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Diogo Schelp

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Com evasivas e contradições, Wajngarten tenta isentar Bolsonaro na CPI

Fabio Wajngarten - Agência Senado
Fabio Wajngarten Imagem: Agência Senado

Colunista do UOL

12/05/2021 15h44

O depoimento de Fábio Wajngarten, ex-secretário de Comunicação da Presidência da República, à CPI da Covid no Senado, nesta quarta-feira (12), foi marcado por evasivas e contradições com o propósito claro de isentar o presidente Jair Bolsonaro de qualquer responsabilidade pelos atos sob investigação, como o atraso na compra de vacinas e a recusa em informar corretamente a população sobre as medidas necessárias para conter a disseminação do novo coronavírus.

Para isso, Wajngarten na prática desmentiu ou evitou confirmar o conteúdo da entrevista que ele próprio concedeu à revista Veja em abril, em que acusou o Ministério da Saúde, na gestão de Eduardo Pazuello, de "incompetência" na negociação de vacinas contra covid-19. As contradições nesse ponto levaram o relator da CPI, o senador Renan Calheiros (MDB-AL), a ameaçar o ex-secretário de prisão por estar mentido à comissão. Áudio da entrevista confirma que Wajngarten qualificou a atuação do Ministéria da Saúde de incompetente.

Com grande esforço e cautela, abusando de expressões ensaiadas como "não tenho conhecimento" e recusando-se a responder objetivamente a perguntas dos senadores para as quais bastava um simples "sim" ou "não", Wajngarten tentou passar três mensagens: primeiro, de que ele sempre esteve preocupado com a vida dos brasileiros e por isso tentou construir "pontes" para a compra da melhor vacina no menor tempo possível; segundo, que houve retidão na estratégia de comunicação do governo nos temas da pandemia; e, terceiro, que não se pode atribuir ao presidente a culpa por nada que diga respeito à compra de vacinas e à comunicação do governo.

As três mensagens estão sustentadas sobre argumentos contraditórios, meias verdades ou mentiras completas.

No que se refere à primeira mensagem, ele negou que tenha se engajado em negociação com a Pfizer para a compra de vacinas, algo incompatível com as funções do cargo que ocupava, apesar de muitos dos fatos narrados por ele à CPI e à Veja, como a realização de reuniões com representantes da farmacêutica, provarem justamente o contrário.

Além disso, a afirmação de Wajngarten de que sentiu necessidade de entrar "de cabeça" na facilitação para a compra da vacina contradiz outra de suas alegações, a de que não havia condições jurídicas para fechar o contrato e que, no momento certo, os entraves foram colocados de lado (o que ocorreu apenas seis meses após a Pfizer enviar carta com proposta ao governo).

Wajngarten também reiterou que Bolsonaro estava decidido a comprar todas as vacinas que tivessem aprovação para uso, apesar de, como apontou o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) durante o depoimento, o próprio governo ter trabalhado contra uma iniciativa do Senado para resolver os entraves jurídicos ao contrato com Pfizer.

Quanto à segunda mensagem, de que houve uma estratégia impecável do governo na comunicação, tem-se a impressão que Wajngarten sofre de perda conveniente de memória. As redes sociais da Secom (Secretaria de Comunicação da Presidência da República) estão repletas de posts provando o contrário.

Há desde postagens enaltecendo a política do Ministério da Saúde para prescrição de hidroxicloroquina e do chamado "tratamento precoce", que não possuem eficácia contra covid-19, até contribuições ambíguas a respeito de uma suposta tentativa de tirar a liberdade dos cidadãos por meio da vacinação obrigatória. Wajngarten disse que não tomou e não tomaria cloroquina contra covid-19.

As campanhas da Secom também serviram, desde o princípio da pandemia, para reforçar o discurso do presidente de se opor a medidas de isolamento social para conter a disseminação do vírus.

No que se refere à terceira e última mensagem de Wajngarten, a de que o presidente não é responsável por nada, nunca mandou fazer nada e nunca foi mal aconselhado, aponta para três conclusões distintas: ou o país está acéfalo, sem governo, ou o ex-secretário está confirmando que o presidente foi omisso ou está mentindo do começo ao fim.

Os senadores lhe perguntaram, por exemplo, se ele informou o presidente Bolsonaro dos contatos que teve com representantes da Pfizer que haviam oferecido vacina ao país, no ano passado, e Wajngarten respondeu que sim. O presidente deu alguma orientação sobre o que o secretário devia fazer a respeito? Nada, nenhuma.

A reportagem da Veja com a entrevista de Wajngarten afirma que o presidente deu autorização para que ele negociasse a vacina. Além de negar essa informação, o ex-secretário esquivou-se de confirmar que guardou documentos que comprovam o que afirmou à revista.

Quando questionado sobre quem estava dando informações incorretas ao presidente sobre a pandemia, conforme ele revelou à Veja, Wajngarten esquivou-se de responder.

Sobre a participação de Carlos Bolsonaro, filho do presidente e vereador do Rio de Janeiro, na comunicação do governo federal, Wajngarten primeiro disse que não tinha contato com Carlos, depois que isso ocorreu com "pouca frequência" e por fim que o número desses episódios cabiam "em uma mão".

Contraditório, evasivo e por vezes ostensivamente mentiroso, o depoimento de Wajngarten traz poucos esclarecimentos e reforça ainda mais a necessidade da CPI da Covid.