AL: Moradores deixam casas após rachaduras; mineradora é investigada
Moradores da zona rural de Craíbas, no agreste alagoano, estão abandonando suas casas por conta de rachaduras. Eles alegam que a situação começou em 2021, após o início das explosões para extração de cobre pela Mineração Vale Verde. A empresa nega relação com os problemas e diz que segue todos os padrões técnicos (veja abaixo a resposta).
O caso chamou a atenção da DPU (Defensoria Pública da União), que entrou com ação civil pública no último dia 15 de junho cobrando uma fiscalização da atividade por parte do poder público. A prefeitura de Craíbas já ouviu 209 famílias afetadas - 105 relataram ter problemas com as explosões e 63 informaram ter rachaduras nas casas.
Aqui dá tremor de terra. Tudo que é explosão vira um terremoto: vem uma onda por baixo da terra e treme tudo. Algumas pessoas reformaram, mas não adianta. São mais de 100 casas [atingidas], alguns moradores já deixaram o local.
Jean Santos, 39, morador do sítio Lagoa do Mel e que tem a casa rachada
O que diz a DPU
Segundo a DPU, os laudos atestando a segurança da atividade para os moradores foram produzidos por empresas contratadas pela própria mineradora. Para a Defensoria da União, apesar de se apresentarem independentes, os estudos "são destituídos de fé pública" e não possuem "presunção de veracidade".
A DPU alega que, além das rachaduras, há muita poeira no ar, o que causou ou piorou problemas de saúde e morte de animais após o nascimento.
Na ação, eles pedem que órgãos públicos realizem estudos técnicos para verificar o impacto da mineração nas comunidades próximas.
Além disso, a DPU pede que a Vale Verde seja condenada a estruturar a Defesa Civil do município de Craíbas e da vizinha Arapiraca.
É de se ver que as entidades públicas não prestaram serviço de fiscalização e estudo exaurientes sobre o impacto causado pela mineradora, sendo certo que toda avaliação técnica, com o escopo de aferir eventuais danos à comunidade do entorno e a respectiva relação de causalidade com o exercício da mineração, foi contratada e apresentada pela própria mineradora. Logo, são estudos de natureza particular.
DPU em trecho da ação civil pública
O defensor regional de direitos humanos de Alagoas, Diego Alves, afirma que foi procurado por moradores ainda em fevereiro de 2022. Desde lá, ele aciona empresa e órgãos públicos, sem conseguir avançar em uma solução.
Para ele, existe um "jogo de isenção de responsabilidades".
Verifica-se uma verdadeira busca pela isenção das obrigações constitucionais de proteção ao meio ambiente. Assim, vê-se que todos se eximem do ônus de produzir estudos técnicos e laudos sobre a questão.
DPU
Moradores relatam drama
Nos sítios do entorno da mineradora, moradias são feitas muitas vezes sem maiores estruturas, e isso tem feito com elas sejam danificadas com os tremores, segundo moradores.
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Quero receberJosé Silvestre da Silva, 60, mora no sítio Torrões desde que nasceu e diz que precisou deixar sua casa pelo risco de desabamento após rachões.
A minha casa é a pior de todas em rachaduras, está toda escorada com pau. Saí e vim para uma casinha de taipa aqui na beira da estrada.
Ele conta que sua família possui um terreno de 2,2 mil m², onde há sete pequenas casas. "Todas estão com o mesmo problema. Só tem morando ainda eu, uma cunhada e um outro morador em uma casa menor".
Só não fui embora pra Arapiraca [cidade vizinha] porque não tenho como largar a plantação, não sei fazer outra coisa. Aqui planto milho, feijão, inhame. É minha fonte de renda.
Já Maria Cícera da Silva, 62, decidiu sair da casa onde morava com a mãe, Marta Maria da Conceição, 86, no final do ano passado.
Ela conta que o imóvel estava rachado e estalava com frequência, o que causava receio de que desabasse a qualquer momento.
Hoje, apesar de terem como renda apenas uma aposentadoria de um salário mínimo (R$ 1.320), elas moram de aluguel na periferia de Arapiraca pagando R$ 400 mensais.
Minha mãe tinha muito medo, ela ia tendo dois infartos. Na última vez que a levei à urgência, a médica falou que se demorasse mais cinco minutos eu perdia ela. Ela vivia chorando, passava mais tempo debaixo da mangueira que dentro da casa. Não tinha como ficar.
Outros lados
O secretário de Meio Ambiente de Craíbas, Nivaldo Batista Pinheiro, afirmou que encaminhou à mineradora uma notificação cobrando providências.
"Também acionamos o IMA [Instituto do Meio Ambiente de Alagoas] nesse mesmo sentido, inclusive estive pessoalmente no órgão ambiental para cobrar as providências devidas", diz.
Já o IMA disse estar ciente sobre as rachaduras que têm aparecido em casa, mas alega que não foi notificada em processo judicial sobre o assunto.
As equipes técnicas, tanto dos setores de fiscalização como de licenciamento, monitoram as atividades da Mineradora Vale Verde a partir das condicionantes que foram impostas quando houve o licenciamento. Nesse sentido, não há registro de anormalidades nas atividades e plano de controle relativo às explosões.
Responsável por fiscalizar a atividade no Brasil, a ANM (Agência Nacional de Mineração) informou que a Vale Verde possui autorização para exploração em vigor desde outubro de 2011. A última fiscalização ocorrida foi em outubro de 2022 e a atividade estava regular.
Empresa diz que segue regras
A Mineradora Vale Verde é uma empresa que pertence ao fundo de investimentos britânico Appian Capital Advisory. Ela opera em Craíbas desde 2007, quando implantou o projeto Serrote. Hoje são 1,1 mil trabalhadores no local, diz a empresa.
Em nota, ela afirmou que o "processo de desmonte controlado é rigorosamente monitorado por sismógrafos e acompanhado por uma equipe multidisciplinar, cumprindo os padrões de segurança, em rotina de monitoramento ambiental contínuo."
Ainda de acordo com a empresa, o resultado desse trabalho regular é semanalmente enviado às comunidades "por meio das plataformas de mensagem, a partir de grupos de relacionamento que mantém junto com lideranças locais."
Sobre a ação civil pública, alega que aguarda citação.
A companhia esclarece que mantém as melhores práticas de ESG [Ambiental, Social e Governança], estando rigorosamente dentro dos padrões exigidos na legislação brasileira e em linha com as melhores práticas internacionais e reforça que se mantém aberta para o diálogo franco e transparente com as populações locais.
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