias (9h30, 13h, 17h e 22h).
A gaúcha de Pareci Novo mora com o marido desde 2015 na Alemanha —em Berlim, há um ano e meio. Por dois anos, conta, ela atuou na área de gastronomia, mas deixou o trabalho para cuidar do filho de 3 anos.
A ação dos brasileiros começou quando Daia, como é chamada, recebeu uma mensagem de uma brasileira em um grupo de WhastApp, perguntando quem poderia ajudá-la com doações a refugiados que estavam chegando a Berlim.
"Eu mandei mensagem dizendo que poderia ajudar, e fomos à estação para fazer uma entrega de pouco mais de 30 marmitas. Era para ser algo pontual", lembra.
Mas a ação fez sucesso, e um voluntário que está atuando no local a procurou. "Ele se emocionou e disse que aquela ajuda era muito bem-vinda e necessária; e me perguntou se poderia fazer mais, que iria ajudar muito. Até então não tinha caído a ficha do que estava ocorrendo", conta.
Foi então que Daia mobilizou um grupo de amigos brasileiros, que começou de imediato a fazer doações. Ela também pediu ajuda no grupo do WhatsApp do prédio onde mora. "Recebemos muitas doações. Fizeram compras enormes, vizinhos disponibilizam uma panela de 27 litros. A gente consegue cozinhar 4 a 5 quilos por vez", conta ela, que hoje já conta com três grandes panelas.
A comida escolhida por ela foi sopa de lentilha. "Escolhi porque é nutritiva e feita de forma rápida e em escala maior. Nós estávamos colocando na marmita o nome em inglês, mas hoje [ontem] começamos a escrever 'sopa de lentilha' em ucraniano também para facilitar", cita.
O número de marmitas entregues sobe a cada dia. Ontem foram 703. A meta é chegar a 800 ainda nesta semana.
O que fazemos é pouco perto da quantidade de pessoas que estão chegando, mas pelo menos a gente consegue dar a algumas delas algo quentinho.
Daiane Kich
Boom após divulgação
Daia conta à coluna que o número de voluntários explodiu quando ela divulgou a ação no Instagram e começou a receber mensagens. "Foram muitos brasileiros, e a gente combinou de se encontrar. Fomos nos integrando e organizando tudo. Agora o grupo tem cem voluntários, da pessoa que faz o transporte àquela que auxilia nas compras; além das que estão aqui, com as mãos na massa, picando, embalando as marmitas", relata.
Ela explica que decidiu focar em brasileiros pela facilidade de comunicação, já que nem todos falam inglês ou alemão.
Além da comida, uma das voluntárias do grupo está recolhendo dinheiro das doações para comprar itens pedidos na lista de necessidades imediatas. Entre eles, material de higiene pessoal e itens para crianças. "Compramos fraldas, sucos, lenços umedecidos, lanches. Doamos kits infantis também que uma das voluntárias fez", conta.
Ela explica que o grupo não sabe as nacionalidades de quem chega —e por isso não sabe, por exemplo, se ajudou algum brasileiro em fuga. "A gente não consegue falar com o pessoal que está chegando, até porque a maioria não fala inglês, muito menos alemão", explica, citando que percebeu uma rotina triste de quem foge da guerra.
Há pessoas que chegam só com uma sacolinha com roupas e documentos. É uma situação triste de ver, não consigo falar sem me emocionar. A gente fica chocado. Eles chegam com fome. São pessoas que não fazemos ideia de quando fizeram a última refeição, que estão viajando por dias.
Daiane Kich
Ela conta que a chegada de refugiados não para —e com pessoas cada vez mais necessitadas. Na última entrega, Daia afirma que viu muita gente na fila apenas com essas sacolas e juntando o máximo de comida que podia para levar. "Tinha gente que pegava três, quatro marmitas porque não sabe o que vai acontecer com a família", relata.
"Me chocou", conta voluntária
Uma das voluntárias é a pedagoga alagoana Daniella Leite, 35. Ela conta que não conhecia Daiane até ver uma publicação no Instagram explicando como brasileiros em Berlim poderiam ajudar os refugiados.
"Ela não me conhecia, e abriu a casa. A maioria das pessoas não se conhecia, e todos começaram a ajudar com o que poderia. Foi feita uma escala para cada um ajudar", diz.
Segundo ela, a sopa se transformou em um diferencial na estação. "Lá tem muitas doações de sucos, água, pães, frios, mas não tinha comida quente. E aqui está fazendo muito frio, a sopa é meio que um carinho, um afago para quem viajou por tanto tempo", explica.
Ela conta que nos dias em que foi até a estação viu um cenário que considera chocante. "Tem muita gente chegando, não para nunca. São famílias inteiras, muitas crianças, filas enormes. Tem uma pessoa orientando, pessoas com plaquinha oferecendo um quarto, por exemplo", afirma.
O que mais me impactou foi ver tanta gente que tinha uma vida, e que agora não tem nada. Isso me chocou como ser humano. Eu não sei o que vai ser da vida deles, não os acompanho. A estação é um lugar passageiro. A gente faz o que pode, mas nunca vai ser suficiente pela quantidade de pessoas que chega.
Daniella Leite
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