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Jamil Chade

Covid-19 abala salários, e OIT pede manutenção da ajuda emergencial

Fila de trabalhadores em busca de emprego - EBC
Fila de trabalhadores em busca de emprego Imagem: EBC

Colunista do UOL

02/12/2020 09h09

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A Organização Internacional do Trabalho (OIT) alerta que os salários caíram ou pelo menos deixaram de cresceram nos primeiros seis meses de 2020, como resultado da pandemia da covid-19. A entidade alerta que um fim prematuro de pagamentos emergenciais para trabalhadores poderá gerar uma profunda crise social.

De acordo com a OIT, dois terços dos países para os quais havia dados oficiais disponíveis registraram essa realidade de queda de renda e a tendência é de que a crise pode ser ampliada. Os salários das mulheres e dos trabalhadores de baixa remuneração foram desproporcionalmente afetados pela crise.

No caso do Brasil, a entidade indica que houve um aumento dos salários médios em 5,2 pontos percentuais neste período. Mas isso não significa necessariamente uma boa notícia. De acordo com os técnicos da entidade, tal mudança é artificial e ocorreu por conta da demissão substancial de trabalhadores com salários mais baixos. Hoje, o desemprego atingiu 14%.

Assim, a média acabou sendo afetada por uma distorção, uma vez que essa renda mais baixa não foi mais incluída nos dados para os assalariados.

De acordo com a OIT e diante da distorção, os salários nominais no Brasil passaram, em média, de R$ 2288,00 no primeiro trimestre para R$ 2398,00 no segundo trimestre. Rosalia Vazquez-Alvarez, autora do informe, confirma que os dados do Brasil não são representativos, já que o país vive um aumento significativo do desemprego.

Para a entidade, tanto no Brasil como no restante da América Latina, a questão central hoje é a manutenção dos programas de ajuda emergencial. Nesta semana, o presidente Jair Bolsonaro indicou que tal operação não poderia ser mantida por muito mais tempo.

Para o diretor-geral da OIT, Guy Ryder, a grande questão que hoje governos devem considerar é a duração das medidas de resgate de salários e trabalhadores.

Segundo ele, o desembarque de uma vacina contra a covid-19 é uma boa notícia para a saúde. "Mas a vacina não resolve a questão do desemprego e da economia", alertou. Ele insistiu que governos precisam "fazer o que for necessário" para permitir que haja um apoio, principalmente às classes trabalhadoras.

Na entidade, as previsões indicam ainda que, no segundo semestre de 2020 e em 2021, haverá uma pressão sobre os salários. Ryder, portanto, alertou para os riscos de um fim precipitado dos mecanismos de apoio e subsídios para o pagamento de salários.

"Teremos ainda muita turbulência e incerteza", disse. Para ele, a recuperação da economia e da renda de milhões de pessoas será "dura e longa".

Covid deixará um mundo mais desigual

Nos países onde foram tomadas fortes medidas para preservar o emprego, os efeitos da crise foram sentidos principalmente como quedas nos salários e não como perdas maciças de empregos.

Mas nem todos viram os efeitos da crise da mesma forma. Estimativas baseadas em uma amostra de 28 países europeus constatam que, sem os subsídios salariais, as mulheres teriam perdido 8,1% de seus salários no segundo trimestre de 2020, em comparação com 5,4% para os homens.

"A crise também afetou os trabalhadores com salários mais baixos. Aqueles que exercem profissões menos qualificadas perderam mais horas de trabalho do que os empregos gerenciais e profissionais com salários mais altos", diz a OIT.

Usando dados do grupo de 28 países europeus, o relatório mostra que, sem subsídios temporários, os 50% dos trabalhadores com salários mais baixos teriam perdido cerca de 17,3% de seus salários.

Para Guy Ryder, Diretor-Geral da OIT, um dos impactos dessa realidade deve ser o crescimento da desigualdade, ameaçando deixar como legado da crise uma maior pobreza e instabilidade social e econômica que seriam "devastadores".

"Sem subsídios, o montante médio dos salários perdidos em todos os grupos teria sido de 6,5%. Entretanto, os subsídios salariais compensaram 40% deste montante", diz a OIT.

"Nossa estratégia de recuperação deve ser centrada no ser humano. Precisamos de políticas salariais adequadas que levem em conta a sustentabilidade dos empregos e das empresas, e também enfrentem as desigualdades e a necessidade de sustentar a demanda". Se quisermos construir um futuro melhor, devemos também lidar com algumas perguntas desconfortáveis sobre por que empregos com alto valor social, como cuidadores e professores, estão muitas vezes ligados a baixos salários".