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CPI, debandadas e greves refletem derrocada bolsonarista

Live de Bolsonaro é derrubada pelo Facebook por mentiras quanto à Covid - Reprodução
Live de Bolsonaro é derrubada pelo Facebook por mentiras quanto à Covid Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

26/10/2021 11h14

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* Cesar Calejon

No xadrez da política nacional, o bolsonarismo, faz algum tempo, está em xeque. Na prática das disputas políticas, assim como no jogo de tabuleiro, isso significa que a figura central, o rei, está ameaçada e, via de regra, deverá começar a fazer concessões extremas e a sacrificar as peças inferiores para não perder definitivamente a partida. Com raras exceções, trata-se do começo do fim.

Entre os enxadristas, esse processo é intitulado como "espernear" em português, porque traduz o ato de agir desesperadamente e sem eficácia no sentido de tentar preservar o material — capital político, no caso do bolsonarismo — que ainda lhe resta.

A ameaça de greve dos caminhoneiros (e o auxílio proposto por Bolsonaro, que o governo simplesmente não sabe como efetivar e que foi tido como piada por líderes da categoria), a debandada do Ministério da Economia ocorrida na última semana e a votação final da CPI, que promete levar o seu relatório ao Ministério Público Federal, à Polícia Federal e até aos tribunais internacionais, são reflexos muito claros da derrocada do bolsonarismo.

Ainda na seara do xadrez, esse começo do fim da partida é geralmente iniciado com um movimento que é conhecido como "blunder", termo que pode ser traduzido como "erro crasso".

Apesar dos muitos impropérios e erros convencionais que Jair Bolsonaro assumiu durante toda a sua vida parlamentar, nenhum se compara ao equívoco grosseiro que o presidente da República cometeu a partir de março de 2020, precisamente.

A covid-19 ofereceu a medida perfeita para que Bolsonaro se consolidasse como líder capaz de "unificar" a nação, mas ele é uma figura tão unidimensional e limítrofe, que se mostrou incapaz de dançar conforme a música. "A minha especialidade é matar", conforme explicado eloquentemente pelas próprias palavras de Jair Bolsonaro alguns anos atrás.

Quando surgiu a pandemia, Bolsonaro tinha a faca e o queijo nas mãos para fazer a jogada perfeita. Ele poderia ter vindo a público e dito: "caros brasileiros, sei que temos divergências, mas existe um patógeno letal, que constitui a maior pandemia do século, e não podemos nos dar ao luxo de nos atermos às dissonâncias nesse momento. Precisamos nos unir pela solidariedade, pela ciência, para combater um inimigo externo e salvar vidas".

Todo líder populista reza para que exista um inimigo externo, capaz de unir a nação em torno dele. Bolsonaro teve o "melhor" inimigo que a história poderia providenciar, mas foi tão estúpido que conseguiu se aliar ao vírus, contra a população brasileira. Caso tivesse sido minimamente hábil, ele poderia ter garantido não somente a reeleição em 2022, mas as balizas de um robusto projeto de poder.

Ao invés disso, cometeu o erro mais crasso que alguém poderia imaginar e iniciou o seu processo de derrocada. Após esse grave equívoco, resumidamente, o lavajatismo desembarcou do governo, uma CPI foi criada, o Judiciário moveu diversas ações contra o bolsonarismo, o presidente foi denunciado múltiplas vezes em tribunais internacionais e pelo menos uma dúzia de ministros renunciaram ou foram demitidos dos seus cargos.

A gestão bolsonarista torna-se um governo mais frágil e incapaz de defender as suas posições a cada dia que passa. Bolsonaro é, hoje, um autêntico pato manco, conforme apontado por essa coluna há alguns meses.

Com essa dinâmica estabelecida, futuras demissões ministeriais acontecerão, o "centrão" deverá cobrar um preço ainda mais alto para manter o atual governo no poder e todos os tipos de greves e convulsões sociais tentarão capitalizar sobre a fragilidade do bolsonarismo. Independentemente de o quanto Bolsonaro e os seus principais aliados esperneiem, o xeque-mate se aproxima, inevitavelmente.

* Cesar Calejon é jornalista, com especialização em Relações Internacionais pela FGV e mestrando em Mudança Social e Participação Política pela USP (EACH). É escritor, autor dos livros A Ascensão do Bolsonarismo no Brasil do Século XXI (Kotter) e Tempestade Perfeita: o bolsonarismo e a sindemia covid-19 no Brasil (Contracorrente).