Carnificina: ONU diz que Gaza tem 17 mil crianças sozinhas e 30 mil mortos
17 mil crianças em Gaza perderam os pais ou estão separadas de suas famílias. O alerta foi feito pela ONU, numa reunião especial dedicada a tratar da crise entre israelenses e palestinos, nesta quinta-feira (29), em Genebra. A constatação ocorre no dia em que o número de mortes em Gaza supera a marca de 30 mil pessoas.
Num discurso no Conselho de Direitos Humanos da ONU, o alto comissário da entidade, Volker Turk, foi contundente sobre a dimensão da crise. Segundo ele, "parece não existir palavra" para capturar o horror" visto em Gaza.
A reunião testemunhou uma troca de farpas entre as diferentes delegações. O governo de Israel acusou a ONU de ter ignorado a construção de uma operação terrorista em Gaza e de não o devido valor às vítimas israelenses. Já a diplomacia palestina acusou Israel de "genocídio".
De acordo com a ONU, desde o início de outubro, mais de 100 mil pessoas foram mortas ou feridas. "Cerca de uma em cada 20 crianças, mulheres e homens estão mortos ou feridos", disse Turk.
"Pelo menos 17 mil crianças ficaram órfãs ou foram separadas de suas famílias, e muitas outras carregarão as cicatrizes do trauma físico e emocional por toda a vida", alertou.
"Dezenas de milhares de pessoas estão desaparecidas, muitas delas supostamente enterradas sob os escombros de suas casas", disse.
"Isso é uma carnificina", constatou.
A ONU qualificou os ataques do Hamas contra os israelenses de "chocantes", "profundamente traumatizantes e totalmente injustificáveis". "A matança de civis, os relatos de tortura e violência sexual infligidos pelo Hamas e por outros grupos armados palestinos e a manutenção de reféns desde aquela época são terríveis e totalmente errados", disse.
Mas, segundo ele, "o mesmo acontece com a brutalidade da resposta israelense". "O nível sem precedentes de mortes e mutilações de civis em Gaza, incluindo funcionários da ONU e jornalistas, a crise humanitária catastrófica causada pelas restrições à ajuda humanitária, o deslocamento de pelo menos três quartos da população, muitas vezes várias vezes, a destruição maciça de hospitais e outras infraestruturas civis e, em muitos casos, a demolição sistemática de bairros inteiros, tornando Gaza praticamente inabitável", constatou.
Crimes de guerra
Pela primeira vez desde o início da guerra em Gaza, a ONU ainda abriu uma brecha para considerar as ações israelenses como crimes passíveis de serem julgados por cortes internacionais.
Turk ainda afirmou:
A guerra em Gaza precisa acabar. Todas as partes cometeram violações claras dos direitos humanos internacionais e das leis humanitárias, incluindo crimes de guerra e possivelmente outros crimes de acordo com a lei internacional. Chegou a hora - e já passou da hora - da paz, investigação e responsabilização.
Ele ainda acusou Israel de promover violações profundas contra os palestinos.
"Em 56 anos de ocupação israelense, sistemas de controle profundamente discriminatórios foram impostos aos palestinos para restringir seus direitos, inclusive o direito de locomoção, com grande impacto sobre sua igualdade, moradia, saúde, trabalho, educação e vida familiar", disse.
"Um bloqueio de 16 anos na Faixa de Gaza manteve a maioria de seus 2,2 milhões de habitantes em cativeiro e destruiu a economia local. As vidas de gerações de palestinos na Cisjordânia foram marcadas por assédio, controle, arbitrariedade - inclusive prisões e detenções arbitrárias - e aumento da violência militar e dos colonos israelenses", afirmou. "Enquanto isso, os assentamentos ilegais continuaram a crescer, levando, de fato, a uma maior anexação das terras dos palestinos. Imagine a humilhação e a repressão intermináveis sofridas", completou.
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JAMIL CHADE
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Quero receberSegundo ele, essa situação é "incomparavelmente pior".
A ONU ainda acusou de Israel de lançar "milhares de toneladas de munição em Gaza" e armas que "emitem uma onda de explosão maciça de alta pressão que pode romper órgãos internos, bem como projéteis de fragmentação e calor tão intenso que causam queimaduras profundas - e elas têm sido usadas em bairros residenciais densamente povoados".
De acordo com Turk, nos últimos cinco meses de guerra, a ONU "registrou muitos incidentes que podem ser considerados crimes de guerra pelas forças israelenses, bem como indícios de que as forças israelenses se envolveram em alvos indiscriminados ou desproporcionais que violam o direito internacional humanitário".
Mas ele também atacou o Hamas. "O lançamento de projéteis indiscriminados por grupos armados palestinos no sul de Israel, até Tel Aviv, também viola o direito humanitário internacional, assim como a manutenção de reféns", explicou.
