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França diz que Amazônia não é só dos brasileiros e não assina com Mercosul
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Resumo da notícia
- Operação contra Ricardo Salles também aprofunda desconfiança europeia com relação a uma negociação com o governo Bolsonaro
- Em diferentes capitais europeias, protestos foram realizados nesta quinta-feira contra o acordo com o Mercosul
O ministro do Comércio Exterior da França, Franck Riester, garante aos senadores de seu país que o governo de Emmanuel Macron não assinará o acordo entre o Mercosul e UE, que aguarda para ser ratificado. Mas também faz um alerta: a Amazônia não é apenas dos brasileiros.
Numa audiência diante do Senado francês na quarta-feira, Riester denunciou explicitamente o governo de Jair Bolsonaro como o motivo de sua decisão de vetar o tratado comercial. Para ele, Brasília não mostra ainda o engajamento necessário e "faz o contrário do que precisa fazer" em temas ambientais. "É inimaginável assinar o acordo", afirmou.
Hoje, diante dos demais ministros do bloco europeu, ele voltou a insistir que, da forma que está, o acordo com o Brasil não será ratificado.
Por 20 anos, Mercosul e UE negociaram um acordo de livre comércio que acabou sendo fechado em 2019. Mas países como a França alertaram que não ratificariam o projeto até ter garantias de que o governo brasileiro mudaria seu comportamento ambiental. Para que o pacto entre em vigor, todos os 27 países da UE precisam aderir ao projeto.
"Queremos que o cumprimento do Acordo de Paris seja uma cláusula essencial nos futuros acordos de livre comércio", disse o ministro francês.
"A consequência para o acordo com o Mercosul é clara: "Não podemos assinar o acordo com o Mercosul como ele está. A razão para isso é o não cumprimento dos acordos de Paris por parte de alguns desses países", explicou.
"Com relação ao combate ao desmatamento, o governo brasileiro reduziu os recursos que estava colocando. Está preparando uma lei agrária que corre o risco de acelerar o desmatamento", disse Franck Riester.
"A floresta amazônica não pertence apenas aos brasileiros. Mas à humanidade", disse. "Se eles não se moverem, não terão acesso mais fácil ao mercado europeu do que hoje", completou.
O posicionamento francês, ao lado de outros países, é visto pelo setor exportador brasileiro como "cínico", já que usaria a questão climática para tentar justificar um veto à abertura de suas fronteiras para os produtos do Mercosul. Os europeus rejeitam a acusação.
Segundo o ministro, Paris quer compromissos concretos por parte do Brasil sobre como fará para reduzir o desmatamento. "Isso vai levar tempo, pois o sr. Bolsonaro não está nesse estado de espírito", alertou.
UE não chega a acordo sobre mecanismo para exigir redução de desmatamento no Brasil
Após a reunião dos 27 países da UE nesta quinta-feira, Augusto Santos Silva, ministro português, admitiu que não havia um acordo ainda dentro do bloco sobre quais devem ser os mecanismos propostos pela UE para garantir que haja um compromisso da parte do Brasil para reduzir o desmatamento.
A ideia da Comissão Europeia, braço executivo do bloco, é de se criar um anexo ao tratado, garantindo que as exigências ambientais sejam cumpridas pelos países que assinarem o acordo. Mas uma parcela dos europeus insiste que tal mecanismo precisa apresentar formas concretas de controlar o que estiver ocorrendo no Brasil e punir ou suspender facilidades comerciais para as exportações nacionais.
Para a Comissão, apesar da falta de um entendimento sobre como deve ser esse mecanismo, há um acordo de manter o compromisso do bloco com a iniciativa, inclusive por seu papel geopolítico.
Na avaliação de Bruxelas, deve haver de fato um meio para fortalecer os compromissos ambientais do Brasil. Para a Comissão, porém, será engajando o governo brasileiro - e não o excluindo - que os europeus conseguirão agir para frear o desmatamento no país.
Salles abala no palco internacional a "nova" agenda ambiental de Bolsonaro
No Parlamento Europeu e em diferentes capitais do Velho Continente, a notícia de uma operação policial contra Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente, também abalou as negociações para uma ratificação do tratado comercial entre Mercosul e UE.
O motivo: a ação mina o pouco que existia de credibilidade na negociação e reforça a tese de opositores ao acordo de que não há como negociar com os representantes do presidente Jair Bolsonaro.
As suspeitas em relação ao chefe da pasta ocorrem na mesma semana em que, pela Europa, soam os alertas diante da aprovação na Câmara de Deputados de um texto base sobre o licenciamento ambiental. Para ativistas e especialistas, a lei representa um desmonte de qualquer tipo de controle.
"Se esta lei for aprovada, desastres ambientais como o de Brumadinho seriam a norma e não a exceção", afirmou Miguel Urbán Crespo, deputado europeu. "E a impunidade corporativa e o extrativismo teriam precedência sobre os direitos dos povos e a sustentabilidade do território", insistiu.
"Desta forma, as belas palavras e "promessas verdes" que Bolsonaro envia a Biden ou à UE para tentar promover o acordo comercial com o Mercosul permaneceriam letra morta na prática", disse o deputado, que foi o porta-voz do partido Podemos no Parlamento Europeu.
Para ele, essa condição de "letra morta" fica ainda mais acentuada "com o recente anúncio da investigação do Ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles por supostamente pertencer a um esquema que facilitou a exportação de madeira extraída ilegalmente da Amazônia, precisamente quando uma das principais críticas ao acordo UE-Mercosul é o alto risco de maior desmatamento de regiões como a Amazônia".
"Depois desta notícia, não sei como os negociadores europeus não têm vergonha de continuar tendo o governo Bolsonaro como um parceiro comercial chave na negociação deste acordo", declarou.
Nesta quinta-feira, ministros do Comércio dos 27 países da UE ainda se reuniram para debater a situação do acordo com o Mercosul. Do lado de fora do prédio e em capitais como Berlim, partidos verdes, entidades como a Oxfam e Greenpeace promoveram manifestações contra a aproximação da Europa ao governo Bolsonaro.
Ombudsman europeu avisou
No Parlamento, referências ainda são feitas a um informe do Ombudsman europeu que, há poucas semanas, criticou fortemente o fato de que as negociações entre Mercosul e UE tenham sido opacas e que ocorreram sem que, antes, se soubesse o impacto ambiental do acordo.
Com uma lei que permitiria ao Brasil promover megainfraestruturas sem a necessidade de tais relatórios de impacto, a oposição europeia a este acordo, que já tem muitos críticos, aumentaria.
O deputado ainda revelou que o Parlamento Europeu vai perguntar diretamente à Comissão Europeia como a lei ambiental afetará as negociações comerciais dentro da estrutura de respeito às políticas ambientais que a UE afirma defender.
"Além disso, incluiremos esta questão na próxima reunião da delegação parlamentar do Mercosul. Ninguém nas instituições europeias poderá dizer que desconhece este novo ultraje de Bolsonaro contra o meio ambiente e os supostos compromissos climáticos da UE", afirmou.
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