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Jamil Chade

REPORTAGEM

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Radicalismo de Bolsonaro põe comunidade internacional em estado de alerta

Bolsonaro, militares - Pedro Ladeira/Folhapress
Bolsonaro, militares Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

Colunista do UOL

07/09/2021 04h00Atualizada em 07/09/2021 08h14

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Resumo da notícia

  • ONU, Comissão Interamericana de Direitos Humanos, governos estrangeiros e ongs acompanharão de perto atos no país
  • Temor é de que cenários semelhantes aos do Capitólio nos EUA sejam repetidos
  • Material de campanha do bolsonarismo sugere, na avaliação de diplomatas, a existência de uma rede internacional ultraconservadora de apoio aos atos

Os olhos do mundo estarão voltados ao Brasil nesta terça-feira, quando atos convocados pelos aliados do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ameaçam ampliar a tensão política no país. Diplomacias estrangeiras, ONU, Comissão Interamericana de Direitos Humanos, ongs internacionais e mesmo militares admitem que o cenário brasileiro é de "extrema preocupação" e pode significar um forte abalo regional.

Mas se a crise e o comportamento do chefe de estado brasileiro são considerados por entidades e governos estrangeiros como alarmantes, parte da preocupação é de que os acontecimentos no Brasil se transformem em uma espécie de teste de sobrevivência para movimentos de ultradireita pelo mundo.

A presença de enviados de Jair Bolsonaro para encontros com Steve Bannon, nos EUA nas últimas semanas, a intensificação das ofensivas em redes sociais nos últimos dias e o amplo uso de um tom de ameaça por parte do próprio presidente foram considerados como sinais de que não se trata apenas de um movimento de base.

Também foi considerado como "ilustrativo" desse movimento orquestrado a assinatura de uma Medida Provisória que dificulta a remoção de conteúdo das redes sociais, às vésperas da data, ampliando a proliferação de desinformação.

Para fontes diplomáticas ouvidas pela reportagem, existem suspeitas de que nem tudo sobre a data da independência nacional esteja, de fato, sendo montado exclusivamente a partir de escritórios ou computadores dentro do país.

Um vídeo divulgado nos últimos dias chamou a atenção dos estrangeiros. Nele, um narrador apresenta em inglês a data do 7 de setembro como um marco do Brasil para o restante do mundo. Ignorando a realidade de um presidente profundamente fragilizado, o vídeo sugere a existência de um movimento ultraconservador e patriótico sólido.

A interpretação é de que se trata de grupos radicais passando a mensagem de que o movimento quer mostrar força. "Esse é um momento definidor de nossa história", diz o narrador, indicando que os acontecimentos vão entrar para "os anais do Ocidente". "Vamos reunir milhões para mandar uma mensagem ao mundo", insiste. "Mostraremos ao mundo uma enorme antirevolução", promete o narrador, misturando referências patrióticas e bíblicas.

Embaixadores estrangeiros que conversaram com a coluna na condição de anonimato ainda apontaram para o risco de que os atos repitam os cenários da tomada do Capitólio, no dia 6 de janeiro, por simpatizantes de Donald Trump.

O temor é de que, se no caso americano as instituições frearam uma ofensiva ainda maior, não há a mesma segurança em relação ao que poderia ocorrer no Brasil.

Das embaixadas de países latino-americanos aos postos diplomáticos das grandes potências, a situação brasileira é alvo de um intenso debate. Governos estrangeiros, de forma sigilosa, usaram canais extra-oficiais para buscar com militares brasileiros informações sobre a possibilidade de confrontos.

Não por acaso, a embaixada dos EUA foi explícita ao emitir um alerta de segurança a seus cidadãos no Brasil.

Organismos internacionais acompanham ameaças de violações de direitos humanos

Outro aspecto que acende o alerta internacional é o risco de violência e de ataques contra direitos fundamentais. Tanto a Comissão Interamericana de Direitos Humanos como as Nações Unidas passarão o dia com o foco no Brasil.

O órgão regional já deixou claro que vai monitorar os eventos, ainda que não envie uma delegação, como havia sido solicitado por entidades nacionais.

Na ONU, reuniões ainda foram convocadas envolvendo departamentos que lidam com a situação política no Hemisfério para avaliar a situação brasileira.

Oficialmente, a entidade também já abandonou sua tradicional diplomacia para acenar oficialmente sua preocupação.

O Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos afirmou, nesta segunda-feira, que está preocupado com as ameaças dirigidas contra o Supremo Tribunal Federal e informa que está "acompanhando de perto" a situação do país diante da convocação de atos para o dia 7 de setembro.

De acordo com a entidade, seu Escritório Regional para a América do Sul "reitera a importância de proteger o direito à liberdade de reunião pacífica, bem como suas preocupações com casos de discurso de ódio contra povos indígenas e ameaças contra instituições como o Supremo Tribunal Federal".

A ONU revelou que não poderá enviar uma missão de observação ao Brasil. Mas garante que está "acompanhando a situação de perto".

A reação ocorre no mesmo dia em que ex-presidentes e parlamentares de mais de 20 países assinaram uma carta conjunta denunciando a ameaça à democracia no Brasil. A data brasileira despertou um alerta internacional, ameaçando aprofundar o isolamento do país no palco mundial.

Os comentários da ONU ainda ocorrem às vésperas da viagem do presidente Jair Bolsonaro para Nova Iorque, onde irá fazer o tradicional discurso de abertura da Assembleia-Geral das Nações Unidas. Nos bastidores do organismo internacional, a notícia de que Bolsonaro ir até a sede das Nações Unidas foi recebida com uma mistura de irritação e desprezo.