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Diogo Schelp

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Ou Pazuello mentiu na CPI, ou Bolsonaro não governa, só finge na internet

19.mai.2021 - Ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello durante o depoimento à CPI da Covid, no Senado - Jefferson Rudy/Agência Senado
19.mai.2021 - Ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello durante o depoimento à CPI da Covid, no Senado Imagem: Jefferson Rudy/Agência Senado

Colunista do UOL

19/05/2021 14h08

Em seu depoimento na CPI da Covid no Senado, nesta quarta-feira (19), o general Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde, contribuiu para duas linhas de defesa do governo quanto às investigações sobre as ações e omissões que contribuíram para o agravamento da pandemia. A primeira é desqualificar o relator da CPI, o senador Renan Calheiros (MDB-AL). A segunda é isentar o presidente Jair Bolsonaro de responsabilidades.

Apesar de ter obtido habeas corpus do STF dando-lhe o direito de permanecer calado dentro de certas condições na CPI da Covid do Senado, Pazuello preferiu dar respostas prolixas em suas respostas à primeira parte do depoimento, conduzida por Renan Calheiros.

Em depoimentos anteriores na CPI, Calheiros sempre demonstrou irritação quando as testemunhas evitaram dar respostas objetivas às suas perguntas (frequentemente mal formuladas, é verdade).

Pazuello tentou usar suas respostas alongadas para tirar Calheiros do sério, como ocorreu, por exemplo, no depoimento do ex-secretário de Comunicação Fabio Wajngarten, que recebeu até ameaça de prisão do relator.

O episódio foi explorado pelos senadores governistas para desgastar a imagem de Calheiros, cuja atuação na CPI vem sendo questionada por ele ser pai do governador do Alagoas, Renan Filho, que poderia vir a ser investigado pela comissão.

Se Calheiros perdesse as estribeiras com Pazuello, que está respaldado pelo habeas corpus que o protegeu inclusive de ameaças de prisão, isso apenas contribuiria para a estratégia governista na CPI.

Em pelo menos dois momentos, ao responder a Renan, Pazuello tentou esticar a corda. Ao ser perguntado porque não se engajou nas negociações com a Pfizer para compra de vacina, o general respondeu que um ministro não pode negociar diretamente com empresas e disparou, insolente: "O senhor deveria saber disso."

Também criticou o relator, afirmando que ele estava "conduzindo a conversa", tentando induzi-lo a respostas específicas.

O presidente da CPI, Omar Aziz, repreendeu o ex-ministro, que, no entanto, não abandonou a postura desafiadora no decorrer do depoimento.

Em outro trecho com perguntas insistentes de Renan Calheiros, Pazuello minimizou as declarações do presidente Jair Bolsonaro de que o governo federal não compraria a CoronaVac do Instituto Butantan, órgão do governo paulista.

Pazuello negou que tivesse recebido ordens do presidente proibindo as negociações com o Instituto Butantan para a compra do imunizante desenvolvido na China, apesar de o presidente ter dito isso publicamente.

"Era apenas uma posição de internet", disse Pazuello. "Uma postagem na internet não é uma ordem." Em outubro do ano passado, depois que o Ministério da Saúde anunciou as tratativas com o Butanta, Bolsonaro escreveu no Facebook, em resposta a um seguidor: "Não será comprada". Depois, em outra postagem, reafirmou: "A minha decisão é a de não adquirir a referida vacina".

Na mesma semana, Bolsonaro apareceu em vídeo com Pazuello, que então se recuperava de covid-19, em que o general aparece dizendo: "É simples assim: um manda, o outro obedece."

Sobre essa fala, Pazuello deu a seguinte explicação na CPI: "É um jargão simplório para discussão de internet."

"O presidente nunca falou para que eu não comprasse um 'ai'", disse Pazuello no depoimento, completando que Bolsonaro apenas "falou publicamente", mas nunca deu uma ordem em "nível ministerial" para não comprar a Coronavac.

O tom geral do depoimento de Pazuello, nesse e em outros momentos, foi o de afastar o nome do presidente de qualquer decisão que tenha sido tomada pelo governo em relação à pandemia. A frase que resume essa linha de argumentação é: "O presidente nunca me deu ordens diretas para nada."

Se Pazuello diz na CPI a verdade, e não mais do que a verdade, então a única conclusão possível é que Bolsonaro não governa. E o que ele diz na internet, em entrevistas ou em conversas com apoiadores não passa de espuma ao vento. Não têm validade alguma além de servir ao propósito de empolgar os seguidores virtuais.