37% das doações privadas vieram dos próprios candidatos; veja ranking
Dos R$ 539,2 milhões que os candidatos a prefeito e vereador de todo o país receberam a título de doação de pessoas físicas, R$ 197,1 milhões, ou 36,5% do total, correspondem a valores desembolsados pelos próprios concorrentes. As cifras excluem os fundos de campanha e partidário, recursos públicos que abastecem as campanhas.
O levantamento foi feito pela plataforma 72 Horas com base nos dados das prestações de contas parciais das candidaturas. O número foi apurado na segunda-feira (16) pela manhã e pode ter mudanças ao longo da campanha.
Em 2020, ano das últimas eleições municipais, foram contabilizados R$ 481,4 milhões em autodoações ao fim das campanhas. As doações realizadas por pessoas físicas somaram R$ 1,2 bilhão naquele ano. Portanto, o percentual de recursos próprios de candidatos em comparação ao total de doações privadas foi de 40%.
Segundo Amanda Brito, Estrategista e Relações Institucionais do site 72 Horas, a tendência é que, finalizadas as campanhas deste ano, o percentual supere o de 2020. "Até a ultima sexta-feira (13), menos de 50% das candidaturas cumpriu o calendário eleitoral e não apresentou a prestação parcial de contas. A estimativa para o pleito de 2024 é de R$ 6 bilhões em gastos de campanhas", explica.
A pedido da coluna, o 72 Horas compilou os dez candidatos com maiores cifras de doações feitas com recursos próprios. Há caso de doação em valor superior ao total declaração em bens para a Justiça Eleitoral. Candidato a vereador em Apiúna (SC), Dili (PSD) declarou bens no valor de R$ 299.715,57. Ainda assim, desembolsou R$ 1.500.804 para financiar a própria campanha.
"Se a pessoa doar para si mesma um valor acima do patrimônio, ela precisa justificar isso. Pode ter sido feito um empréstimo, ou a venda de algum bem. Do contrário, o candidato pode ser acusado de abuso de poder econômico, a depender do valor e das configurações da doação", diz Brito.
O problema é a falta de estrutura da Justiça Eleitoral para fiscalizar todas as candidaturas. De modo geral, as contas dos candidatos derrotados nas urnas não são submetidas a escrutínio mais intenso. E, como informou a coluna na semana passada, a equipe do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) responsável por fiscalizar as contas de campanha de todo o país se resume a 12 servidores.
"A grande maioria das prestações de contas não passa por uma auditoria rigorosa. Candidatos derrotados têm as contas examinadas de forma simplificada", afirma o cientista político e advogado Marcelo Issa, diretor da Transparência Partidária.
Issa também explica que a legislação eleitoral não obriga o candidato a declarar todo o patrimônio que consta no Imposto de Renda. Portanto, doações em valor superior ao somatório dos bens declarados à Justiça Eleitoral não necessariamente configuram crime. "É uma falha da regulação. É uma brecha de legislação que não deveria existir", analisa o advogado.
Pela legislação eleitoral, o candidato pode receber doação de si mesmo em até 10% do valor declarado à Receita Federal no ano anterior. Para atestar se a doação foi feita nos moldes legais, seria necessário examinar com lupa todas as candidaturas do país. A estrutura da Justiça Eleitoral não comportaria essa tarefa.
Outra discrepância chama a atenção na lista: os altos valores que os candidatos investem para ocupara um cargo e, se for eleito, não obter compensação salarial. Os salários de vereador e prefeito variam por município. Cristiano Pisoni (PSDB), candidato a prefeito de Gurupi (TO), tem R$ 3,8 milhões em bens declarados. Ele ocupa o quinto lugar em autodoações, com R$ 300 mil, e explica o motivo da quantia elevada:
"Como empresário, já alcancei o sucesso em todos os meus empreendimentos. Meu objetivo ao entrar na política não é aumentar meu patrimônio, mas transformar Gurupi. Investi recursos próprios na minha campanha porque acredito profundamente no potencial da nossa cidade. Resolvi entrar na disputa para trazer uma nova forma de fazer gestão pública, com eficiência e transparência, focando nas reais necessidades dos gurupienses", declarou.
A coluna procurou todos os candidatos citados na lista abaixo. Até ontem à noite, apenas Pisoni havia se manifestado.
As dez maiores doações de candidatos para si mesmos:
1. Dili (PSD) - Candidato a vereador em Apiúna (SC)
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4. Eduardo Botelho (União) - Candidato a prefeito de Cuiabá (MT)
- Bens declarados: R$ 4.098.156,02
- Doou para si mesmo: R$ 327.100
5. Cristiano Pisoni (PSDB) - Candidato a prefeito de Gurupi (TO)
- Bens declarados: R$ 3.835.831,51
- Doou para si mesmo: R$ 300.000
6. Eduardo Girão (Novo) - Candidato a prefeito de Fortaleza (CE)
- Bens declarados: R$ 48.177.784,31
- Doou para si mesmo: R$ 300.000
7. Miguel Vaz (Republicanos) - Candidato a prefeito de Lucas do Rio Verde (MT)
- Bens declarados: R$ 219.715.755,20
- Doou para si mesmo R$ 300.000
8. Décio do Ideal (Avante) - Candidato a prefeito de Formosa (GO)
- Bens declarados: R$ 1.709.310,89
- Doou para si mesmo R$ 300.000
9. Beto (PDT) - Candidato a prefeito de Hulha Negra (RS)
- Bens declarados: R$ 400.000
- Doou para si mesmo: R$ 270.562
10. Dr Yglésio (PRTB) - Candidato a prefeito de São Luís (MA)
- Bens declarados: R$ 4.127.043,21
- Doou para si mesmo: R$ 250.000
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