Carlos Madeiro

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Padre é suspeito de roubar hospital dos pobres para comprar imóveis de luxo

O padre Egídio de Carvalho Neto, 56, está sendo investigado por suspeita de desviar recursos que deveriam ser destinados ao hospital Padre Zé, que atende pelo SUS em João Pessoa. O suspeito teria usado o dinheiro para comprar imóveis e bens de luxo e pagar despesas pessoais como viagens.

O pároco era diretor-presidente do hospital e foi afastado do cargo e das funções eclesiais. Ele responde a processo canônico, que pode resultar em sua expulsão da Igreja Católica.

O que aconteceu

Investigadores foram a imóveis de luxo que teriam sido adquiridos com dinheiro desviado do hospital e que deveriam ajudar no atendimento à população pobre que depende do SUS na Paraíba. A força-tarefa coordenada pelo MP-PB (Ministério Público da Paraíba) realizou a operação Indignus, no último dia 5, que cumpriu 11 mandados de busca e apreensão expedidos pela 4ª Vara Criminal da Capital.

Os recursos também foram usados na compra de ao menos um carro de luxo. E também para bancar viagens e adquirir produtos e serviços pessoais de altos valores, segundo a denúncia que chegou ao MP e que deu origem à investigação.

A direção do hospital composta por 12 pessoas foi afastada das funções, no final do mês passado, pelo Arcebispado da Paraíba.

Outras acusações: a nova direção acusa a gestão do padre de ter tomado empréstimos de R$ 13 milhões sem explicação e deixado uma dívida de R$ 3 milhões (leia detalhes mais abaixo).

Operação contra o padre

O MP-PB informou que investiga fraude com "desvios de recursos públicos destinados a fins específicos, por meio da falsificação de documentos e do pagamento de propinas a funcionários vinculados às entidades investigadas".

O padre e outros membros da diretoria são suspeitos de: organização criminosa, lavagem de capitais, peculato e falsificação de documentos públicos e privados.

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[A investigação] aponta para uma absoluta e completa confusão patrimonial entre os bens e valores de propriedade das referidas pessoas jurídicas com um dos investigados [padre Egídio], com uma considerável relação de imóveis atribuídos, aparentemente sem forma lícita de custeio, quase todos de elevado padrão, adornados e reformados com produtos de excelentes marcas de valores agregados altos.
MP-PB

Hospital Padre Zé, em João Pessoa
Hospital Padre Zé, em João Pessoa Imagem: Divulgação

O UOL procurou o MP, mas o promotor e chefe do Gaeco (Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado), Octávio Paulo Neto, informou que o caso corre em segredo de justiça e que não iria conceder entrevista nesse momento.

O advogado do padre Egídio, Sheyner Asfora, foi procurado pela coluna na quarta-feira (11), mas não retornou a mensagem. O texto será atualizado em caso de manifestação.

Dinheiro para comprar cobertura

A denúncia que chegou ao MP-PB, à qual o UOL teve acesso, foi enviada junto a 33 documentos e notas que comprovariam o desvio de verba.

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Um dos imóveis de luxo citados é uma cobertura à beira-mar na praia do Cabo Branco, que seria o local onde o padre mora. Segundo a denúncia, ela foi comprada com "600 mil reais entregues em mãos pela funcionária, com verbas da Ação Social Arquidiocesana e do hospital."

"Foi emitida nota fiscal fria de alimentos e insumos para prestação de contas, para custear essa parte de pagamento", diz a denúncia.

Condomínio de luxo na praia do Cabo Branco, na Paraíba, onde o padre teria comprado cobertura
Condomínio de luxo na praia do Cabo Branco, na Paraíba, onde o padre teria comprado cobertura Imagem: Divulgação

Nova direção cita empréstimos

O hospital Padre Zé é uma referência em serviço de saúde gratuito em João Pessoa e atende cerca de 18 mil pessoas por ano em diversas áreas. A nova direção do hospital, que assumiu no dia 25 de setembro, é presidida pelo padre George Batista.

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O padre Batista afirma que se deparou com dois empréstimos feitos pela gestão anterior em um total de R$ 13 milhões. Elas geram hoje parcelas mensais pagas em torno de R$ 250 mil, que comprometem os serviços ofertados na unidade.

Para onde foi esse dinheiro? A força-tarefa está investigando e, no tempo devido, vai se pronunciar.
Padre George Batista

O novo diretor explicou ainda, em entrevista coletiva na última terça-feira, que o hospital precisa de R$ 1,3 milhão para se manter mensalmente. Como recebe, em média, entre R$ 900 mil e R$ 1 milhão do SUS, vive de doações para completar o valor.

Nossa luta agora é para exorcizar todas as pessoas que colaboraram com esse crime. Vamos criar uma estrutura de fiscalização, descentralização do poder do presidente do hospital, acabar com reeleição e fazer com que a sociedade participe de maneira mais ativa.
Padre George Batista

O Arcebispo Metropolitano da Paraíba, Dom Manoel Delson, disse que chegou a conversar duas vezes com o padre Egídio: a primeira quando houve uma denúncia de celulares furtados do hospital, e a segunda após o início das investigações do MP, pedindo para que ele se afastasse da ASA (Ação Social Arquidiocesana), do hospital e da paróquia.

Ele disse que só soube da suspeita após ela ser divulgada na imprensa.

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Sensação [é] de choque, de vergonha. Me sinto traído porque foi preparado para anunciar o evangelho, testemunhar a fé, para estar a serviço dos mais pobres. Ele passava segurança, de que as coisas vinham funcionando. É uma tristeza muito grande que um sacerdote de Deus tenha se envolvido numa coisa dessa natureza.
Dom Manoel Delson

Processo canônico será enviado ao Papa Francisco, no Vaticano. "Vamos juntar toda documentação e apresentar ao santo padre [papa] o que for concluído. Vamos aguardar, mas se for confirmado [crime], acredito que ele [padre Egídio] será demitido."

Errata:

o conteúdo foi alterado

  • Diferentemente do informado na legenda da foto, a praia do Cabo Branco fica na Paraíba, e não em Fortaleza. E Dom Manoel Delson é arcebispo da Paraíba, e não de João Pessoa. A legenda e o texto foram corrigidos.

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