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Papa é solicitado a apoiar democracia no Brasil e resultado de urnas
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O papa Francisco é solicitado a participar da defesa da democracia no Brasil. Num encontro realizado nesta sexta-feira, no Vaticano, ele recebeu das mãos de um religioso brasileiro uma carta elaborada pela Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns na qual o pontífice é chamado a apoiar o processo eleitoral.
O objetivo é que a Santa Sé seja uma das instâncias estrangeiras a reconhecer o resultado das urnas, uma operação que diversas entidades têm feito com governos estrangeiros, com a ONU e parlamentos no exterior.
De forma coordenada, a sociedade civil brasileira tem atuado no exterior para tentar garantir que, pelo menos nas principais democracias e centros de poder, uma ruptura da democracia nacional não seja legitimada no exterior.
No caso do Vaticano, o encontro ocorreu entre o papa e Dom Pedro Luiz Stringhini, bispo de Mogi das Cruzes (SP), que entregou a carta com um apelo.
O conteúdo da reunião foi mantido em sigilo. Mas Francisco, ao longo dos meses, já deu sinais de não concordar com os caminhos da política brasileira, recebeu em audiência o cacique Raoní, convocou um encontro sobre a Amazônia e falando abertamente sobre direitos humanos.
"O Brasil prepara-se para escolher aqueles que irão dirigir os seus destinos, começando por quem ira assumir a presidência da República. Seria um momento de júbilo, de coesão nacional e de afirmação da soberania popular não fossem as ameaças que pairam sobre algo precioso para o povo brasileiro: a democracia", disse a Comissão Arns, em carta ao papa e obtida com exclusividade pela coluna.
Para o grupo, Francisco pode ter um papel fundamental para permitir que a sociedade brasileira possa "exercer o direito fundamental de escolher um futuro melhor e mais decente para si mesma".
Ao receber o documento, o pontífice lembrou o papel de dom Paulo Arns. "Foi um grande homem", disse o argentino.
Na carta, a Comissão Arns pede que a situação brasileira seja agora acompanha de perto pela Santa Sé. "Brasileiras e brasileiros de todos os rincões, de todas as culturas e todos os credos, precisam do Vosso olhar e do Vosso apoio neste momento. É o que solicita esta Comissão Arns", disse a entidade, que lembrou como, em no Santuário de Aparecida, em 2013, Francisco destacou a importância de manter a coragem, de viver a fé quando o desânimo nos abate e de impedir que a esperança se apague nos corações.
"Neste 2 de outubro de 2022, os eleitores vão às urnas pressionados não só pelas vicissitudes da vida, mas pelas ameaças de ruptura da ordem democrática. São ameaças que partem de quem parece não aceitar um resultado eleitoral que não lhe favoreça", destaca o texto.
Segundo eles, o processo democrático tem sido "afetada pelo discurso de ódio propagado a partir de gabinetes oficiais, para dividir os brasileiros, jogando uns contra os outros". "Que estigmatizam mulheres, afrodescendentes, indígenas, fiéis de distintas religiões, promovendo sobretudo o extermínio da juventude negra e pobre, no contexto de um projeta criminoso de armar a população,
O texto ainda denuncia as profundas injustiças e o fato de o país enfrentar "tempos difíceis".
"O desemprego alcança milhões de pessoas, a fome voltou aos lares, 690 mil vidas foram perdidas para a covid-19, a violência explode no campo ou na cidade e nossas florestas continuam a ser consumidas pelas queimadas, pelo contrabando de madeira, pela mineração desenfreada que contamina os rios, mata os peixes, envenena as pessoas", diz.
"Problemas não faltam neste vasto Brasil que teria tudo para abraçar um projeta de futuro promissor, voltado ao bem comum, corn inclusão, justiça social e solidariedade", afirma.
Pressão internacional aumenta
Além da ação no Vaticano, a eleição no Brasil desperta uma inédita atenção internacional. Nesta semana, o governo brasileiro recebeu uma declaração de oito relatores da ONU (Organização das Nações Unidas), que se uniram para pedir às autoridades, candidatos e partidos políticos no Brasil a garantia que as próximas eleições sejam "pacíficas e que a violência relacionada com as eleições seja prevenida". A declaração ocorre poucos dias depois de o presidente Jair Bolsonaro usar a tribuna da ONU para fazer campanha política, num gesto que deixou governos estrangeiros indignados com a postura do brasileiro.
