STJ proíbe cropped: afinal, por que tribunais tutelam roupas femininas?
O STJ (Superior Tribunal de Justiça) inovou. Não satisfeito em baixar uma norma na quarta-feira (13) com a vestimenta permitida para advogados, servidores e visitantes circularem nas dependências da Corte, listou minuciosamente os itens do guarda-roupa proibidos para uso no local.
Todos os tribunais de Brasília têm regras de vestimenta. De modo geral, vale a indumentária típica da burocracia brasiliense: homens usam terno, camisa social, gravata e sapato social; mulheres usam vestido ou blusa com calça ou saia e sapato social.
A norma do STJ, porém, só menciona os trajes permitidos no 4º parágrafo. Antes disso, se ocupa em listar tudo o que não pode. A maior parte das peças é identificada com o vestuário feminino.
O carro-chefe é o cropped, a nomenclatura contemporânea da miniblusa. Para quem não foi informado sobre o novo nome dado para a peça, a norma detalhou a proibição à "miniblusa, cropped ou blusas que exponham a barriga". Não foi especificado no texto se há diferença entre os itens.
Também não pode entrar no STJ usando peças consideradas "sumárias" - "shorts e suas variações", bermuda, trajes de banho e de ginástica ou minissaia. São igualmente proibidos legging e montaria - dois modelos de calças femininas coladas ao corpo que, com a ajuda do Google, é possível detectar a tênue diferença entre eles. Camisa sem manga, nem pensar.
Ficou proibido até o uso de fantasias. Se não deixar por escrito, corre o risco de alguém chegar ao STJ fantasiado de princesa da Disney e não haver norma específica para ancorar a vedação do acesso às dependências da Corte.
O texto também impede o uso de chinelo dentro do tribunal e explica direitinho como é o calçado, para não haver confusão: "com tira em formato de Y que passa entre o primeiro e o segundo dedo do pé e aos redor de ambos os lados do pé ou com uma tira ao redor de todos os dedos". O dispositivo trata como exceção quem lesionou o pé ou usa chinelo por recomendação médica. Melhor não esquecer o atestado.
Na parte das permissões, a norma do STJ esclarece que todos devem "trajar-se segundo a formalidade e liturgia jurídica". Depois de explicar como devem se vestir homens e mulheres, o tribunal faz uma ponderação sobre "pessoas que não se identificam com o gênero masculino ou feminino": elas podem escolher se querem usar roupas indicadas para mulheres ou para homens.
Até dos profissionais de saúde o STJ se ocupou: eles podem usar jaleco ou uniforme específico, desde que os trajes "preservem padrões mínimos de decoro".
A tônica da norma, aliás, é o decoro. Ou a ideia que se faz do que é decoro. No dicionário, trata-se de "recato no comportamento; decência". No STJ, a questão passa muito mais por não deixar o corpo feminino à mostra. A pele exposta vira sinônimo de falta de decência.
Sem falar na subjetividade para julgar as roupas das mulheres. Normalmente, cabe ao funcionário da portaria diferenciar uma saia de uma minissaia. Uma blusa de um cropped. Porque não há definições precisas quando se olha o guarda-roupa feminino. A pessoa fica, portanto, submetida ao julgamento de quem está designado para atuar na portaria no horário da visita.
As regras de vestimentas de outros tribunais são mais sumárias que a do STJ. Segundo o Código de Ética dos Servidores do STF (Supremo Tribunal Federal), o funcionário deve "apresentar-se ao trabalho com vestimentas adequadas ao exercício do cargo ou função". A ordem interna é que não se pode circular nas dependências do tribunal usando camiseta, bermuda ou chinelo.
No TSE (Tribunal Superior Eleitoral), não há norma escrita. O código de vestimenta é o usual do mundo jurídico. Existe, porém, instrução aos funcionários das portarias para barrar pessoas usando bermuda, camiseta sem manga e chinelo de dedo.
A exceção de todos os tribunais superiores é a mesma: grupos identitários, como indígenas, estão liberados para usar trajes típicos.
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