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Jamil Chade

REPORTAGEM

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Em decisão inédita, Brasil vai acolher meninas vítimas de mutilação genital

Mutilação genital feminina - Unicef
Mutilação genital feminina Imagem: Unicef

Colunista do UOL

18/03/2023 16h00

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O governo brasileiro vai acolher meninas e mulheres que tenham sido vítimas de mutilação genital, na condição de refugiadas. A decisão foi aprovada pelo Conselho Nacional de Refugiados, num ato que foi considerado como um marco na luta global contra violência de gênero e justiça racial. A medida é ainda uma mudança profunda depois de quarto anos de uma gestão que se dedicou a limitar os direitos de mulheres e até afetou a maneira pela qual o governo brasileiro negociava resoluções na ONU sobre o tema.

O flagelo atinge 3 milhões de meninas e mulheres pelo mundo a cada ano. "No marco do mês internacional da Mulher, o Comitê Nacional para os Refugiados - CONARE - aprovou, durante a 168ª Reunião Ordinária realizada em 14 de março de 2023, de maneira inédita, abordagem de reconhecimento prima facie da condição de refugiadas de meninas e mulheres nacionais de países com alta prevalência da prática de Corte ou Mutilação Genital Feminina", destacou o CONARE.

"A iniciativa também atende o Programa de Aceleração de Políticas de Refúgio para Afrodescendentes lançada pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública em janeiro deste ano, uma vez que a maioria das vítimas da mutilação genital feminina no mundo são mulheres negras", apontou.

Segundo o CONARE, a prática é uma "grave violação de direitos humanos de meninas e mulheres, com consequências graves no curto e longo prazo para a saúde mental, física e sexual das mulheres, que coexiste com formas adicionais de violência baseada em gênero".

"A prática é condenada por diversos tratados e convenções regionais e internacionais, e viola, entre outros, o direito à não discriminação com base no gênero, perpetuando a desigualdade entre homens e mulheres, o direito à vida (se o procedimento resultar em morte), o direito à saúde e o direito a estar livre de tortura, punição ou tratamento cruel, desumano ou degradante", explica.

Por ocorre em grande parte com meninas menores de 15 anos, a mutilação também viola os direitos da criança.

"Estamos construindo um governo para todas as mulheres, independente de suas origens. Essa medida adotada pelo CONARE reforça nosso compromisso de enfrentamento à violência de gênero em uma perspectiva global" reforçou Sheila de Carvalho, presidente do Comitê Nacional para Refugiados.

Segundo o governo, a decisão reconhece que mulheres e meninas sobreviventes ou potenciais vítimas de mutilação genital compartilham a "característica imutável" de serem mulheres, "conformando um grupo específico no âmbito da lei brasileira de refúgio, com risco real de ou serem submetidas a graves lesões ou de já terem sofrido graves danos, por uma razão discriminatória, o que as impossibilita, por não quererem ou por não poderem, de ter acesso à proteção de seu país".

"A abordagem prima facie permitirá, ademais de seu efeito simbólico e pedagógico contra a continuidade da prática, tratar as solicitações de refúgio de meninas e mulheres nacionais desses países de maneira mais célere", completou o órgão.