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Chico Alves

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Além de Lula, Bonner também deveria dar explicações sobre a Lava Jato

Jornal Nacional noticia a Lava Jato - Reprodução de Vídeo
Jornal Nacional noticia a Lava Jato Imagem: Reprodução de Vídeo

Colunista do UOL

25/08/2022 13h48

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Informações vindas do QG da campanha de Luiz Inácio Lula da Silva dão conta de que na preparação para a entrevista que vai conceder hoje ao Jornal Nacional o petista tem recebido especial treinamento para responder a questões sobre a operação Lava Jato. Não se sabe se Wiliam Bonner e Renata Vasconcellos vão tocar nessa ferida, já que não se falou no tema "rachadinha", tão sensível a Jair Bolsonaro, quando o principal oponente de Lula abriu a série de sabatinas.

Mas seguro morreu de velho. A equipe do presidenciável do PT preferiu se prevenir.

Longe do sensacionalismo lavajatista, seria mesmo interessante que Lula desse explicações sobre os desvios milionários ocorridos na Petrobras durante seus governos. Nada a ver com as fabulações sobre o sítio de Atibaia ou o triplex do Guarujá. Mas o ex-presidente deve reconhecer que indicações feitas para várias diretorias, seja por influência de aliados ou não, resultaram em enorme prejuízo para a empresa e para o Brasil.

Denúncias de desvios milionários na Petrobras são pauta antiga, remontam no mínimo aos tempos em que Fernando Henrique Cardoso era presidente. Como poderia fazer FHC, Lula diz que não sabia de nada - e é possível acreditar, levando-se em conta o gigantismo da companhia. Mas esse fato, por si só, não seria desabonador para quem quer voltar à Presidência?

Se o assunto for abordado, não é só Lula que deveria dar satisfações aos brasileiros. William Bonner, editor-chefe e apresentador do Jornal Nacional, também teria muito a explicar ao público sobre o apoio incondicional e acrítico que o principal telejornal do país deu aos desmandos de Sergio Moro e da força-tarefa da Lava Jato.

Não estava sozinho. Todos sabem que por seis anos a maior parte da imprensa criou um jogral que repetia várias vezes por dia tudo o que Moro e Deltan Dallagnol falavam ou deixavam "vazar". Foi o jornalismo brasileiro o principal responsável pela elevação do ex-juiz ao pedestal de herói e por todos os dissabores, injustiças e prejuízos decorrentes disso.

O Jornal Nacional, porém, teve o papel de maior destaque. Como hoje os telespectadores aguardam a hora de Juma se encontrar com o Velho do Rio, na novela Pantanal, aguardavam há alguns anos quais novas denúncias contra Lula e o PT seriam lidas por Bonner na hora do jantar.

Não bastassem os shows pirotécnicos de Moro e da força-tarefa, os áudios e documentos "vazados" estrategicamente e as imagens sensacionalistas de autoridades sendo encaminhadas para depoimentos em condução coercitiva, a concepção visual completava o espetáculo.

Está marcada na história da TV brasileira a animação dos dutos gigantescos de petróleo de onde jorrava o dinheiro sujo desviado da Petrobras. À frente desse grafismo, Bonner e Renata Vasconcellos davam as últimas da Lava Jato.

O tempo passou, o site The Intercept Brasil publicou a série Vaza Jato, com diálogos de aplicativos de mensagem entre Moro e os blue caps da força-tarefa - conseguidos de forma ilegal -, e o país teve a certeza de que o jogo contra Lula e o PT foi de cartas marcadas.

Moro largou a toga, entrou e saiu do governo de Jair Bolsonaro - que ajudou a eleger, mandando o presidenciável petista para a prisão - e, em uma reviravolta espetacular, foi considerado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) como parcial e sem competência para tratar das denúncias da Petrobras. Deltan sofreu várias derrotas no Supremo e corre o risco de ter que devolver verbas que teria distribuído sem controle aos integrantes do MPF.

O espaço dedicado à derrocada de Moro no telejornal líder de audiência nem de longe se equiparou à construção da imagem heroica do ex-juiz e da disseminação do antipetismo, feita durante anos.

É preciso repetir que a maior parte da imprensa brasileira agiu da mesma forma. Mas outros veículos deram mais destaque à desconstrução da Lava Jato, alguns até como parceiros do Intercept na série Vaza Jato. Nesse aspecto, o JN ficou devendo - e muito.

O entrevistado da noite é Lula. Mas é bom destacar que, se o assunto Lava Jato for abordado, não só o petista, mas também Bonner teria muito a explicar.