Fernanda Magnotta

Fernanda Magnotta

Siga nas redes
Só para assinantesAssine UOL
Opinião

6G e soberania digital: a estratégia tecnológica da China em um mundo novo

A trajetória da China no cenário internacional é complexa e multifacetada, oscilando entre ser vista como um "responsible stakeholder" e uma "desafiadora do status quo". Sob a liderança de Xi Jinping, a China tem demonstrado ambição crescente e adotado uma política externa mais assertiva, tentando equilibrar esses papéis aparentemente contraditórios. Esse movimento é crucial ao discutirmos tecnologia e segurança cibernética, áreas em que o país tem desempenhado um papel cada vez mais significativo.

Apenas nesses primeiros meses de 2024, as notícias dão conta de que a maior operadora de telefonia do mundo, a China Mobile, lançou o primeiro satélite de testes para o 6G. Ao mesmo tempo, o país é acusado de apoiar-se em recursos tecnológicos para aprimorar seu 'aparelho de censura', segundo relatório publicado nos Estados Unidos.

O fato é que, no século XXI, a China tem se concentrado em transformar seu modelo de desenvolvimento, transitando de uma economia baseada na exportação de produtos de baixo valor agregado para uma centrada na inovação. Iniciativas como o Belt and Road Initiative (BRI) e o Made in China 2025 são testemunhos do interesse chinês em fortalecer sua presença global e promover o engajamento, especialmente com o Sul Global. Esta orientação não se limita mais a objetivos comerciais e econômicos, mas está intrinsecamente ligada às estratégias nacionais de desenvolvimento e defesa do país.

No que tange à internet e à cibersegurança, a China já ostenta o maior número de usuários de internet do mundo e lidera em patentes e padrões para a tecnologia 5G. Xi Jinping defende que as regras da internet devem ser baseadas na soberania e autonomia estatal, princípios que se refletem nas políticas cibernéticas internas da China. Instituições como a "Comissão Central de Assuntos do Ciberespaço" e a "Administração do Ciberespaço da China", ambas sob a presidência de Xi, regulam a internet e outros meios de comunicação, promovendo leis como a "Lei de Cibersegurança" de 2016. Essa legislação, que permite ao Estado acessar e restringir informações on-line, gera críticas de países ocidentais por práticas de protecionismo e censura permanentemente.

Do ponto de vista internacional, a China busca liderar debates sobre a governança global da internet, promovendo a ideia de "soberania cibernética". Em 2017, Xi Jinping anunciou planos para tornar a China uma "superpotência cibernética", refletindo essas ambições em diversos fóruns, incluindo a ONU. O desenvolvimento cibernético chinês abrange áreas como infraestrutura digital, telecomunicações, 5G, big data, computação em nuvem, inteligência artificial, "Internet das Coisas", cidades inteligentes, e muito mais.

A influência da China na governança global, particularmente em tecnologias aplicadas como o 5G, permite-lhe estabelecer padrões através de organizações internacionais, conferindo vantagens competitivas às suas empresas no exterior. No Sul Global, empresas chinesas como Huawei e CloudWalk têm fornecido tecnologias de vigilância, enquanto a iniciativa "Rota da Seda Digital" promove workshops sobre políticas de tecnologia da informação. O Brasil, por exemplo, tem sido um parceiro relevante no comércio internacional chinês, hospedando empresas especializadas em vigilância e segurança, e experimentando-as com no desenho de cidades inteligentes.

Embora a China possa estar buscando reformas estruturais e liderança com foco em revolução tecnológica, ainda não está claro se isso implicará na demolição da ordem internacional existente ou em mudanças de paradigmas nessa temática em particular. A intenção de fornecer bens públicos globais, à semelhança dos Estados Unidos, por exemplo, permanece incerta. Contudo, é evidente que a China deseja espaço para acomodar seus interesses e evitar que suas decisões internas sejam contestadas, com a soberania e a busca por autonomia. Nesse momento, buscar consolidar suas posições, entre outras coisas, tentando moldar a abordagem, na governança global, também no que tange à tecnologia, inovação e o universo cibernético.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

Deixe seu comentário

Só para assinantes