A ONU ainda acusou Israel de "impedir a assistência humanitária" à população palestina.
"Toda a população de Gaza está correndo risco iminente de fome. Quase todos estão bebendo água salgada e contaminada. O sistema de saúde em todo o território mal está funcionando. Imagine o que isso significa para os feridos e para as pessoas que estão sofrendo com surtos de doenças infecciosas", disse.
No norte de Gaza, onde o espaço operacional para o trabalho humanitário foi extinto, a ONU acredita que muitos já estejam morrendo de fome.
Na avaliação da ONU, o bloqueio e o cerco impostos a Gaza equivalem a punição coletiva e também podem equivaler ao uso da fome como método de guerra - ambos, cometidos intencionalmente, são crimes de guerra.
Além disso, quase toda a população de Gaza foi deslocada à força, e milhares de pessoas foram detidas, muitas delas incomunicáveis, em condições que podem equivaler a desaparecimento forçado.
Ofensiva sobre Rafah
Outro alerta feito pela ONU se refere a um possível ataque terrestre israelense a Rafah. Para a entidade, isso "levaria o pesadelo que está sendo infligido à população de Gaza a uma nova dimensão distópica".
Mais de 1,5 milhão de pessoas estão abrigadas em Rafah e, apesar dos bombardeios contínuos, a cidade se tornou o centro de ajuda humanitária de Gaza.
"Um ataque terrestre acarretaria uma perda potencialmente maciça de vidas, risco adicional de crimes de atrocidade, novo deslocamento, para outra distribuição em local inseguro, e assinaria uma sentença de morte para qualquer esperança de ajuda humanitária eficaz", afirmou Turk.
Para ele, a operação não seria consistente com as medidas provisórias obrigatórias emitidas pela Corte Internacional de Justiça contra Israel. Turk fez um apelo para que potências com influência sobre Israel façam "tudo o que estiver ao seu alcance para evitar tal resultado".
Fim de ocupação e de hostilidades
Para a ONU, apenas haverá paz com o fim da ocupação de terras palestinas. "Os líderes israelenses devem aceitar o direito dos palestinos de viver em um Estado independente. E todas as facções palestinas devem reconhecer o direito de Israel de existir em paz e segurança", disse.
Turk ainda defendeu um fim das hostilidades. "Queremos não apenas um cessar-fogo imediato, mas um fim para essa guerra", disse. "Todos os reféns devem ser imediata e incondicionalmente libertados, e os milhares de palestinos arbitrariamente detidos por Israel também devem ser libertados", pediu.
Ele ainda pediu que todos os lados sejam responsabilizados e que a sessão de direitos humanos da ONU seja autorizada a entrar nos territórios palestinos.
"Manter os palestinos e seus direitos isolados - "longe da vista, longe da mente" - não funcionou em 56 anos e não pode funcionar nunca", completou.
Israel critica ONU e diz que vai continuar guerra contra Hamas
Durante a reunião, o governo palestino acusou Israel de genocídio, de racismo e insistiu que "os problemas não começaram em 7 de outubro".
Já o governo de Israel atacou a fala da ONU, alertando que os crimes cometidos pelo Hamas não foram mencionados, numa "afronta às vítimas".
"Israel está em guerra com uma organização terrorista que perpetrou um dos ataques terroristas mais hediondos e mortais dos tempos modernos", disse a embaixadora de Israel na ONU, Meirav Eilon Shahar.
Segundo ela, os terroristas se escondem atrás da população civil. "500 km de túneis terroristas serpenteiam sob a infraestrutura civil, casas, escolas e sedes da ONU", disse.
"O uso de civis palestinos como escudos humanos pelo Hamas em Gaza é bem conhecido, mas constantemente ignorado pelo Alto Comissário e por este Conselho", atacou.
Ela ainda acusou o Hamas de desviar ajuda, de assassinar civis inocentes, estuprar, decapitar e queimar famílias vivas. "Não temos escolha. Temos que ir atrás do Hamas, ou eles continuarão a vir atrás de nós", disse.
A israelense usou ainda o encontro para criticar a ONU.
"Durante anos, as Nações Unidas ignoraram o terrorismo, a destruição, o ódio e o incitamento palestinos", disse. "Durante anos, ela desconsiderou e ignorou as preocupações de segurança de Israel", insistiu.
"Durante anos, ignorou as centenas de israelenses assassinados em nossas ruas. Em seu relatório ou declaração de hoje, o senhor não mencionou os israelenses mortos por terroristas antes e depois de 7 de outubro. Será que eles não importam?", questionou.
Segundo ela, Israel tem o dever para com sua população de garantir que o Hamas nunca mais possa atacar.
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