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Jamil Chade

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Busca por tradução de 'tchutchuca' é retrato da decadência de um país

O presidente Jair Bolsonaro (PL) foi chamado de "tchutchuca do Centrão" por um youtuber - 18.ago.2022 - Reprodução/YouTube/Wilker Leão
O presidente Jair Bolsonaro (PL) foi chamado de 'tchutchuca do Centrão' por um youtuber Imagem: 18.ago.2022 - Reprodução/YouTube/Wilker Leão

Colunista do UOL

19/08/2022 15h08

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Ao se debruçar para conseguir traduzir o termo "tchutchuca do Centrão" e os gestos do presidente Jair Bolsonaro, a imprensa internacional apenas espelhou uma nova realidade: o desespero do mundo em tentar entender um país que perdeu seu lugar no mundo.

Conforme a coluna da Folha de S. Paulo mostrou, diferentes jornais pelo mundo trouxeram versões inusitadas e criativas para noticiar o confronto entre o presidente e o influenciador Wilker Leão, que acusou Bolsonaro de ser "tchutchuca do Centrão". Na França, o termo usado foi "Putain", ou simplesmente prostituta. Outros foram mais diplomáticos na descrição, enquanto na Argentina a imprensa traduziu como "cadelinha do Centrão".

A realidade é que, ao longo dos últimos anos, fui chamado para entrevistas de rádio e televisão para explicar as ofensas do presidente contra a primeira-dama da França, o negacionismo ambiental do bolsonarismo, a obsessão pelo comunismo, a vulgaridade de um chefe-de-estado que não entendeu a dimensão de seu cargo, nem no Brasil e nem no mundo.

Pasmos, estrangeiros repetiam com frequência a mesma pergunta: "isso é sério?"

Fui dezenas de vezes questionado por governos estrangeiros e diplomatas sobre como deveriam interpretar certas ações de política externa e a submissão aos interesses de Donald Trump. Mas nada se equiparou ao descaso de Bolsonaro diante da pandemia da covid-19 e seu sarcasmo diante da morte de milhares de brasileiros.

Numa certa noite de muita tensão na OMS, um dos líderes da agência se aproximou de mim e, desesperado, apenas repetia a palavra "louco" para descrever o comportamento do presidente brasileiro.

Qualquer brasileiro no exterior sabe das dezenas de vezes que fomos interpelados por estrangeiros com uma mistura de pena, indignação e confusão: "o que está acontecendo no Brasil?".

A realidade é que, em menos de quatro anos, o governo de Jair Bolsonaro conseguiu a proeza de destruir décadas de construção de uma diplomacia sólida e que servia como arma para o desenvolvimento do país.

O drama em buscar a tradução de um insulto é, no fundo, o retrato da decadência externa de um país. Uma decadência estampada nos berros das manchetes dos jornais estrangeiros, no isolamento de Bolsonaro diante das demais democracias e num país que perdeu seu lugar no mundo.