"Pedofilia no Brasil é calamidade", diz autor de livro sobre o assunto
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O rumoroso caso da menina de 10 anos, do Espírito Santo, que foi estuprada seguidamente e engravidou do tio trouxe de volta ao noticiário nacional a pedofilia, tragédia recorrente no Brasil. Nesse tipo de crime, a criança muitas vezes é vítima de um adulto que parece insuspeito. Pode ser um parente, como no caso recente que emocionou o país, ou algum figurão, desses com autoridade para fazer cumprir a lei que eles mesmos transgridem.
Durante 20 anos, o jornalista Amaury Ribeiro Jr. se dedicou a investigar histórias assim. O resultado é o livro "Poderosos pedófilos" (Matrix), que será lançado nos próximos dias. O título se justifica pelo pedigree dos monstros que ele perfila.
A lista é extensa. Tem o procurador-geral de Justiça, que, com o apoio da própria mãe, violentava uma menina de seis anos de idade; o juiz que montou o bordel para abusar de garotas dentro do fórum; o presidente de um Tribunal de Contas que foi flagrado pela Polícia Federal comprando uma virgem; o juiz da infância e da juventude condenado a 47 anos por estuprar a própria neta. E por aí vai.
"A gente tem esperança de que as coisas melhorem, mas não melhoram nunca, parece um tipo de crime sem fim", lamenta Amaury. "Pedofilia no Brasil é uma calamidade"
O livro começa contando a história do empresário preso em Manaus, há dois anos, depois de ser flagrado em um motel com uma menina de 13 anos, acompanhada da tia. O homem, que nas redes sociais construiu a reputação de adorador da família e conservador, teve a imagem abalada pelas fotos feitas pela polícia no momento do flagrante, em que aparece de cueca no motel.
Aquela era quinta vez que o empresário se encontrava com a garota. Ela denunciou a situação na escola, que encaminhou o assunto ao Conselho Tutelar. A vítima relata no livro a sensação que teve ao ver a policial invadindo o quarto de motel: "Parecia que era a Mulher-Maravilha que estava entrando para me salvar".
Depois de duas décadas acompanhando o assunto, Amaury traça o perfil do pedófilo. "Normalmente odeia movimentos sociais, negros, gays e tem passado de violência contra animais.", diz o jornalista. "Tem discurso moralista e aparenta ter família organizada".
A capital do Amazonas, local da ocorrência mais recente contada no livro, é também o cenário em que se iniciou o trabalho de apuração de Amaury. Há vinte anos, ele ouviu os funcionários terceirizados da Funai citarem locais que eram apelidados de "Disneylândias do sexo". Então, se misturou ao grupo e foi a esses locais, para denunciar a pedofilia e outros crimes cometidos ali.
Já no início da apuração, o jornalista sentiu o peso de entrar em um universo tão sórdido. "Quando fiz a primeira reportagem fiquei muito mal, porque me misturei a eles, e tive que usar a linguagem dos malandros da região, que chamavam as meninas de franguinhas", diz ele.
Não há estado do país a salvo da tragédia da pedofilia, mas a região Norte é a mais afetada.
Além do Amazonas, o livro mostra dramas no Pará, onde a construção da usina de Belo Monte fez crescer a prostituição. Segundo o autor, em determinadas áreas, meninas ribeirinhas acenavam para os homens. "Elas buscam dinheiro ou até mesmo vales-alimentação, que conseguem em troca de sexo com passageiros das embarcações", relata.
O tráfico de garotas da Venezuela para Roraima, a exploração da prostituição infantil pelos traficantes de Rondônia, o desespero das meninas do Amapá que trocam sua virgindade por comida, todas essas tragédias estão nas páginas de "Poderosos pedófilos", em uma prova de que o tal Brasil cordial era um conceito bastante ilusório.
"É um problema tão generalizado em alguns lugares que em Macapá vi uma placa na porta de um hospital que indicava o setor de atendimento de meninas violentadas, como se estivesse indicando uma área de tratamento de uma doença crônica qualquer", recorda o autor.
Para ele, as leis brasileiras leis de proteção à criança e ao adolescente são avançadas, mais que em outros países. "O problema é que quem aplica a lei muitas vezes são os estupradores", diz Amaury. "A solução poderia ser federalizar esses crimes", .
Enquanto isso não acontece, a repugnância que esse tipo de crime provoca não pode fazer com que os brasileiros façamos de conta que não existe. O sofrimento das vítimas, a hipocrisia dos abusadores e tudo o mais desse universo trágico deve ser conhecido para que, além de evitar novos ataques, seja possível encontrar estratégias capazes de ajudar as crianças que foram abusadas.
Houve retrocesso muito grande na área de Direitos Humanos no país. Quem paga a conta desse retrocesso são as crianças", lamenta o autor de "Poderosos pedófilos".
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