Jamil Chade

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Brasil pede na ONU fim de sanção contra Venezuela e propõe diálogo

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva pediu que as sanções impostas sobre Nicolás Maduro e seus aliados na Venezuela sejam retiradas e que a relação entre as instituições internacionais e Caracas seja baseada no diálogo. O apelo foi feito durante uma reunião do Conselho de Direitos Humanos da ONU destinada a tratar das violações cometidas pelo regime bolivariano e a situação da população local.

O posicionamento brasileiro foi criticado por membros da oposição venezuelana, que estavam na sala acompanhando o encontro.

Numa intervenção nesta segunda-feira (25), a delegação do Itamaraty destacou que, assim como o Alto Comissariado da ONU, o Brasil está "preocupado" com as sanções. Segundo o governo brasileiro, elas tem "forte impacto sobre a situação humanitária e de direitos humanos, e devem ser retiradas."

Ao longo dos últimos anos, americanos e europeus proliferaram medidas de sanções unilaterais contra o governo de Maduro, o que foi denunciado pelo governo local como um obstáculo para garantir o atendimento à população. Para os EUA, porém, não são as sanções que determinam a crise, e sim a administração de Maduro.

Hoje, 6 milhões de venezuelanos vivem fora do país, como resultado do colapso da economia local e da repressão, principalmente nos países vizinhos.

Para o governo brasileiro, o pedido de fim das sanções cumpre uma tradição do país de contrariar qualquer medida que não passe pelo Conselho de Segurança da ONU. Internamente, o governo também estima que tais medidas apenas aprofundaram a crise e que apenas uma normalização permitirá que, na Venezuela, haja um entendimento para que as eleições presidenciais de 2024 ocorram em condições adequadas.

Comissão da ONU denuncia repressão de Maduro

O encontro da ONU serviu para que a Comissão de Inquérito da entidade apresentasse os resultados de sua investigação, que denuncia crimes cometidos pelo regime de Caracas. Dezenas de delegações tomaram a palavra para cobrar mudanças na postura do governo Maduro.

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Segundo o informe, "os ataques ao espaço cívico e democrático na Venezuela estão se intensificando por meio de políticas de Estado destinadas a silenciar a oposição e as críticas ao governo Maduro".

A Comissão foi criada em 2019 pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU e, nos últimos meses, investigou supostas violações relatadas no país entre janeiro de 2020 e agosto de 2023.

Agora, o informe alerta que "as estruturas repressivas do Estado não foram desmanteladas, e o governo recentemente intensificou os esforços para reduzir o espaço cívico e democrático, restringindo as liberdades individuais e coletivas e aumentando o controle e as restrições sobre o trabalho dos defensores dos direitos humanos, das organizações da sociedade civil, dos sindicatos, da mídia e dos partidos políticos".

Ameaças, vigilância e assédio contínuos, juntamente com difamação e censura, têm sido empregados pelo Estado para silenciar, desencorajar e sufocar qualquer oposição real ou percebida.
Trecho do relatório da Comissão de Inquérito da ONU

Brasil elogia medidas de Maduro e defende diálogo

Em sua intervenção durante a reunião, o Itamaraty admitiu que compartilhava a preocupação com a situação de direitos humanos no país. Mas evitou condenar Maduro ou fazer denúncias.

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O Brasil preferiu destacar como o governo venezuelano está "cooperando" com a ONU e defendeu que haja um "aprofundamento do diálogo com os mecanismos de direitos humanos da ONU". O Itamaraty ainda elogiou medidas tomadas por Caracas. "Consideramos que a renovação do Conselho Nacional Eleitoral é um passo importante para a realização das eleições em 2024", disse a delegação brasileira.

"Acompanhamos de perto a reformulação das forças policiais, depois da dissolução das Forças de Ações Especiais", emendou. Segundo a Comissão da ONU, porém, essa dissolução não significou que os abusos tenham terminado.

Para completar, o governo brasileiro fez um apelo sobre a condução das eleições de 2024.

"É verdade que o processo politico interno compete ao povo venezuelano", disse. Mas o Brasil destaca "a importância de eleições justas para todos, transparentes e inclusivas, permitindo a participação de todos os atores venezuelanos, de acordo com a lei e os tratados internacionais vigentes".

O governo Lula também defende a existência de um acompanhamento internacional durante o pleito.

Comissão de Inquérito se diz preocupada com eleição

Segundo os autores do informe, porém, o contexto é particularmente alarmante no momento em que a Venezuela se aproxima das eleições presidenciais de 2024. Pelo menos três candidatos da oposição foram desqualificados pelo Conselho Nacional Eleitoral, juntando-se a outros políticos conhecidos que estão proibidos de concorrer a cargos públicos.

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Em seu relatório de 2020, a missão identificou as Forças de Ação Especial (Faes) da Polícia Nacional Bolivariana (PNB) como uma das estruturas mais envolvidas em execuções extrajudiciais, entre outras graves violações de direitos humanos, no âmbito de operações de segurança para combater o crime.

Nesse mesmo relatório, a missão documentou a participação das Faes em detenções arbitrárias de pessoas contrárias ao governo, algumas das quais foram submetidas a atos de tortura ou maus-tratos pelos serviços de inteligência do Estado.

Em sua atualização em março, a missão constatou que, apesar da suposta dissolução da Faes em 2022, há indícios de continuidade entre essa força de segurança e a nova Diretoria de Ações Estratégicas e Táticas (Daet) da PNB, criada em julho de 2022. A Daet, segundo os inspetores, tem funções semelhantes e usa o mesmo modus operandi que a Faes. "Preocupantemente, sua cadeia de comando também inclui oficiais das Faes e de outras forças de segurança que foram identificados no relatório de 2020 da Missão como envolvidos em graves violações de direitos humanos e, em alguns casos, em crimes contra a humanidade", disse.

"A transformação da Faes em Daet é uma mera mudança de nome que demonstra a persistente impunidade e a continuação de graves violações de direitos humanos", disse Marta Valiñas. "É imperativo monitorar as ações da Daet para garantir que ela não aja em violação das obrigações internacionais do Estado venezuelano com relação à proteção e ao respeito aos direitos humanos."

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