Jamil Chade

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Reportagem

Saudita despeja US$ 10 bi no esporte para limpar imagem; agora, quer a Copa

Há cinco anos, a Fifa vivia um verdadeiro terremoto. Não se tratava de mais uma operação policial. Em seus corredores e bastidores, o chão tremia por outro motivo: fundos sauditas tinham proposto algo que poderia parecer impensável: comprar a Copa do Mundo. Não uma. Todas.

A ideia era de que a Fifa iria deixar a "grupos privados" o financiamento e organização do torneio, apenas administrando a marca, regras e exploração desses direitos. Em troca, sauditas e bancos internacionais prometiam elevar os lucros da entidade de uma maneira inédita.

A reação de dirigentes de todo o mundo, porém, foi negativa e o projeto acabou sendo engavetado.

Mas ficava claro, ali, que os sauditas viam no esporte uma opção real de se posicionar no mundo.

De fato, o governo de Riad havia considerado, anos antes, o futebol como uma ameaça. Durante a Primavera Árabe, a transformação dos estádios como caixas de ressonância da sociedade assustou os príncipes sauditas. O temor era de que o esporte poderia mobilizar torcedores em grupos de oposição, exigindo democracia e o fim de uma repressão de décadas.

Mas consultores internacionais vieram com outra proposta. Instrumentalizar o futebol para se consolidar no mundo.

Não se tratava de um gesto improvisado. Ao observar a forma pelo qual o irmão caçula - o Catar - havia usado o futebol e a Copa que ainda ocorreria para garantir uma certa estabilidade ao regime e lustrar sua imagem, os sauditas partiram pelo mesmo caminho.

Mas, desta vez, com muito dinheiro. No total, as estimativas apontam que o reino de Mohamed Bin Salmam despejou US$ 10 bilhões na compra de jogadores, clubes, direitos de transmissão, eventos e marcas no mundo dos esportes.

Além dos craques que desembarcam nos clubes sauditas, Riad comprou parte da escuderia Aston Martin na F1, fechou dez anos de corridas no país, investe cerca de US$ 1 bilhão no circuito de golfe, comprou o Newcastle por US$ 400 milhões e prolifera projetos em dezenas de esportes.

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O valor significa um volume de recursos maior que o PIB de 30 países do mundo. Mas uma fração quase imperceptível da economia saudita, avaliada em US$ 2,3 trilhões e baseada na venda de petróleo. Apenas em 2022, o país vendeu ao mundo US$ 410 bilhões em barris de petróleo.

Desse total, portanto, gastou apenas 2,5% nessa nova ofensiva. Mas suficiente para criar uma nova realidade, principalmente no futebol.

Além da compra de times, os sauditas passaram a patrocinar clubes pela Europa. O último deles foi o Atlético de Madri que, na semana passada, assinou contrato com a Riyadh Air, companhia aérea o reinado.

Mas qual o objetivo? Ter a liga mais forte do mundo? Ganhar torneio?

Para críticos, nada disso interessa aos sauditas ou seu príncipe Mohamed Bin Salman. A meta é simplesmente a de ser visto de uma nova forma no mundo, com uma imagem "moderna" e criando cúmplices entre os parceiros Ocidentais, potenciais críticos do regime autoritário.

Acusada de sérias violações de direitos humanos, de asfixiar os direitos de mulheres, de envolvimento na morte do jornalista Jamal Kashooggi, o regime saudita sabe que precisa se reinventar.

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Neymar, portanto, é apenas mais uma peça nesse esquema.

Quanto ao sonho de comprar a Copa do Mundo, o projeto foi adiado. Mas não totalmente abandonado. Para 2030, os sauditas querem sediar o evento. A decisão será tomada pela Fifa em 2024, enquanto o mundo inteiro estará acompanhando o que os maiores craques do planeta estão fazendo nos campos da Arábia Saudita.

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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