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Chico Alves

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Para garantir Auxilio Brasil, Câmara e governo criam o Auxílio Centrão

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL) - Michel Jesus/Câmara dos Deputados
O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL) Imagem: Michel Jesus/Câmara dos Deputados

Colunista do UOL

04/11/2021 07h59

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Mais uma vez, o trator do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), atropelou o regimento interno da Casa para aprovar um projeto de interesse do governo. Depois de torcer e retorcer as regras de votação e pressionar deputados, ele conseguiu na madrugada 312 votos a favor da PEC dos Precatórios. O calote nas dívidas já decididas na Justiça — e que deveriam ser pagas imediatamente — teve como pretexto o custeio até dezembro de 2022 de R$ 400 do Auxílio Brasil, programa do governo Bolsonaro que substituirá o Bolsa Família.

O parcelamento dos precatórios vai liberar R$ 91 bilhões no Orçamento. Pelos cálculos do Tesouro Nacional, a fatia de recursos destinados para o Auxílio Brasil será de R$ 50 bilhões. Do restante, uma parte será usada em gastos de outras áreas do governo, sobrando livres entre R$ 10 bilhões e R$ 20 bilhões.

Foi justamente essa fatia de verba não carimbada que fez com que Lira e seus parceiros do Centrão tivessem tanto interesse na aprovação da PEC. A grana a mais será destinada às chamadas emendas de relator, aquele butim de dinheiro público cuja destinação é decidida não pelo Executivo, mas por deputados escolhidos a dedo por Lira. Um empurrão e tanto no caminho da reeleição.

Por causa dessa fortuna, a aprovação em primeiro turno da PEC dos Precatórios contou com a ajuda extra de um partido de oposição, o PDT, e de outros autoproclamados independentes, como o PSD, Podemos e PSDB. Formaram uma espécie de Centrão expandido.

Os recursos para o Auxílio Brasil poderiam ser garantidos de outra forma. O ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, chegou a dizer que o dinheiro poderia ser viabilizado por Medida Provisória, devido à situação de emergência social que o país atravessa. Até Rodrigo Maia (sem partido-RJ), adversário do governo, disse à coluna que esse seria o caminho viável.

Para o Centrão, no entanto, toda votação tem um preço. A PEC que garante as emendas de relator são o "dá cá" antes de conceder o "toma lá" ao governo. Assim, deputados poderão distribuir obras em seus redutos sem que os recursos sejam rastreados pela sociedade. O Auxílio Centrão é uma farra.

Não importa que para aprová-lo os deputados tenham flexibilizado o teto de gastos — o que não seria ruim, se o critério não fosse casuístico —, parcelado dividas de professores e outros servidores que aguardam há anos o pagamento ou lançado o país no despenhadeiro da desconfiança fiscal.

Falta agora a votação em segundo turno na Câmara e a apreciação do Senado. Depois do que ocorreu na madrugada, a expectativa é que a PEC seja aprovada, selando um novo recorde em termos de montante usado para barganha política — aquele mesmo tipo de negociata que o então candidato Jair Bolsonaro em 2018 jurou erradicar.

Enquanto tudo isso acontece, o general Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança institucional, se finge de morto. Autor da paródia do samba segundo a qual "se gritar pega Centrão, não fica um", comparando os políticos do bloco a ladrões, o oficial cantor agora não dá um pio.

Seria no mínimo curioso saber qual é agora seu novo repertório.