PEC do Senado só pressiona STF, mas não muda regra, dizem ministros
Nem ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) nem especialistas em direito temem os efeitos de eventual aprovação da PEC (Proposta de Emenda Constitucional) que tramita no Senado sobre o funcionamento da Corte. Embora a intenção seja reduzir poderes do tribunal, na prática, a proposta traz regras que hoje já estão em vigor.
Na avaliação de ministros consultados em caráter reservado pela coluna, a PEC serve apenas como instrumento de pressão contra o tribunal. Especialistas em direito constitucional concordam com a avaliação.
No tribunal, a expectativa é que o texto seja aprovado hoje no Senado. Há temor, no entanto, em relação a eventual alteração do texto promovida pela Câmara dos Deputados em uma etapa posterior da tramitação da PEC. Ao mesmo tempo, ministros acreditam que o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), tente sufocar a proposta.
As leis que regem a ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) e as ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) fixam que liminares suspendendo a validade de uma lei ou norma sejam julgadas em plenário.
Porém, nos últimos anos, as decisões individuais dos ministros vêm se tornando mais frequentes. Uma mudança no regimento interno do tribunal realizada no ano passado determinou que essas decisões sejam submetidas ao referendo do plenário imediatamente.
A reforma regimental também fixou prazo de 90 dias para os ministros devolverem processos com pedidos de vista para continuidade do julgamento. Caso não devolvam, o processo será liberado automaticamente
Na avaliação de Eloísa Machado, professora de direito da FGV (Fundação Getúlio Vargas) de São Paulo, "a emenda repete o que já está na lei, que é a necessidade de liminar ser sempre colegiada". Ainda segundo ela, "em relação a vistas, a PEC se sobrepõe a esforços que o próprio tribunal já tem feito em relação a prazos regimentais".
Para a professora, a PEC serve como arma para pressionar o STF. "Não acho que seja matéria constitucional, para se veiculada em uma emenda, não faz sentido. Por isso, eu acredito que seja muito mais um recado do Legislativo para o Supremo do que de fato qualquer tipo de tentativa de aperfeiçoar a prestação jurisdicional", afirma.
Nesse contexto político, é um recado que pode ter a intenção de fragilizar o tribunal, ainda que no mérito as propostas repitam o que já está em andamento seja no Regimento Interno, seja na lei, seja na prática do tribunal.
Eloísa Machado, da FGV-SP
Pós-doutora em democracia e direitos humanos, a pesquisadora Damares Medina lembra que medidas cautelares urgentes são excepcionais.
"No caso do controle de constitucionalidade abstrato (ADI, por exemplo), a concessão de medida cautelar monocrática não é prevista em lei e deveria ser considerada inconstitucional. Mas o próprio órgão que cuida desse exame de constitucionalidade entende que tem o mesmo poder de cautela dos juizes em geral e o exerce monocraticamente, de forma nada excepcional. O STF aprovou uma emenda regimental que procurou contornar esse problema", diz Damares Medina.
Ainda segundo fontes do STF, a demonstração de poder do Senado é também um recado para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O governo tem trabalhado para barrar a PEC, mas já computa a votação de hoje na lista de derrotas.
O eventual placar desfavorável ao governo de hoje soma-se a um episódio ocorrido no Senado no mês passado, quando foi rejeitado o nome de Igor Albuquerque Roque, escolhido por Lula para chefiar a Defensoria Pública da União. O temor de enfrentar problemas no Senado para viabilizar a aprovação do próximo ministro do STF é um dos fatores da demora de Lula para escolher um sucessor para Rosa Weber, que se aposentou no início de outubro.
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