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Carlos Madeiro

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REPORTAGEM

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Sem verba, 70 estações que avaliam chuvas e rios estão há 8 anos guardadas

Cada estação hidrológica custa cerca de R$ 100 mil  - Cemaden
Cada estação hidrológica custa cerca de R$ 100 mil Imagem: Cemaden

Colunista do UOL

02/06/2022 04h00Atualizada em 02/06/2022 15h48

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Compradas para reforçar o monitoramento de chuvas e da variação do volume dos rios pelo país, 70 estações hidrológicas —que custam R$ 100 mil cada uma— estão guardadas há oito anos sem uso, dentro de caixas, na sede do Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais), em São José dos Campos (SP).

Segundo o diretor do órgão, Osvaldo Moraes, os equipamentos ainda estão armazenados porque o Cemaden não tem recursos para fazer a instalação das estações, que poderiam ampliar a área alcançada pelo órgão no país, hoje restrito a 1.038 das 5.568 cidades brasileiras.

Criado em 2011, o Cemaden é um órgão federal ligado ao MCTI (Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações) que examina de forma constante as ameaças naturais em áreas vulneráveis dos municípios e emite alertas de risco de desastres.

Além disso, o centro promove pesquisas de inovações tecnológicas que permitam antecipar os alertas e reduzir o número de vítimas fatais e prejuízos materiais em caso de eventos extremos.

Osvaldo Moraes é diretor do Cemaden desde 2015 - Lucas Lacaz Ruiz/Rossi Comunicação/IACIT - Lucas Lacaz Ruiz/Rossi Comunicação/IACIT
Osvaldo Moraes é diretor do Cemaden desde 2015
Imagem: Lucas Lacaz Ruiz/Rossi Comunicação/IACIT

As estações armazenadas sem uso foram compradas em 2014 como parte do projeto "Desenvolvimento de Sistema de Previsão de Enxurradas, Inundações e Movimentos de Massa em Encostas para Prevenção de Desastres Naturais". Foram adquiridas, ao todo, 301 estações, e mais de 200 delas foram instaladas até 2016. A partir de então, faltou dinheiro.

"Essas estações foram compradas na época das 'vacas gordas'. A gente foi instalando enquanto tinha orçamento, depois paramos e estocamos [as não instaladas]", explica.

O orçamento do Cemaden vinha caindo desde que foi criado. Em 2021, a verba foi a mais baixa: R$ 17,9 milhões. Em 2022, uma recomposição elevou o valor para o mesmo de antes da pandemia: R$ 23,6 milhões.

A instalação das estações deixadas de lado demandaria um aumento de até R$ 3 milhões no orçamento, diz Moraes."Hoje não temos recursos para isso. Se tivesse, as estações seriam instaladas e poderíamos monitorar mais cidades."

Mesmo estocados há oito anos, Moraes diz que os equipamentos não estão ultrapassados. "São simples, não degradam e estão em condições de instalação."

Estações mandam informações em tempo real

As estações são essenciais para o monitoramento de regiões. "Elas monitoram o nível do rio (usando sensor tipo radar) e da precipitação (com pluviômetro de báscula), e incluem uma webcam, de maneira a permitir registros fotográficos em tempo real da situação do rio, principalmente no que diz respeito a enxurrada, erosão de margens e alagamento do núcleo urbano", explica o Cemaden.

As informações são transmitidas pelas redes de telefonia celular.

Com essas estações, o Cemaden criou um alerta de cheias e enxurradas e um de movimentos de massa no Brasil, que permitem realizar previsões meteorológicas de curtíssimo e curto prazo.

De acordo com o centro, as estações:

  • Melhoram o entendimento do processo de transformação chuva/vazão em bacias
  • Fotografa a ocorrência de enxurradas e os montantes pluviométricos deflagradores de eventos
  • Verifica com imagens a ocorrência de solapamento [afundamento] de margens
  • Permite o ajuste de modelos hidrológicos
  • Auxilia na emissão de alertas com dados em tempo real
  • Permite a atualização do modelo hidrológico e melhora a confiabilidade das previsões de extremos hidrológicos
Sala de Situação do Cemaden, em São José dos Campos (SP) - Cemaden/Divulgação - Cemaden/Divulgação
Sala de Situação do Cemaden, em São José dos Campos (SP)
Imagem: Cemaden/Divulgação

Cortes também paralisaram estações

Além das estações, o Cemaden também teve outra limitação imposta pela queda no orçamento.

Como o UOL revelou em fevereiro, nove ETRs (Estações Totais Robotizadas) instaladas em 2016 para acompanhar em tempo real deslizamentos de terra estão paradas desde janeiro de 2018 por falta de verba para a manutenção. São equipamentos

No mapa dos locais onde elas deveriam estar instaladas estão as cidades mais atingidas por problemas gerados pela chuva no país este ano: Petrópolis e Recife.

"Essas estações requerem não só manutenção em campo, mas de uma calibração em laboratório, que tem de ser contratado para esse serviço. Se tivéssemos dinheiro poderíamos fazer, mas como não temos, decidi recolher e deixá-las guardadas", conta Osvaldo Moraes.

mapa cidades equipamentos e monitoramento -  -

Apesar dos cortes até 2021, Osvaldo diz que o dinheiro destinado ao órgão este ano é capaz de manter o funcionamento das estações já instaladas. "Não posso dizer que [a falta de verba] está impossibilitando de fazer a manutenção do que temos", afirma.

O gargalo do orçamento que temos é não conseguir ampliar a rede. A gente monitora 25% dos municípios do país, tem mais 4.000 que não monitoramos por limitação.
Osvaldo Moraes, Cemaden

Ele cita que o MCTI é parceiro do Cemaden, e sempre encaminha em sua proposta o valor pedido de orçamento. "Esse valor nunca foi cortado pelo MCTI, que sempre inclui as nossas solicitações no PLOA [Projeto e Lei Orçamentária Anual]. Mas ele é enviado para o Ministério da Economia e, depois, para aprovação no Congresso. Os cortes ocorrem neste processo e, durante o ano, muitas vezes temos contingenciamento."

Procurado pela coluna, o Ministério da Economia explicou que para fazer o orçamento são consideradas estimativas de receitas da União e com base dos "limites globais da proposta de orçamento anual, tendo em vista as prioridades governamentais".

Depois disso, "os ministérios recebem seus referenciais monetários, e, por sua vez, promovem sua divisão interna". "Cabe ao órgão [MCTI} estabelecer suas prioridades", pontua

Osvaldo diz que não foi informado sobre o contingenciamento de recursos do Cemaden no bloqueio de R$ 8,2 bilhões decretados ontem no orçamento da União.

Entretanto, ele teme que valores extras aprovados para pesquisa sejam contingenciados e afetem o projeto Cigarra, financiado pelo FNDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), que está em andamento e pretende fazer uma "revolução" no sistema de monitoramento nacional.

"A concepção dele é desenvolver um equipamento de baixo custo, a partir de uma prova de conceito validado pelo Cemaden", explica.

"Essa iniciativa possibilitará uma ampliação considerável da rede de monitoramento e, sendo de baixo custo, abre as portas para que cada estrutura de defesa civil monte sua própria rede. Além disso, abre as portas para o desenvolvimento de empresas nacionais", completa.