Carlos Madeiro

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Reportagem

Lei de 1941 e limitação do CRM: por que falsa médica não foi presa em AL

O indiciamento da falsa médica que atendia pacientes em Maceió gerou um questionamento: por que uma pessoa que exercia uma profissão tão importante —e colocava pacientes em risco— não foi presa em flagrante?

Helenedja Oliveira tinha consultório em um dos maiores centros médicos de Maceió e se dizia médica nutróloga. Segundo a polícia, ela atuava ilegalmente há cerca de nove anos, e o local foi fechado no último dia 10. Ela cobrava R$ 450 por consulta e foi denunciada pelo CRM (Conselho Regional de Medicina) de Alagoas.

Segundo a delegada do 2º Distrito Policial de Maceió que comanda a investigação, Luci Mônica, Helenedja foi indiciada até o momento apenas pelo crime de exercício ilegal da medicina, que é de menor potencial ofensivo.

A princípio, é só esse crime específico para o caso e não cabe prisão. Ela foi autuada só por ele, porque foi a denúncia que chegou [de médicos] para a gente naquele momento.
Luci Mônica

A lei que estabelece o crime é de 1941 e prevê que "exercer profissão ou atividade econômica ou anunciar que a exerce, sem preencher as condições a que por lei está subordinado o seu exercício" pode dar uma pena de 15 dias a três meses.

Naquele primeiro momento, havia apenas relatos de médicos sobre a atuação suspeita da profissional. Com o andamento das investigações, fomos juntando provas de que, de fato, ela estava praticando também o estelionato.
Luci Mônica

O crime de estelionato, segundo o artigo 171 do Código Penal Brasileiro, tem pena prevista de um a cinco anos de reclusão e multa. A pena pode ser ampliado de acordo com a quantidade de vítimas.

Se aparecerem vítimas, ela pode ser enquadrada como estelionatária, porque teria tido vantagem econômica em cima de alguém, que pagou uma consulta. O enquadramento dos crimes será dado pelo Ministério Público.
Welton Roberto, professor de direito criminal da Ufal

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Poderia haver mais crimes?

Em regra, o exercício ilegal da profissão vem associado a outros crimes, em especial a falsidade ideológica. No entanto, no caso de Helenedja, ela não fraudou um diploma ou inscrição em conselho, nem usou nome ou número de um profissional registrado.

Mulher que atendia como médica nutróloga em Maceió
Mulher que atendia como médica nutróloga em Maceió Imagem: Divulgação

Por causa disso, o CRM não pode atuar no caso, o que faz com que ele necessariamente vá para para a Justiça estadual.

Segundo o presidente do CRM-AL, Benício Bulhões, outro ponto importante é que a denúncia foi feita apenas por médicos, e até aqui nenhum paciente procurou o órgão.

O CRM não atua contra pessoas que não são médicas. Não temos ingerência sobre essas pessoas, mesmo que ela tenha passado uma medicação e a pessoa tenha tido problema. Mas se formos solicitados a prestar esclarecimento, seja pela polícia, seja pela Justiça, claro que nós iremos.
Benício Bulhões

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Segundo a delegada, apenas uma paciente havia procurado a polícia, até a terça-feira (30),para denunciar a falsa médica.

Sem qualquer formação

A delegada Luci Mônica enviou ofícios para a UFRGS (Universidade federal do Rio Grande do Sul) e para o CFM, que informaram que ela não tem formação e, por óbvio, não tem diploma.

O UOL também apurou que ela não tem registro no CFN (Conselho Federal de Nutrição).

A situação da falsa médica, porém, pode piorar caso o exercício ilegal da medicina tenha causado problemas a pacientes —o que ainda não foi apontado.

Nesse caso, ela pode ter incorrido em dois crimes:

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  • Lesão corporal: se o paciente teve danos físicos devido às ações ou omissões de Helenedja. A pena vai de três meses a oito anos, de acordo com a gravidade do caso.
  • Homicídio: se ficar comprovado que a ação ou omissão concorreu para o morte do paciente. A penas vai de seis a 20 anos, em caso de homicídio simples.
Delegacia que investiga o caso da falsa médica em Maceió
Delegacia que investiga o caso da falsa médica em Maceió Imagem: Arquivo pessoal

Ainda há outras possibilidades de crimes no caso. Uma delas é o charlatanismo, caso ela tenha anunciado "cura por meio secreto ou infalível de um problema de saúde."

Outra hipótese possível é o crime de curandeirismo, que enquadra quem "receita, fornece ou aplica habitualmente qualquer substância a pretexto de cura sem ter habilitação científica."

Ambos os crimes, porém, carecem de mais investigações, já que é necessário que pacientes deem detalhes de como ela atuava e o que prescrevia a eles.

Estou correndo atrás de todas as provas possíveis e peço que os pacientes procurem a polícia. Se tiver alguma denúncia e não quiser ir à delegacia, ligue para o 181. Ou vá diretamente à delegacia do 2º Distrito da capital.
Luci Mônica

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Além das ações criminais, a falsa médica está sujeita a ações civis movidas por pacientes ou por seus familiares em busca de indenização por danos morais ou materiais.

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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