O comunicado, mesmo sem citar o nome do presidente brasileiro, critica os ataques feitos contra o Judiciário, contra as urnas e alerta sobre o impacto desse comportamento para a sobrevivência da democracia. Nos bastidores, fontes da ONU confirmaram que a medida foi a maneira encontrada para colocar uma pressão sobre o governo para que não viole as regras eleitorais.
Sanções não podem ser aplicadas sobre o Brasil, muito menos por conta de um comunicado partindo de relatores. Mas a declaração serve como um alerta de que a comunidade internacional não está disposta a aceitar uma ruptura democrática no país. O impacto, caso Bolsonaro opte por esse caminho, seria uma condenação internacional praticamente imediata.
"Exortamos as autoridades a proteger e respeitar devidamente o trabalho das instituições eleitorais. Expressamos ainda nossas preocupações sobre o impacto que tais ataques poderiam ter sobre as próximas eleições presidenciais, e enfatizamos a importância de proteger e garantir a independência judicial", disseram os especialistas.
A declaração foi assinada por Clément Nyaletossi Voule, relator especial sobre os direitos à liberdade de reunião pacífica e de associação, Reem Alsalem, relatora especial sobre violência contra mulheres e meninas, Francisco Cali Tzay, Relator Especial sobre os direitos dos povos indígenas, Mary Lawlor, Relatora Especial sobre a situação das pessoas defensoras dos direitos humanos; Morris Tidball-Binz, Relator Especial sobre execuções extrajudiciais, sumárias ou arbitrárias; E. Tendayi Achiume, Relatora Especial sobre as formas contemporâneas de racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância relacionada; Irene Khan, Relatora Especial sobre a promoção e proteção do direito à liberdade de opinião e expressão; Diego García-Sayán, Relator Especial sobre a independência de juízes e advogados.
No mês passado, a então alta comissária da ONU para Direitos Humanos, Michelle Bachelet, criticou os ataques de Bolsonaro contra as instituições democráticas e contra as urnas, além de de sua incitação à violência. Sua atitude levou o Itamaraty a apresentar um protesto formal contra a chilena.
No início do ano, ela já havia alertado para o risco de violência, o que levou o governo a elevar o tom contra Bachelet, exigindo que não houvesse "interferência" na eleição brasileira.
Ataques contra Poderes e contra a democracia
Sem citar o nome do presidente Jair Bolsonaro, os especialistas expressaram ainda suas preocupações com a "campanha difamatória em curso e com os contínuos ataques contra as instituições democráticas, o Poder Judiciário e o sistema eleitoral no Brasil, incluindo o sistema eleitoral eletrônico".
"Estamos preocupados que este ambiente hostil represente uma ameaça à participação política e à democracia e instamos o Estado a proteger os candidatos de quaisquer ameaças, atos de intimidação ou ataques on-line e off-line", disseram os relatores.
Os especialistas ainda fizeram um apelo para que "todos aqueles envolvidos no processo eleitoral devem se comprometer com uma conduta pacífica antes, durante e após as eleições".
"Os candidatos e partidos políticos devem abster-se de utilizar linguagem ofensiva que possa levar à violência e a abusos dos direitos humanos", afirmaram. Os especialistas disseram que discursos de ódio, desinformação de gênero e incitação dos candidatos e seus apoiadores durante o período de campanha eleitoral podem desencadear violência.
Para eles, cabe ao estado "assegurar que todos os processos eleitorais sejam não discriminatórios, livres de desinformação, discurso de ódio e incitação à violência. Todas as liberdades fundamentais, incluindo o direito à liberdade de reunião e associação e a liberdade de expressão devem ser defendidas", afirmaram os oito relatores.
"Exortaram as autoridades brasileiras a tomar medidas específicas, voltadas para aqueles mais em risco, incluindo mulheres, afro-brasileiros, povos indígenas e pessoas LGBTI, para garantir que todos possam participar livremente do processo eleitoral, sem discriminação, assédio ou medo de uma potencial repetição da violência sexual e de gênero", pediram.
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